All language subtitles for Yerma 1998

J� est� na hora.

Juan, me escuta?

J� passaram a juntas?

J� passaram.

At� logo.

N�o quer um copo de leite?

Para qu�?

Trabalha muito e n�o tem for�as
para trabalhar.

Quando os homens emagrecem
ficam fortes como a�o.

Mas voc� n�o.

Quando nos casamos era outro.
Agora tem a cara branca

como se n�o tomasse sol.

Eu gostaria que fosse ao rio
e nadasse e que

subisse ao telhado,
quando a chuva penetrasse nele.

Estamos casados h� 24 meses,
e voc� est� cada vez mais triste,

mais magro, como se
crescesse ao contr�rio.

Terminou?

N�o me leve a mal.
Se eu estivesse doente

gostaria que voc� cuidasse de mim.

Por isso cuido de voc�.

E eu te agrade�o.

Mas n�o se deixa cuidar.

� porque eu n�o tenho nada.

Todas essas coisas
s�o suposi��es suas, Yerma.

Trabalho muito.
Cada ano serei mais velho.

Cada ano...
Voc� e eu continuaremos aqui cada ano...

Naturalmente. As quest�es do trabalho v�o bem.

N�o temos filhos que gastem.

N�o, n�o temos filhos...

Juan!

- Sim.
- Por acaso n�o te amo?

Sim, me ama.

Eu conhe�o noivas
que tremeram antes

de ir para cama com seus maridos.

Eu chorei na primeira vez
que me deitei contigo?

N�o cantava ao levantar os
len��is de Holanda? E n�o te disse

que perfume de ma��
t�m essas roupas?

Sim, Yerma. Disse.

Quando casei contigo minha m�e chorou

porque n�o sofri ao me separar dela.

E era verdade!
Ningu�m casou com mais alegria.

E, no entanto...

Cale-se. Tenho muito trabalho em te ouvir
a todo momento...

N�o. N�o repita o que dizem.
Eu vejo que isso n�o pode ser...

A chuva caindo sobre as pedras

as amacia e faz crescer saramagos ...

... e eu os vejo mover
suas flores amarelas no ar.

Tem que esperar!

Sim, esperar querendo, Juan.
Querendo.

Se precisa de algo, me diz que te trarei.

Voc� sabe que n�o gosto que saia.

- Nunca saio.
- Est� melhor aqui.

A rua � para gente desocupada.

Claro.

At� logo.

At� logo.

Com licen�a?

Entre.

De onde vem?

Do armaz�m.

Do armaz�m t�o cedo?

Por mim teria esperado
na porta que abrissem.

Sabe o que comprei?

Ter� comprado caf�, a��car, p�es.

Comprei rendas, linha,

fitas e l� colorida
para fazer pompons.

Meu marido tinha dinheiro
e me deu.

Vai fazer uma blusa?

- N�o, � porque... sabe?
- Qu�?

Porque estou esperando!

Maria! S� cinco meses!

- Viu s�?
- Claro que sim!

E como se sente?

N�o sei. Angustiada.

Angustiada. Mas...
quando soube? ... Conta.

Voc� estava descuidada?

Sim, descuidada.

Deve estar pulando de alegria.
Eu estou. Conta...

N�o sei.

Nunca teve um p�ssaro vivo
apertado na m�o?

J�.

Pois � o mesmo... mas dentro do sangue.

Que lindo!

- Ai Yerma, estou tonta. N�o sei nada.
- De qu�?

Do que devo fazer.
Vou perguntar � minha m�e.

Para qu�? J� � velha e
deve ter esquecido essas coisas.

O que deve fazer � n�o andar muito.

E ao respirar, respira t�o suave como
se tivesse uma rosa entre os dentes.

Escuta, dizem que mais adiante te chuta
suavemente com os pezinhos.

� ent�o que os amamos mais,
quando j� se diz: meu filho!

Acima de tudo, tenho vergonha.

- Que disse teu marido?
- Nada.

Ele te quer muito ?

Ele n�o diz, mas fica junto de mim

e seus olhos tremem como
duas folhas verdes.

Felizarda!

Mas voc� entende mais disso do que eu.

Para que me serve?

� verdade! Por que ser� isso? De todas

as noivas do teu tempo
voc� � a �nica que n�o...

� verdade.
Claro que ainda tem tempo.

Elena demorou tr�s anos...

... e outras mais antigas,
do tempo da minha m�e, muito mais.

Mas, para mim,
dois anos e vinte dias, � muita espera.

Acho que n�o � justo
que eu me consuma aqui.

Muitas noites saio descal�a para o p�tio
para pisar na terra.

N�o sei porqu�. Se continuar assim,
vou ficar louca.

Vem c� criatura!

Fala como se j� fosse uma velha.

Ningu�m pode se queixar
dessas coisas.

Uma irm� da minha m�e ganhou
catorze anos depois.

Tinha de ver que formosura de crian�a!

E que fazia?

Chorava como um tourinho,
com a for�a de 1000 cigarras cantando juntas ...

e nos mijava e nos
puxava as tran�as,

e aos quatro meses nos
arranhava a cara.

Mas essas coisas n�o doem.

� verdade...

Bah! Eu vi minha irm� dar de mamar

ao seu filho com o peito
cheio de fissuras,

e lhe causava uma grande dor,
mas era uma dor

fresca, boa, necess�ria para a sa�de.

Dizem que com os filhos se sofre muito.

Mentira. Isso dizem
as m�es fracas, as queixosas.

Ter um filho n�o � ter um ramo de rosas.

Temos de sofrer para v�-los crescer.
Perdemos a metade de nosso sangue.

Mas isso � lindo.
Cada mulher tem sangue

para quatro ou cinco filhos...

... e quando n�o os tem se torna veneno,
como vai acontecer comigo.

Anda!

Olha. Pensei que como
voc� costura t�o bem...

Traz. Eu te farei duas roupinhas.

Bem, devo ir embora, j� � tarde.

At� logo.

- N�o corra nas pedras da rua.
- N�o o farei. Adeus.

Volta logo.

Ol� Victor.

E Juan?

Est� no campo.

O que costura?

Corto umas fraldas .

Ora vejam!

Vou enfeitar com rendas. Senta.

Se for menina, dever� por seu nome.

Como?

Estou feliz por voc�.

N�o, n�o s�o para mim.
S�o para o filho de Maria.

Bem, vamos ver se se anima com o exemplo.
Nesta casa faz falta um filho.

Faz falta!

Pois ent�o diz a teu marido
que pense menos trabalho.

Quer juntar dinheiro e juntar�,
mas a quem deixar� quando morrer?

Vou indo com as ovelhas.

Diz a Juan que busque
as duas que me comprou,

e o outro assunto, que suma!

Que suma!

Isso! Que suma!

Bom dia.

Bom dia formosa mulher.
Aonde vai?

Levar comida a meu marido,
que trabalha nas oliveiras.

Est� casada h� muito tempo?

H� tr�s anos.

Tem filhos?

N�o.

Bah! J� vai t�-los!

A senhora acha?

Por que n�o?

Tamb�m eu venho trazer
comida para o meu marido. � velho,

mas ainda trabalha.

Tenho nove filhos como nove s�is,

mas nenhuma f�mea.

Por isso ando de um lado para outro.

A Sra. vive do outro lado do rio?

Sim. Nos moinhos.
E voc� de que fam�lia �?

Eu sou filha de Enrique, o pastor.

Enrique, o pastor.
Voc� deve ser Yerma.

Conheci seu pai. Boa gente.

Levantar, suar,
comer uns p�es e morrer.

Sem jogo, sem nada.

Divers�o para os outros.
Criaturas silenciosas.

Poderia ter casado com um tio seu.

Mas eu sempre
fui uma mulher inquieta.

Me pegaram com mel�o,

festa, torta de a��car.

Muitas noites cheguei � porta
de madrugada

acreditando ouvir m�sica de band�rrias,
mas era o ar.

Tive dois maridos e 14 filhos.

Cinco morreram e no entanto,

eu n�o estou triste,
e gostaria de viver muito mais.

� o que eu digo:
as figueiras e as casas, como duram.

E s� n�s,
mulheres do dem�nio,

viramos p� por qualquer coisa.

Eu queria lhe fazer uma pergunta.

Vejamos, creio saber
o que vai perguntar.

Dessas coisas
n�o se pode dizer nada.

Por qu�?

Eu senti confian�a
ao ouvi-la falar.

Faz tempo que desejo falar
com uma mulher velha.

Porque eu quero saber.
Se a senhora me disser...

- Que posso te dizer eu?
- A senhora sabe. Por que estou seca?

Terei de ficar para cuidar de aves

ou colocar cortinas enfeitadas
nas minhas janelas ?

N�o. A senhora me dir� o que eu devo fazer,
e eu farei o que seja,

ainda que me mande fincar agulhas
no lugar mais sens�vel dos meus olhos.

Eu n�o sei nada, nada.
Eu me meti na vida e comecei a cantar.

Os filhos chegam como a �gua.
Ai, quem pode

dizer que o corpo que tem
n�o � formoso?

Deixa-me mulher, n�o me fa�a falar.

Por que n�o?

Com meu marido n�o falo de outra coisa!

Escuta. voc� gosta do seu marido?

Como?

Se o ama. Se deseja estar com ele...

N�o sei.

N�o treme quando ele se aproxima de voc�?

Quando aproxima seus l�bios
dos seus? Me diz.

N�o. N�o senti nunca.

Nunca? Nem mesmo ao dan�ar?

Nunca dancei com meu marido.

Talvez... uma vez... com Victor...

Continua.

Lembro que uma vez
me pegou pela cintura

e n�o lhe pude dizer nada,
porque n�o podia falar.

E outra vez, aos 14 anos, tamb�m Victor

me pegou em seus bra�os
para saltar um a�ude...

... e comecei a tremer e a bater os dentes.

� que eu sou envergonhada.

E seu marido...

Meu marido � outra coisa.
Meu pai me deu e eu aceitei...

com alegria de verdade.
Pois no primeiro dia

de noivado com ele,
j� pensei nos filhos.

Tudo ao contr�rio de mim.
Talvez por isso ainda n�o tenha parido.

Os homens tem que gostar, garota.

T�m de desmanchar as tran�as
e nos dar de beber da sua boca.

Assim anda o mundo.

Seu mundo, o meu n�o.
Eu penso muitas coisas

e essas coisas
s� pode realizar meu filho.

Eu me entreguei ao meu marido por ele,
e sigo me entregando para ver se chega,

mas nunca para me divertir.

O resultado � que est� vazia!

N�o, vazia n�o, porque estou me enchendo
de �dio. Me diz: eu tenho a culpa?

� preciso buscar no homem
o homem, e nada mais?

Ent�o, em que pensa quando te deixa
na cama com os olhos tristes

olhando o teto, e d� meia volta e dorme?
Devo pensar nele,

ou no que pode
sair brilhando do meu peito?

Eu n�o sei, me diz, por caridade!

Que criatura mais linda voc� �.
Deixa-me mulher.

N�o me fa�a falar mais.

S�o assuntos de honra e eu n�o queimo
a honra de ningu�m. Voc� saber�.

De qualquer modo, devia ser
menos inocente.

As mulheres que se
criam no campo como eu,

t�m fechadas todas as portas.

Tudo s�o meias palavras,

por que dizem que dessas coisas
n�o se pode saber .

Voc� tamb�m se cala e se vai com
ar de doutora, sabendo tudo...

A outra mulher mais serena eu falaria.

A voc� n�o. Sou velha e sei o que digo.

Ent�o, que Deus me ampare.

Deus n�o, n�o!
Eu nunca gostei de Deus.

Quando vai descobrir que n�o existe?

S�o os homens os que devem te amparar.

E por que me diz isso, por qu�?

Mesmo assim devia haver Deus,
mesmo que fosse pequenino,

para que mandasse raios contra
os homens de semente apodrecida...

que terminam com a alegria dos campos.

N�o sei o que quer me dizer.

Bem, eu me entendo.

Tem paci�ncia.

� muito jovem ainda.

Que quer que eu fa�a?

Aconteceu alguma coisa?

N�o, nada.

Por que pergunta?

� que � tarde.

Me distra� pelo caminho...

Aqui est� o almo�o.

Sempre me traz demais,
j� disse que n�o necessito comer tanto!

Anda, vai para casa!

N�o se distraia!

Voltar� logo?

N�o sei, tenho muito trabalho.

Eu te esperarei.

Vai de volta � vila?

Sim, vou para l�.

Aonde v�o com tanta pressa?

Entregar a comida e voltar correndo.

Deixei o nen� dormindo
e n�o tem ningu�m em casa.

Pois anda ligeiro, mulher.
N�o se pode deixar as crian�as sozinhas.

Tem porcos em casa?

N�o. Mas tem raz�o.
Devo apressar-me.

Anda. Assim acontecem as coisas.

N�o se d� conta do que
� um nen� pequeno.

A coisa que nos parece mais inofensiva
pode acabar com eles.

Uma agulha, um gole d'�gua.

� verdade. Vou correndo.

Se tivesse 4 ou 5 n�o falaria assim.

Por qu�? Ainda que tivesse 40.

De qualquer modo, voc� e eu, n�o os tendo,
vivemos mais tranquilas.

Eu n�o.

Eu sim. Que luta!

Em compensa��o, minha m�e n�o faz outra coisa
que me dar ch�s para que eu os tenha,

e em outubro me levar� ao Santo
que dizem que d� a quem pede com f�.

- Minha m�e pedir�. Eu n�o.
- Ent�o por que se casou?

Porque me casaram. Todas se casam.

Se continuarmos assim, n�o vai haver
solteiras mais do que as meninas.

De fato a gente se casa
antes de ir � igreja.

Mas as velhas se esfor�am
em todas essas coisas.

Eu tenho 19 anos e n�o gosto de
cozinhar, nem lavar.

Bem, pois todo o dia tenho de estar fazendo
o que n�o me agrada.

E para qu�? Que necessidade
tem meu marido de ser meu marido,

se faz�amos o mesmo antes e agora?

Bobagens dos velhos.

Cala-te, n�o diga essas coisas.

Acha que sou louca?

O que te posso dizer
� a �nica coisa que aprendi na vida:

todas as pessoas est�o
enfiada dentro de sua casa

fazendo o que n�o lhes agrada.

� bem melhor estar na rua,

no arroio, tomando refresco de anis.

- Voc� � uma menina.
- Sim, mas n�o sou louca.

Escuta, sua m�e � a que vive
na casa mais alta da vila?

Na �ltima casa?

- Sim.
- Como se chama?

- Dolores. Por que pergunta?
- Por nada.

Por algo perguntaria.

Bem, tenho de ir.

Se n�o meu marido n�o come.

Pena n�o poder dizer meu noivo,
n�o acha?

At� logo.

Aonde vai a linda?

Seguindo o canto. Voc� cantava?

Sim.

- Como canta bem! Eu nunca tinha te ouvido.
- N�o?

E que voz t�o forte e t�o bonita.

Sou uma pessoa alegre.

� verdade.

Como voc� � triste.

N�o sou triste.

� que tenho motivos para estar.

O seu marido � mais triste.

Ele sim. Tem um car�ter seco.

Sempre foi igual.

- Tem de trazer a comida?
- Sim.

- O que tem aqui?
- Onde?

Aqui, na bochecha;
como uma queimadura.

N�o � nada.

Me pareceu.

Deve ser o sol.

Escuta?

- O qu�?
- N�o ouve chorar ?

- N�o.
- Pareceu-me ouvir uma crian�a chorar.

- Sim?
- Muito perto. E chorava como afogado.

Aqui sempre v�m muitos meninos
roubar fruta.

N�o, n�o! � a voz de um menino pequeno.

N�o ou�o nada.

Devem ser ilus�es minhas.

- Yerma! Que faz ainda por aqui?
- Nada!

- Devia estar em casa !
- � que me distra�!

N�o entendo como pode se distrair!

- Assim dar� o que falar ao povo.
- Juan, em que est� pensando?

- N�o digo por ti, digo pelas pessoas!
- Que v�o para o inferno!

- Isso � feio numa mulher.
- Quem dera eu fosse uma mulher.

Terminou a conversa, ouviu?

Vai para casa.

- Mas ...
- N�o !

Estarei toda a noite regando.

H� pouca �gua.
� minha at� o nascer do sol...

e tenho de defend�-la.

Deita e dorme.

Dormirei!

Quem pode dizer que este
corpo que tem n�o � bonito?

Os homens tem que gostar, garota.

T�m de desmanchar as tran�as
e nos dar de beber de sua boca.

Escuta. Voc� ama seu marido?

... homens de semente apodrecida que
terminam com uma alegria dos campos.

... criaturas silenciosas... Deixa-me.

S�o assuntos de honra e eu
n�o queimo a honra de ningu�m.

O que quer que eu fa�a?
O que quer que eu fa�a?

O que quer que eu fa�a?

Eu plantei um tomilho

Eu o vi crescer

A que quer a honra

Que se porte bem

A que quer a honra, que a conquiste.
Isso, isso, que a conquiste.

- Eu n�o gosto de falar.
- Mas aqui se fala.

� que nunca se sabe nada.
Mas n�o h� nada para saber.

N�o. Mas o marido levou suas irm�s
para viver com eles, as solteironas.

Algum motivo ter�.

- Voc�s as viram?
- Eu sim.

Tamb�m ...
Antes estavam untadas com f�.

Eu penso que cozinham sua comida
com o �leo das l�mpadas.

Ah, eu n�o podia viver com elas .

Ai, da casada seca!
Ai, da que tem peitos de areia!

- Mas voc�s a viram com outro?
- N�s n�o, mas o povo sim.

Sempre o povo!

- Com quem?
- Algu�m, viram?

De que jeito?

Quando n�o o olha, porque n�o est�
diante de si, transparece nos olhos.

Mentira! Isso � mentira!
Mentira!

E mentem que a viram falando...

Mas falar n�o � pecado.

Quem olha as coxas dos homens?

Existe uma coisa que � o olhar.

N�o � o mesmo olhar uma rosa
e olhar as coxas dos homens.

O marido vai de novo �s suas terras.

Mas pode-se saber
o que aconteceu?

A noite passou sentada na soleira,
apesar do frio.

Custa-lhe entrar em sua casa.

As est�reis s�o assim: em vez de fazer
rendas ou doces de ma��,

preferem andar descal�as pelos rios.

Se cobrem de p� e "rouge"
buscando outro que n�o o marido.

- Quem � voc� para dizer essas coisas?
- Eu sei o que sei!

Se n�o tem filhos,
n�o � por sua culpa.

Tem filhos a que quer t�-los.

As adocicadas n�o s�o as melhores
para ter o ventre recheado.

- E o marido?
- O marido � como surdo.

Tudo se arranjaria se tivesse filhos.

Isso � coisa de gente
que n�o se conforma com sua sina.

Mas a culpa � de quem?
Quando um pai n�o d� filhos,

deve cuidar mais de sua mulher.

A culpa � dela, que larga
chispas quando fala.

Que diabo te entrou no corpo
para que fale assim?

E quem te deu licen�a
para me dar conselhos?

Por Deus! Calem-se!

Eu costuraria com uma agulha
as l�nguas faladoras.

E eu o peito da fingidas.

N�o v� que a� v�m as cunhadas?

Alegria, alegria, do ventre redondo,
debaixo da camisa!

Olha, est�o saindo os rebanhos.

Como gosto do cheiro das ovelhas!
E por que n�o? Cheiro do que t�m.

V�o todas juntas!
Olha como correm!

Sim, sim, parece que sa�ram todos.

N�o, n�o, parece que falta um.

- Sim, sim, falta um.
- Qual?

O de Victor.

Boa tarde, Victor.
J� vai se recolher?

Sim, e voc�, aonde vai?

Vou buscar �gua fresca para a comida.

- Precisava sair.
- Agora quase n�o te vejo.

� que n�o saio muito de casa.
Sabe que Juan...

Sim, eu sei, mas tem de sair.
Est� ficando branca como ele.

Deve pegar sol, vento.
E tem de alegrar o seu rosto.

E quando dan�amos aquela vez...
Se lembra?

Boa tarde, Victor.
Boa tarde, Yerma.

Boa tarde.

Bem, devo ir.

Em casa n�o sabem que sa�,
e Juan est� por chegar.

- Alegro-me por ter te visto.
- E eu a voc�.

Yerma, cada criatura tem sua raz�o.

N�o se atormente!

- Adeus, Victor.
- At� logo.

Ol�, boa tarde.

Faz muito que n�o sa�a?

E muito sem suas cunhadas.

Agora saio pouco.

E teu marido, continua indo para o campo?

Claro, por que pergunta?

N�o, por nada.

Anda, vamos, nos esperam
em casa para comer.

Adeus, Yerma.

Yerma, o c�ntaro.

- E Yerma?
- Saiu.

Ah, teve de ir � fonte.

Voc�s sabem que eu
n�o gosto que ela saia s�.

Podem ir pondo a mesa.

Hoje estive podando as macieiras.

Mere�o bem o p�o que como.

� tardinha fiquei pensando...

porque tenho tanta ilus�o

se n�o tenho uma ma�� para levar � boca.

E a outra n�o vem...

Uma de voc�s t�m sempre que ir com ela.

Por isso comem em minha mesa
e bebem do meu vinho.

Minha vida est� no campo,
mas minha honra est� aqui.

E minha honra � tamb�m a de voc�s.

- Vem da fonte?
- Fui buscar �gua fresca para a comida.

- Como est�o as terras?
- Bem.

Ontem estive podando as macieiras.

Ficar� hoje?

N�o. Tenho de cuidar do gado.

Voc� sabe que isso devem
fazer os donos.

Sei muito bem. N�o precisa repetir.

Cada homem tem sua vida.

E cada mulher a sua.

N�o te pe�o que fique.

Aqui tenho o que preciso.
E suas irm�s me guardam bem.

Em sua casa como p�o quente
e requeij�o e cordeiro assado.

E seu gado come pasto fresco no monte.

Pode viver em paz.

Para viver em paz
� preciso estar tranq�ilo.

- E voc� n�o est�?
- N�o! N�o estou!

� que n�o sabe como sou.

As ovelhas no cercado
e as mulheres em sua casa!

Voc� sai demais!

Justo. As mulheres dentro das suas casas.

Quando as casas n�o s�o tumbas.

Quando os len��is se gastam com o uso.

Aqui n�o. Cada noite, quando me deito,
encontro minha cama

mais nova, mais brilhante,
como rec�m trazida da cidade.

Voc� mesma reconhece
que tenho raz�o para me queixar.

Que tenho motivos para estar alerta!

Alerta? Por qu�?
N�o te ofendo em nada.

Vivo submissa a voc� e o que sofro
guardo agarrado nas carnes.

E cada dia que passar ser� pior.

Eu saberei carregar minha cruz
como melhor consiga.

Se eu pudesse logo ficar velha

e tivesse a boca como uma flor murcha,

poderia sorrir e continuar a vida contigo.

Mas n�o posso.
Agora me deixa com meus espinhos.

Fala de uma maneira que
eu n�o entendo.

N�o te privo de nada.

Mando trazer de outros lugares
as coisas que te agradam.

Tenho meus defeitos,
mas quero ter sossego contigo.

Quero dormir fora e saber
que voc� dorme tamb�m.

Mas eu n�o durmo,
eu n�o posso dormir.

Te falta algo? Diz. Responde!

Sim, me falta.

Sempre a mesma coisa.
J� faz mais de cinco anos.

Eu estou quase esquecendo.

Mas eu n�o sou voc�.

Os homens t�m outra vida, o gado,

as �rvores, as conversas;

as mulheres n�o temos mais
que os filhos e o seu cuidado.

Por que n�o traz um filho do teu irm�o?
Eu n�o me oponho.

N�o quero cuidar dos filhos dos outros.

Eu sentiria gelarem os bra�os
ao traz�-los.

Isso, vive a�rea,
sem pensar no que devia

e se esfor�a por ter a cabe�a dura.

A teu lado n�o se sente mais que
inquietude, desassossego.

- Deve se conformar.
- Eu n�o vim aqui para me conformar.

Quando estiver com a
cabe�a amarrada com um

pano para que n�o se abra minha boca

e as m�os bem atadas dentro do caix�o,

nessa hora terei me conformado.

Ent�o, o que quer, afinal?

Quero beber �gua e n�o h� �gua,

quero subir ao monte e n�o tenho p�s,

quero bordar minhas roupas

e n�o encontro fios.

O que acontece � que n�o �
uma mulher verdadeira...

e procura a ru�na
de um homem sem vontade.

Eu n�o sei quem sou.

Deixa-me desabafar.
N�o te faltei em nada.

N�o gosto que as pessoas me apontem.

Porisso quero essa porta fechada.

- Falar com as pessoas n�o � pecado.
- Mas pode parecer.

Quando puxarem conversa,
lembre-se de que � uma mulher casada.

- Casada!
- E lembre-se de que as fam�lias t�m honra...

e que a honra � uma carga
que se carrega a dois.

Perdoa-me, Yerma!
Perdoa-me.

Mas do jeito que me olha
eu n�o deveria te pedir perd�o

mas obrigar-te, encerrar-te,
porque para isso sou o marido

Paramos por aqui.

Vamos comer.

Ouviu?

Come voc� com as suas irm�s.
Eu n�o tenho fome.

Como queira.

Maria!

Ol�, Yerma.

Por que vai t�o ligeiro?

Porque vou com o nen�...
Como sempre chora!

Tem raz�o.
Fico t�o triste de te ver

e �s outras mulheres
cheias de flores por dentro,

e a mim mesmo t�o in�til
no meio de tanta beleza!

N�o se queixe! Voc� tem outras coisas.
Se me desse ouvidos, seria feliz.

A mulher do campo que n�o d� filhos
� in�til como um feixe de espinhos.

Toma, contigo se sente melhor.
Eu n�o devo ter m�os de m�e.

Por que diz isso?

Porque estou farta de t�-las
e n�o pod�-las usar em benef�cio pr�prio.

Porque estou inferiorizada

at� o �ltimo,
vendo que os trigos crescem,

que as fontes n�o secam

e as ovelhas parem centenas de cordeiros.

Parece que todo o campo de p�

me ensina suas crias ternas,
adormecidas,

enquanto eu sinto dois golpes
de martelo aqui,

em vez da boca do meu filho.

N�o gosto do que diz.

Claro. As mulheres quando t�m filhos

n�o podem pensar nas que n�o temos,

como quem nada em �gua doce
e n�o tem ideia da sede.

Cada vez tenho mais desejo
e menos esperan�a.

- Coisa horr�vel!
- Acabarei acreditando que eu mesma sou meu filho.

Muitas vezes
quando dou comida aos bois,

e passo pelo escuro do alpendre,

meus passos soam a passos de homem.

V� s� como vivo!

Cada pessoa tem a sua raz�o.

E suas cunhadas?

Quero estar morta e sem mortalha
se alguma vez converso com elas.

- E seu marido?
- S�o tr�s contra mim.

- O que pensam?
- Figura��es.

Acham que eu posso gostar
de outro homem,

e n�o sabem que ainda
que eu gostasse,

o primeiro da minha fam�lia � a honradez.
S�o pedras diante de mim.

Eles n�o sabem que eu, se quero,
posso ser �gua de arroio que os carregue.

De qualquer modo, acho que seu marido
segue te amando.

Meu marido me d� p�o e casa.

J� acordou!

Tem os mesmos olhos que voc�!

Viu? Se d� conta Maria?

Os mesmos olhos que voc�.

- Psss...psss...
- Quem �?

Esperei voc� sa�r.
Minha m�e est� te esperando.

Est�s sozinha ?

- Com duas vizinhas.
- Diz que esperem um pouco.

-Voc� vai? N�o te d� medo?
- Vou.

- S� voc� mesma!
- Que me esperem ainda que fique tarde!

Porque eu vou naquele lugar.

- Boa noite, Victor.
- Ol�, Yerma. Juan est�?

Sim, entra.

- Senta.
- Obrigado estou bem assim.

Juan...

Venho me despedir.

Vai com seus irm�os?

Meu pai quer assim.

- J� deve estar velho.
- Sim, muito velho.

Faz bem trocando de campo.

Todos os campos s�o iguais.

N�o. Eu iria muito longe.

� tudo igual.
As mesmas ovelhas t�m a mesma l�.

Para os homens sim;
as mulheres somos outra coisa.

V�o em frente sem ligar
para delicadezas.

De mim sei que estou cansada
da �gua desses po�os.

Pode ser.

- Victor!
- Diga.

Por que vai embora?
Aqui as pessoas gostam de voc�.

- Eu me portei bem?
- Sim, se portou bem.

Quando era rapaz, me carregou
nos bra�os, lembra-se?

- Nunca se sabe o que vai acontecer.
- Tudo muda.

Tudo n�o. H� coisas fechadas atr�s

dos muros que n�o podem mudar,

porque ningu�m as nota.
Mas se sa�ssem

de repente e gritassem,
encheriam o mundo.

Isso n�o adiantaria nada.
O a�ude no seu lugar,

o rebanho no cercado, a lua no c�u
e o homem com seu arado.

Me disseram que hoje vai embora.
J� est� de partida?

Sim, quero passar o porto
antes do amanhecer.

- Tem alguma queixa de mim?
- N�o. Foi bom pagador.

- Comprei os rebanhos dele.
- Sim?

- S�o seus.
- N�o sabia.

- � verdade.
- Teu marido h� de ter a fazenda cheia.

O fruto v�m �s m�os
do trabalhador que o busca.

J� n�o temos lugar
para botar tantas ovelhas.

A terra � grande.

Vamos juntos at� o arroio.

Desejo... a maior
felicidade para esta casa.

Deus te escutar�! Sa�de!

Disse algo?

Sa�de, eu disse.

Yerma?

Yerma!

Yerma! Yerma!

Yerma n�o est�!

Yerma! Yerma!

Yerma!

Doces cravos, doce cruz,
doce nome de Jesus.

Doces cravos, doce cruz,
doce nome de Jesus.

Doces cravos, doce cruz,
doce nome de Jesus.

... para que seu sangue
n�o desapare�a para sempre...

... escuta Santana essa ora��o...

Doces cravos, doce cruz,
doce nome de Jesus.

Doces cravos, doce cruz,
doce nome de Jesus.

Doces cravos, doce cruz,
doce nome de Jesus.

Foi corajosa.

N�o h� no mundo for�a
como a do desejo.

Mas no cemit�rio estava muito escuro.

Muitas vezes eu j� disse essas ora��es

no cemit�rio com mulheres
que queriam filhos

e todas ficaram com medo.
Todas menos voc�.

Eu vim pelo o resultado.
Creio que voc� n�o � uma mulher mentirosa.

N�o sou. Que minha l�ngua se encha
de formigas,

como a boca dos mortos,
se alguma vez menti.

A �ltima vez fiz a ora��o
com uma mendiga

que estava seca h� mais tempo que voc�,

e se ado�ou seu ventre
de uma maneira t�o linda

que teve dois filhos,
l� embaixo no rio,

porque n�o teve tempo
de chegar em casa,

e ela mesmo os trouxe numa fralda
para que eu os limpasse.

E conseguiu vir andando desde o rio?

Veio. Com as roupas ensopadas de sangue...
mas com a cara feliz.

- E n�o lhe aconteceu nada?
- Que ia lhe acontecer? Deus � Deus!

Naturalmente. Deus � Deus.
N�o podia acontecer nada.

A n�o ser pegar as criaturas
e lav�-las na �gua.

Os animais os lambem, n�o � verdade?
Eu n�o sinto nojo do meu filho.

Eu imagino que as que

rec�m pariram est�o
iluminadas por dentro e

os filhos dormem
horas e horas sobre elas,

ouvindo esse arroio de leite morno
que vai enchendo os peitos

para que eles mamem e brinquem

at� que n�o queiram mais,
at� que retirem a cabe�a:

"Um pouquinho mais, filhinho"...

E lhes encha a cara de gotas brancas.

Agora ter� um filho.
Posso garantir.

Posso garantir.

Terei porque tenho de ter.

Ou n�o entendo o mundo.

�s vezes, quando j� estou convencida
de que nunca mais...

me sobe um calor�o pelos p�s

e tudo parece vazio,

e os homens que v�o pela rua
e os touros e as pedras

me parecem como coisas de algod�o.
E me pergunto:

por que existem?

� normal que uma mulher casada
queira ter filhos,

mas se n�o os tem,
por que essa �nsia por eles?

O importante deste mundo
� deixar o tempo passar.

N�o te critico.
J� viu como ajudei com as rezas.

Mas que terra pensa deixar ao teu filho,

ou que felicidade,
ou cadeira de prata?

Eu n�o penso no amanh�,
penso no hoje.

Voc� est� velha e v� tudo
como um livro j� lido.

Eu penso que tenho sede
e n�o tenho liberdade.

Eu quero ter meu filho nos bra�os
para dormir tranq�ila.

E, ouve bem, e n�o se espante
com o que digo:

ainda que eu soubesse
que meu filho me iria martirizar depois

e iria me odiar e iria
me arrastar pelos cabelos pelas ruas,

receberia com alegria seu nascimento.

Que � muito melhor chorar
por um homem vivo que nos apunhala,

por esse fantasma sentado
ano ap�s ano sobre meu cora��o.

Voc� � muito jovem para ouvir conselho.

mas enquanto espera a gra�a de Deus,
se deixe amparar pelo amor de seu marido.

Ai! Pusesse o dedo na ferida maior
que t�m as minhas carnes.

Seu marido � bom.

� bom! � bom! Para qu�?
Oxal� fora mau. Mas n�o.

Ele vai com as ovelhas pelos caminhos
e conta o dinheiro de noite.

Quando me cobre, cumpre com seu dever,
mas eu sinto sua cintura fria,

como se tivesse o corpo morto, e eu

que sempre tive asco
das mulheres quentes,

queria ser naquele instante
como uma montanha de fogo.

Yerma!

N�o sou uma casada indecente;

mas sei que os filhos nascem
do homem e da mulher.

- Ah, se eu os pudesse ter sozinha!
- Pensa que seu marido tamb�m sofre.

- N�o sofre. Ele n�o deseja filhos.
- N�o diga isso!

Eu o conhe�o no olhar,
e como n�o quer, n�o me d�.

N�o o quero, n�o o quero.

E, no entanto, � minha �nica salva��o.

Por honra e por fam�lia.
Minha �nica salva��o

Yerma. Logo vai amanhecer.
Deve ir para casa.

Num instante v�o sair os rebanhos
e n�o conv�m que te vejam sozinha.

Necessitava desse desabafo.
Quantas vezes repito as ora��es?

A do louro, duas vezes,
e ao meio dia a de Santana.

Quando estiver gr�vida,

me traz o saquinho de trigo
que me prometeu.

Anda Yerma, vai que
ainda n�o amanheceu!

Em seguida v�o abrir os port�es.
D� volta pelo a�ude.

- N�o sei por que vim!
- Est� arrependida?

- N�o!
- Se tem medo, te acompanho at� a esquina.

Anda. J� ser� dia
quando chegar em casa.

N�o, n�o � ningu�m. Vai com Deus.

- Quem �?
- Sou eu.

- Abre. Abre ou n�o abre?

Aqui est�.

Aqui estou.

O que faz neste lugar?

Se pudesse gritar,
levantaria todo o povo

para ver aonde anda
a honra da minha casa;

mas vou engolir em seco
e me calar porque � minha mulher.

Se pudesse gritar,
tamb�m eu o faria

para que se levantassem at� os mortos

e vissem a limpeza que me cobre.

N�o, isso n�o! Ag�ento tudo menos isso.
Voc� me engana, me enrola,

e como sou um homem
que trabalha a terra,

n�o tenho ideia para suas ast�cias.

- Juan!
- E voc�s n�o falem!

Sua mulher n�o fez nada de mal!

Est� fazendo desde
o dia do casamento.

Olhando-me com duas agulhas,
passando as noites

acordada com os
olhos abertos ao meu lado

e enchendo com suspiros maus meus travesseiros.
- Cale-se!

E eu n�o posso mais.
� preciso ser de ferro para ver a teu lado

uma mulher que te quer
enfiar os dedos no cora��o

e que sai � noite para a rua

em busca de qu�? Diz!
Buscando o qu�?

As ruas est�o cheias de machos.
Nelas n�o h� flores para colher.

N�o te deixo falar nem uma palavra...
Voc� acha que sua gente

s�o os �nicos que t�m honra,

e n�o sabem que do meu lado
nunca houve nada para ocultar.

Anda. Vem e cheira meus vestidos:

vem ver se
encontra algum cheiro

que n�o seja o teu,
do teu corpo.

Pode me p�r no meio
da pra�a e cuspir em mim.

Faz comigo o que quiser,
pois sou sua mulher,

mas livra-te de p�r nome
de homem sobre meu peito.

N�o sou eu quem p�e,
� voc� que o faz com

sua conduta,
e o povo come�a a falar.

Come�a a dizer claramente.

Quando chego em uma roda,
todos se calam;

quando vou pesar farinha,
todos calam;

e at� de noite, no meio do
campo, quando acordo

me parece que tamb�m
se calam os ramos das �rvores.

Eu n�o sei porque come�am
os ares maus que agitam o trigo;

e olha se o trigo � bom!

Eu sei o que procura uma mulher

sempre fora do seu telhado.

Procuro voc�, procuro voc�,

� voc� que procuro, dia e noite,
sem encontrar sombra para respirar.

- � seu sangue e seu amparo que desejo.
- Deixe-me!

- N�o se afaste e fique comigo.
- Afaste-se!

Olha como eu fico s�,

como se a lua se procurasse a
si mesma, no c�u.

Olhe-me!

Deixa-me j� de uma vez!

Deus meu! Maldito seja o meu pai
que me deixou seu sangue de pai de cem filhos.

Maldito seja o meu sangue que os procura
batendo nas paredes.

- Vem gente! Fale baixo!
- N�o me importa. - Cale-se, j� disse!

Deixe livre ao menos minha voz, agora que
estou afundando no mais escuro do po�o.

Deixe que do meu corpo saia ao menos
essa coisa linda e se encha o ar.

Sil�ncio!

- Isso mesmo! Sil�ncio.
- Vamos. Vamos!

E � in�til que me retor�a as m�os!
Uma coisa � querer com a cabe�a...

Uma coisa � querer com a cabe�a
e outra coisa � que o corpo...

(maldito seja o corpo!) n�o nos responda.

Est� escrito e eu n�o vou lutar
at� o fim contra os mares.

Que minha boca fique muda!

Eu n�o gosto de Deus!

Quando vai se dar conta
de que n�o existe?

Quando vai se dar conta
de que n�o existe?

S�o os homens
os que devem te amparar.

S�o os homens
os que devem te amparar.

Ainda que devesse haver Deus,
mesmo que fosse pequenino,

para mandar raios contra os homens
de semente apodrecida

que inundam a alegria dos campos.

Ainda que devesse haver Deus.

Ainda que devesse haver Deus.

Ainda que devesse haver Deus.

No p�tio late o cachorro,

nas �rvores canta o vento.

Os bois mugem ao boiadeiro

e a lua ondula meus cabelos.

Que pede menino, desde t�o longe?

Que pede menino, desde t�o longe?

desde t�o longe?

Yerma! N�o pode continuar assim!

Quase n�o fala! N�o come!

Yerma, por Deus! O que quer?

Lembre-se!

Ontem vi Maria, falou-me do Santo.

Voc� sabe que eu nunca vi
nada que compense.

Sou capaz de te levar eu mesmo.
Quer ir ao Santo?

Quer ir?

Est� esfriando.

Vamos para dentro, Yerma.
Vamos comer.

Bebeu a �gua santa?

Sim.

- E agora vamos a ele.
- N�s cremos nele.

V�m pedir filhos e a cada ano v�m mais
homens s�s a esta romaria;

- O que est� acontecendo?
- Por que v�m se n�o cr�em?

Eu fico louca para ver.
E por cuidar do meu filho.

No ano passado dois se mataram
por uma casada est�ril e quero vigiar.

E em �ltimo caso,
venho porque me d� vontade.

- Que Deus te perdoe!
- Que perdoe voc�.

A� est� o carro.
Custou muito que viesse.

Esteve um m�s sem levantar
da cadeira.

Tenho medo. Tem uma ideia
que n�o sei qual �,

mas desde logo � uma ideia m�.

Bem, aqui as deixo entre santos e milagres.

Mas recomendo melhor a um rapaz,
com sangue nas veias.

Voc� tamb�m n�o tem filhos ?

N�o vim para mim,
acompanho minha irm�.

Ela j� vem h� oito anos sem resultado.

Tem filhos a que deve ter .

Isso � que eu digo.

Nunca gostei dessa romaria.
Vamos aonde est�o as pessoas.

No ano passado, quando
escureceu, uns rapazes

apertaram com suas m�os
os peitos da minha irm�.

Num c�rculo de 4 l�guas
s� se ouvem palavras terr�veis.

Eu vi mais de 40 ton�is
de vinho, atr�s da ermida.

Um rio de homens solit�rios
aparece nestas terras.

Anda, vamos.

Sobre sua carne murcha,
flores�a a rosa amarela

Senhor, que flores�a a rosa.

Senhor, que flores�a a rosa.
n�o a deixeis na sombra.

... que flores�a a rosa.
N�o a deixei na sombra.

... n�o a deixeis na sombra.

e no ventre das tuas servas
a chama escura da terra.

Senhor, que flores�a a rosa.

Senhor, que flores�a a rosa.
N�o a deixeis na sombra.

Sobre sua carne murcha,
flores�a a rosa amarela.

Escuta a penitente
de tua santa romaria

abriga a rosa em minha carne
ainda que tenha 1000 espinhos.

Senhor, acalma com tua m�o
a brasa de seu rosto.

Senhor, que flores�a a rosa.
N�o a deixeis na sombra.

Yerma!... Yerma!

Por que veio?

N�o sei.

- N�o se convence? E seu marido?
- Est� a�.

Menos ais, e mais alma. Na primeira vez
que te vi, n�o quis te dizer nada.

Mas agora sim.

E o que pode dizer que eu n�o saiba?

O que j� n�o pode calar.
O que est� embaixo do tapete.

A culpa � de seu marido. Ouviu?

Eu deixaria me cortarem as m�os.

Nem seu pai, nem seu av�,
nem seu bisav�,

se portaram como homens honrados.

Para terem filhos,
tiveram que juntar c�u e terra.

S�o feitos de saliva.
Em compensa��o, sua gente, n�o.

Tens irm�os e primos
num c�rculo de 100 l�guas

e olha que maldi��o veio cair
sobre tua formosura.

Uma maldi��o. Um monte
de veneno sobre as espigas.

Mas voc� tem p�s
para ir-se da sua casa.

Para ir-me?

Claro.

Aqui as mulheres v�m
conhecer homens novos.

E o Santo faz o milagre.

Meu filho est� sentado
atr�s da ermida te esperando.

Minha casa precisa de uma mulher.
Vai com ele!

Meu filho sim � de sangue.
Como eu.

Se entrar na minha casa,
ainda sentir� cheiro de cacto.

A cinza da sua colcha se
tornar� p�o e sal para os filhos.

Anda. N�o liga para as pessoas.

E quanto a seu marido,
h� em minha casa ra�zes e ferramentas

para que ele n�o passe
sequer na frente.

Eu nunca o faria.
N�o posso ir procurar.

Voc� acha que posso conhecer outro homem?
Onde p�e minha honra?

A �gua n�o anda para tr�s,
nem a lua-cheia sai ao meio-dia.

Vai. Pensou mesmo
que eu me dobraria a um outro homem?

Que eu v� pedir o que � meu
como uma escrava?

Conhe�a-me, para que
nunca me fale mais. Eu n�o procuro.

Quando se tem sede,
se agradece a �gua.

Eu sou como um campo seco
onde cabem arando 1000 juntas de bois

e o que voc� me oferece � um
pequeno copo de �gua de po�o.

A minha dor j� n�o est� nas carnes.

Pois continue assim.
Se � do seu gosto.

Como os cardos do sequeiro,
espinhosa, murcha.

Murcha, sim, j� sei! N�o � preciso

que me esfregue na cara.

Desde que me casei, estou
�s voltas com essa palavra,

mas � a primeira vez que a ou�o,

a primeira vez que me dizem na cara.

A primeira vez que vejo que � verdade.

N�o me d� nenhuma pena, nenhuma.

Vou procurar outra mulher para meu filho.

Que bom que te alcancei.

� hora de falar.

Fale!

E de que eu me queixe.

Com que motivos?

Que tenho um amargo na garganta.

E eu nos ossos.

Chegou o �ltimo momento de resistir a

esse lamento cont�nuo por coisas obscuras,

fora da vida, por coisas que est�o no ar.

Fora da vida, disse?
No ar, disse?

Por coisas que n�o aconteceram
e nem eu nem voc� dirigimos.

Continua!

Por coisas que a mim
n�o importam. Escuta?

Que a mim n�o importam.
J� � preciso que eu te diga.

A mim importa o que eu
tenho entre as m�os.

O que eu vejo com meus olhos.

Isso � o que eu queria
ouvir dos seus l�bios.

N�o se v� a verdade
quando se est� dentro de si mesma,

mas que grande �, e como grita

quando vem para fora
e levanta os bra�os!

N�o te importa! J� escutei.

Tinha que ser assim. Escuta-me.

Muitas mulheres seriam felizes
levando a sua vida.

Sem filhos a vida � mais doce.

Eu sou feliz por n�o t�-los.

N�o temos culpa alguma.

- E o que procurava em mim?

A ti!

Isso! Buscava a casa, a tranq�ilidade

e uma mulher. Nada mais.

� verdade. Como todos.

E o resto? E seu filho?

N�o ouviu que n�o me importa?
N�o me pergunte mais!

Tenho de te gritar no teu ouvido
para que saiba

e para que enfim viva tranq�ila!

E nunca pensou nele
quando me viu desej�-lo?

Nunca.

Ent�o n�o devo esper�-lo?

N�o!

Nem voc�?

Nem eu tamb�m.

Conforme-se!...

Murcha!

E viveremos em paz,

um e outro,

com suavidade,

com agrado.

Abrace-me!

O que quer?

Voc�. Procuro voc�.

Me procura como quando
quer comer uma pomba.

Est� t�o linda!

Beija-me!

Beija-me! Beija-me!

Assim!

Murcha!

Murcha, mas segura.

Agora, sim, sei com certeza.

Murcha... e s�.

Vou descansar
sem acordar sobressaltada,

para ver se o sangue me anuncia
outro sangue novo.

Com o corpo seco para sempre.

Meu filho!... Meu filho!... Meu filho!

Maria!... Matei meu filho!...

Eu mesma matei meu filho!

Meu filho!

Meu menino! Meu menino! Meu menino!