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MUSEU IBERO-AMERICANO DE ARTE MODERNA

C�SAR PATERNOSTO
O Olhar Exc�ntrico

SEGURAN�A

Bom dia, diretor. Desculpe incomod�-lo.

Bom dia. Diga.

Precisa ver o que descobrimos.

� muito importante.

Veja, aquele � o homem,
o que est� mancando.

S� na �ltima semana,
ele veio quatro vezes ao museu.

Ele sempre mostra um cart�o de deficiente.
Avance o v�deo.

Ele sempre vai ao banheiro,
e depois � chapelaria,

onde ele deixa sua mochila.
Avance o v�deo.

A�. Pare.

Ele caminha sem olhar nenhuma obra,

depois senta no banco.

Ele tira o celular e fala com algu�m
enquanto olha pela sala.

N�o acha suspeito?

Na verdade, n�o.

Est� falando com um c�mplice.

Um c�mplice de qu�?

Eles nunca trabalham sozinhos.

Esse indiv�duo est� passando informa��es.

Acho que est� exagerando.

Exagerando? Ali. Est� vendo?

- Ele n�o est� mancando.
- Verdade.

Sim, mas n�o parece nada grave.

Falsificar um cart�o de deficiente
para poder entrar de gra�a�

Desculpe, mas como um seguran�a
com mais de 25 anos de servi�o,

acredito que esse indiv�duo
esteja pegando informa��es

para roubar o museu.

Ok, mesmo que seja isso,

n�o podemos fazer nada al�m de observ�-lo,
como agora.

O homem n�o quebrou nenhuma regra
nem causou danos.

N�o h� danos, at� agora.

Com licen�a.

Oi, Josep. Est� chegando?

Perfeito, eu j� vou sair. Muito bem.

Continuem vigiando,
e mantenha-me informado.

O MUSEU DE ARTE MODERNA

O museu Guggenheim est� aberto.

RAIO X LIGADO

O MUSEU

Vov�!

Neto!

- Sentiu minha falta na It�lia?
- N�o.

N�o, � claro. Sim.

- N�o vai dar tchau para o papai?
- Tchau.

Voltarei para busc�-lo em algumas horas.

Depois do meio-dia. Obrigado.

Tchau.

- O suspeito est� ali.
- Sim, eu o vi entrar.

Ele j� foi ao banheiro, seguindo a rotina.

Estou entediado. Vou dar o fora.

�timo. Perfeito, seja bem-vindo.

- Obrigado.
- At� mais.

- Bom dia.
- Quero guardar essa mochila.

Poder�amos checar a mochila
para encontrarmos pistas,

- como medida preventiva.
- De jeito nenhum.

� completamente ilegal. N�o.

Se n�o encontrarmos nada,
ele nunca ir� saber. Sem danos.

Obrigada, seja bem-vinda.

Tudo bem, mas�
que isso fique entre n�s dois.

Isso talvez seja �til.

Deixe tudo como estava.

CONTA DE ENERGIA EL�TRICA

N�o, Lucas! N�o! Filho da puta!

- Devolva isso!
- N�o!

Devolva.

N�o quero ver quadros. � muito chato.

Ele est� ali.

Vem.

- Ei!
- Chega de doce.

Vou mostrar uma obra
que tenho certeza que ir� gostar.

Com licen�a.

GUERRA FRIA

Olhe atentamente
para essa obra na sua frente.

- Passa o doce.
- N�o, chega de doce.

� t�o dif�cil assim?

Pronto.

Gostou?

- N�o.
- Por qu�?

- Porque n�o.
- Bem�

Voc� � inteligente,
pode perceber que o artista selecionou

dois objetos com fun��es opostas,

um ar-condicionado e um aquecedor.

Ao coloc�-los assim, frente a frente,

mostra que a soma dos opostos
� igual a zero.

� t�o chato que eu n�o ligo.

E a inten��o dele,

quando a criou, foi fazer uma cr�tica�

� Guerra Fria
entre os EUA e a Uni�o Sovi�tica.

N�o entendi nada do que disse
e estou entediado. Vou embora.

Bem�

� dif�cil tentar explicar arte
�s crian�as, n�o � verdade?

Gosta de crian�as?

Interessa?

Como foi em Mil�o?

- Gostou mais que Madri?
- N�o.

Mas � uma cidade linda.

- N�o o levaram para ver A �ltima Ceia?
- Que ceia?

� uma pintura. A �ltima Ceia, de Leonardo.

Quem � esse?

Espero que quando crescer,
voc� n�o seja t�o bruto como seu pai.

Fique aqui, j� volto.

- Onde est� indo?
- Eu j� volto.

Fique de olho no menino.

Ele est� ali.

Fomos visitar um amigo da mam�e
que tem uma casa no lago

com uma piscina gigante.

- Amigo ou namorado?
- O qu�?

Perguntei se sua m�e
tem um namorado italiano.

N�o h� nada errado nisso.

Ele? Duvido, era muito velho.

- Como eu?
- N�o tanto.

Ei, eu poderia
ter uma namorada mais nova se eu quisesse.

Que cara � essa? Viu o que quero dizer?

Igualzinho ao seu pai,
careta e preconceituoso.

N�o sei em que s�culo voc�s vivem.

O que � isso?

Eu n�o sou gay e n�o uso crian�a como isca

Vai, me mostra. O que diz a�?

Nada. Coisa de adulto.

Mariel ficou brava?

Disse que n�o temos permiss�o
para vender suas obras.

Mas as c�dulas s�o minhas!
Que permiss�o precisamos?

As c�dulas n�o t�m selo de firma.
Se queremos vend�-las,

Mariel precisa nos dar
certificados de autenticidade,

e n�o quero problemas.

Voc� sabe como ela �.

O que ela quer?

Ela quer nos encontrar
para chegarmos em um acordo.

Ok. Marque a reuni�o.
Preciso desligar, Luis.

- Tchau.
- At� mais.

O que est� fazendo?
Pare com isso! Dem�nio! Pare!

S�o pap�is importantes. Documentos!

E a�, como ele se comportou?

Excelente. S� tivemos alguns problemas,

mas hoje ele aprendeu
sobre a Lei do Tali�o.

Olho por olho, dente por dente.

N�o foi, Lucas?

�timo. Valeu por cuidar dele. Tchau.

Filho da puta!

Foi tudo um mal-entendido, Mariel.

- Eu enviei o dinheiro equivocadamente.
- Claro. Nunca pedi dinheiro a voc�.

� verdade. Mas sua amiga, Celeste�

veio at� mim pedindo para que a ajudasse,

e por isso eu mandei os euros.

Voc� devolveu o dinheiro,
alterado artisticamente.

Uma obra extraordin�ria.

Ent�o, Luis apareceu,

e eu perguntei se dava para vender.
N�o foi assim?

� o que eu fa�o, e sou muito bom nisso.

Antonio, � muito cara de pau
tentar vender uma obra que dei a voc�.

N�o estou tirando proveito.
Estou tentando recuperar meu dinheiro.

Multiplicar seu dinheiro.

Sim, tentou fazer neg�cio
com um presente meu.

Pensou que eu n�o descobriria?

N�o precisamos discutir.

Ningu�m fez nada com m�s inten��es.

Por que n�o me deixa cuidar disso?

Eu sei vender obras de arte.

Pelo que estou vendo, a obra � de Mariel,

mas pertence ao Antonio,
e eu vou vend�-la.

Acredito que o mais justo,
j� que somos amigos,

e eu amo muito voc�s dois,

seria dividir tudo em tr�s.
O que voc�s acham?

- � muito generoso de sua parte.
- Muito obrigado.

Eu n�o quero a minha parte.

Na verdade, quero.

Vou doar minha parte
para uma comunidade nativa em Lampa.

Eles aproveitariam melhor do que eu.

Parece uma �tima ideia.

�timo.

Vou providenciar a documenta��o
para finalizar esta transa��o.

Tudo que precisa fazer � assinar
os certificados de autenticidade.

- Luna, pode vir aqui um segundo?
- Sim, claro.

Vai voltar ao Peru?

Pensei que, ap�s a morte de Sara,
voc� voltaria a morar em Madri.

O que a morte de minha m�e
tem a ver com morar aqui?

N�o sei.

A morte dos pais
� um momento transcendental.

Para muitos, � um ponto de inflex�o,

quando tomam decis�es que estavam adiando.

Deve achar que n�o estou bem l�.

Mas eu estou bem.

Moro em um lindo pa�s,
estou cercada de boas pessoas�

sem as tenta��es absurdas e vazias
da sociedade.

Claro. Deve ser lindo
morar em um lugar sem �gua pot�vel,

cagar em um po�o, sem Wi-Fi. Lindo.

Conforto deixa as pessoas idiotas.

As torna insens�veis
e desconectadas da natureza.

Voc� n�o percebe
porque est� cercado por essa merda.

Ora essa!

Assim falou a nativa,
conectada � Pachamama,

mas voc� n�o percebe

que lhe tratam bem
porque voc� � uma branca europeia.

� a s�ndrome de Estocolmo

que persiste desde a conquista espanhola.

O que est� dizendo?
Eu que escolhi morar l�.

Acho a Europa cada vez mais vergonhosa.
Essa � a verdade.

Vergonhosa?

Isso mesmo.

Milhares de migrantes
morrem afogados no Mediterr�neo,

e aqui parece
que s� se preocupam com as vendas.

Isso n�o acontece l�
porque ningu�m quer ir a esses pa�ses,

exceto uma europeia cheia de culpa
com uma vis�o id�lica da Am�rica Latina,

o continente com mais injusti�as
e desigualdades do mundo.

O que est� fazendo para mudar isso?

O que fa�o ou deixo de fazer
� outro assunto.

- N�o.
- Por outro lado�

- Voc� est� aqui.
- Voc�

Voc�s nunca se deram bem,
mas, por favor, n�o discutam.

Se querem se matar,
v�o em frente, mas s� depois de assinar.

Seguimos o suspeito,
e o resultado ir� lhe surpreender.

Ele se chama Guillermo David.
Mora no bairro Fuenlabrada.

MUSEU IBERO-AMERICANO DE ARTE MODERNA

Tem 42 anos e mora sozinho.

N�o tem mulher ou filhos. Talvez seja gay.

N�o, ele n�o � gay.

Bem, eu n�o sei.

De qualquer maneira,
� totalmente irrelevante. Continue.

Todos os dias, ele pega o �nibus �s 5h30.

Ele vai at� a empresa Blitex.

Um t�pico prolet�rio da periferia,

nada suspeito at� agora.

� preciso ver al�m das apar�ncias.

Blitex � uma empresa de produtos qu�micos,

e ele trabalha com armazenamento,

ou seja, tem contato direto
com produtos qu�micos.

E?

Entre outras coisas,

eles mexem com carv�o,
enxofre e nitrato de pot�ssio.

Preciso dizer mais?

S�o componentes para fabricar p�lvora.

O suspeito sai da f�brica ao meio-dia
e vai at� o museu.

A primeira coisa que faz � ir ao banheiro.

Aqui dentro, ele passa o tempo estudando
todas as vari�veis para o golpe.

Ele est� constantemente conversando
com seu c�mplice no celular.

Por fim, �s 14h30, ele vai embora.

Todos os dias,
ele vai ao banheiro antes de sair.

O banheiro � l�gico,
depois de duas horas e meia no museu.

Talvez, mas o banheiro
� o �nico local p�blico sem c�meras.

Um prato cheio
para quem est� com explosivos

para coloc�-los l�, n�o?

E por que iria explodir os banheiros?

Como uma distra��o,
para poder cometer o roubo.

- N�o � exagero?
- Espere, a melhor parte est� por vir.

O humilde trabalhador,
ap�s um longo dia de visita ao museu,

vai at� o clube Felton.

- N�o pode ser.
- Pode.

� o clube da esquina?

Exatamente.

Parece bem exclusivo.

Parece normal um cara da periferia,

que trabalha em uma f�brica,
tenha acesso ao clube Felton?

Qual � a sua teoria?

Estamos lidando com um sujeito
ligado aos figur�es do poder.

No mundo dos ladr�es de arte,
o roubo em si n�o � a parte dif�cil,

mas sim ter que vend�-las.

E � a� que os membros distintos
do clube Felton entram.

Ent�o j� podemos
informar a pol�cia, certo?

Sim, tem raz�o.

Desculpem, mas � melhor esperar.

Quero verificar tudo
antes de chamar a pol�cia.

N�o quero que nossa investiga��o fracasse.

E ent�o?

N�o se preocupe.
Ficaremos em alerta, vigiando cada passo.

Al�, Luis!

Como vai?

Sim, est� tudo bem.

Boas not�cias.

Vendi duas pe�as da obra de Mariel.

S�o dez mil para cada um de n�s.
O que acha?

Excelente, Luis.
Praticamente recuperei meu investimento.

Mariel deve estar feliz.

Mariel j� voltou ao Peru esta manh�.
Assim, de repente.

Ela disse sentir-se sufocada em Madri.

� melhor assim.

Para falar a verdade,
estava desconfort�vel com ela por perto.

- Mariel � cansativa.
- Eu sei.

Ok. Continue vendendo, certo?

Meu sal�rio de diretor � muito baixo.

Ok.

Abra�os.

Puta merda.

"Vizinho, estou deixando meus desenhos
de novo para que os mostre no museu.

Por favor, n�o devolva sem dar uma olhada,
como fez na �ltima vez.

Lembre-se que me deve uma.
Jos�, apartamento 5-A."

Que filho da puta.

Que filho da puta.

- Ol�, como vai?
- Ol�, bom dia.

Preciso que venha conosco.

- Por qu�? N�o fiz nada.
- Venha, senhor. Por favor.

Como assim? N�o vou a lugar algum.

Eu disse n�o!
Devolva meu cart�o. Vou embora.

Tem que nos acompanhar.

- Me solta!
- Vamos.

- Me solta, porra!
- Vamos.

Que absurdo!

O jogo acabou.

- N�o, cara. Eu n�o quero ir com voc�!
- Vamos.

O que quer dizer com "erro de c�lculo"?

Que cometemos um erro.
O cara n�o era o que pens�vamos.

Ele tem dois empregos

e fica no museu entre um trabalho e outro.

�timo. Alarme falso.

Como descobriu?

Ele contou durante a interroga��o.

Que interroga��o? Onde?

Na sala auxiliar.

O qu�? Ficou maluco? Isso � ilegal!

Tratou ele bem, pelo menos?
Correu tudo bem?

Ele ainda est� na sala.

Est� muito nervoso.

Ele disse que vai ao clube Felton
porque trabalha na chapelaria.

Chapelaria?

Ent�o, n�o h� liga��o
com traficantes de arte?

E quanto a fingir que manca?

N�o estava fingindo.
Ele � realmente deficiente.

O cart�o � real. �s vezes a perna d�i,

e outras vezes n�o.

E o banheiro?

- S�ndrome do intestino irrit�vel.
- Meu Deus!

- Devemos solt�-lo?
- Voc� n�o far� mais nada.

Andr�s�

venha comigo, por favor.
Vou precisar de voc�.

Ol�. Abra, por favor.

Obrigado.

- Boa tarde.
- O que faz aqui?

Eu sou Antonio Dumas, diretor do museu,
vim para pedir desculpas

e explicar a situa��o.

N�o tem que me explicar nada.

Explique � pol�cia.
Estou aqui h� duas horas. � ilegal.

N�o � necess�rio. A pol�cia j� est� aqui.

Se me permite�

Vou cortar a abra�adeira.

Pronto, obrigado. Detetive, pode entrar.

Boa tarde.
Detetive Fuentes, Prote��o � Crian�a.

Eu explico.

O museu est� colaborando
com a pol�cia h� dois meses

para deter uma rede de pedofilia

- que opera nesta �rea.
- O que isso tem a ver comigo?

A pol�cia o estava seguindo,

pois suas constantes visitas ao museu
estavam chamando aten��o.

A suspeita � que a rede de pedofilia
esteja operando dentro do museu.

Aqui seria o lugar ideal
para escolher as v�timas.

Recebemos muitas excurs�es de escolas.

E por esse mesmo motivo�

o agente Garc�a, que atuou disfar�ado

como seguran�a do museu,
o interceptou e fez algumas perguntas.

Mas o detetive
tem boas not�cias para voc�.

Sim. J� tiramos qualquer d�vida
que t�nhamos sobre voc�.

Confirmamos que voc� n�o tem liga��o
com a rede de pedofilia,

portanto, no que nos diz respeito,

voc� est� liberado para ir quando quiser.

Mas n�o sem receber o agradecimento
da pol�cia por sua colabora��o.

- Muito obrigado mesmo.
- Bem�

- Quando quiser.
- Obrigado.

Minhas coisas�

Sim, est�o l� em cima.
Eu entregarei. Pode ir.

Tudo bem.

Como ressarcimento pelo dano causado,

quero que saiba que de agora em diante,

voc� e mais um acompanhante
ter�o entrada gratuita para sempre.

Al�m disso,

poder� comer no restaurante do museu
com 20% de desconto,

o mesmo que nossos funcion�rios.

E Marisa ir� entregar
algumas lembrancinhas do museu.

Aqui est�.

Tem diversas coisas a�,
duas x�caras, rel�gio, agenda,

l�pis, leques, um pouco de tudo.

Detetive?

Sim, uma �ltima coisa muito importante.

N�o pode contar a ningu�m
o que houve aqui. Entendeu?

Isso arruinaria meses de investiga��o

e acabaria com o plano
para pegar esses depravados.

Claro.

Confiamos em voc�. Entendeu?

Bem�

Bom, novamente, eu pe�o desculpas,
e muito obrigado.

Obrigado. Tchau.

Legenda: Jacqueline Gomes