All language subtitles for Mondo Lux - Die Bilderwelten des Werner Schroeter (2011)

Uma produção de Filmgalerie 451
em parceria com zdf/3sat

patrocinado por representantes autorizados
do Governo Federal da Cultura e Mídia

O Mundo Visual de Werner Schroeter

O Reino de Nápoles | 1978

Um filme de Elfi Mikesch

Montagem

Som

Prosseguindo nessa direção...

Aqui... E aqui...

Assim fica bom.
Acima do rosto.

Bonito.

- Sim.
- Não está mais pretensioso.

Era muito importante para Werner
fazer essas fotografias.

Ele já estava muito cansado.

Tínhamos feito filmes antes,

mas nunca fotografias.

E me deparei com a mesma...

com a mesma precisão, a mesma...

Ele tinha uma imagem na cabeça,
queria a neve de qualquer forma,

que ela caísse sobre meus cabelos.

E este foi o último momento
de criatividade

que compartilhei com Werner.

Como se estivéssemos fazendo
um pequeno filme juntos.

Esta Noite | 2008

Meu filme é um retrato
muito fiel do mundo.

É a história de uma cidade imaginária,

Santa Maria, que poderia ser Nova York
ou Wuppertal. Em todos os casos,

a destruição de uma comunidade,
de uma cidade, em uma noite,

na qual todos, os poderosos

e as vítimas, o pobre e o rico,

mudam seus comportamentos sociais

e assim se enfrentam.
- Você daria um bom ministro.

E por que não um presidente?

"O Presidente Luis Vignale",
soa bem, não?

Você não gostaria?

Ouviu isso?
Alguém gritou atrás da cortina.

Deve ser um fantasma.
Só existem fantasmas aqui.

Assim ainda está muito natural.

Dê uma volta e respire um pouco...

- Os fantasmas assustam você.
- Sim.

Mesmo que tente zombar deles.
Mas no fundo sente medo.

Ouviu isso?
Alguém gritou atrás da cortina.

Deve ser um fantasma.
Só existem fantasmas aqui.

Não, com mais energia.
Mais intensidade e mais voz.

Tive um encontro
com um tal de Manu.

Tive um encontro
com um tal de Manu.

Tive um encontro
com um tal de Manu.

Não tão alto.
Mantenha a intensidade,

- mas não tão alto.
- Certo.

Onde está Clara?

- O que quer dizer?
- Exato, mas com mais intensidade.

Advirta que é urgente de novo.

Ossorio é obcecado
com uma ideia de amor.

Assim como os outros
são obcecados pelo poder,

ele é obcecado pelo fantasma

de Clara Baldi, que nunca vemos,
mas que ele procura de um modo insano.

E durante a noite, amor e desejo
tornam-se uma obsessão.

Você dirigiu o filme
em condições difíceis.

Até que ponto a doença
condicionou seu trabalho?

Como todo mundo que faz muita coisa

tendo a ser preguiçoso.

O processo de sobrevivência
a uma doença fatal mostra claramente

como cada momento

é extremamente importante,

e acelera a reunião
de suas energias criativas.

Seria demais definir
a doença como uma terapia,

mas certamente leva a grandes
descobertas, a muitas descobertas.

E você passa a ter fé nas coisas,
quando está a ponto de perdê-las,

se você sobrevive à doença,
emerge com uma energia renovada.

Os Flocos de Ouro | 1975

A carta mostra...

A Morte!

Mais um vez...

E mais uma vez...

A Morte!

Traiamos o futuro!

Aquele que nos trai.

Aquele que nos ama.

Aquele que ao mesmo tempo
nos ama e nos trai.

Sempre a Morte.

Sempre a Morte.

Aqui é o coração e o sentimento.

Razão e sentimento.

Essas duas.

Aqui só tem uma linha...

- Não, tem uma interrupção.
- Mas olha como é grande a sua.

Aqui está paralela e muito distante.
No meu caso é quase uma linha única.

- Você é mais burro ou mais inteligente?
- Não, sou menos sentimental.

Isso não é novidade.

Sim, só queria uma confirmação.

E agora recomeça a paquera.

Você queria me explicar a diferença
entre o tumor e eu.

O tumor está dentro de mim
e se chama Mireille.

E vive na minha laringe
como uma camarão deprimido.

Enquanto você está ao meu lado.

A BELEZA DAS SOMBRAS

A BELEZA DAS SOMBRAS

Ensaio de "Heine e Schumann" | 2006

LÁ ONDE ESTOU

2006 em Düsseldorf.

A colagem para o ano
de Robert Schumann e Heinrich Heine.

"A Beleza das Sombras".

Naquele mesmo ano descobri
que estava doente.

"A Beleza das Sombras" é um olhar

além da morte, no passado
e no presente,

da beleza extinta
de Schumann e Heine.

Schumann, diretor musical em Düsseldorf,

um dia teve a maravilhosa ideia

de jogar-se no Reno
durante o carnaval.

Isso o levou a ser internado
em um hospital psiquiátrico.

Foi tratado por um médico,
mas nunca se recuperou completamente.

Hoje a doença de Schumann
seria definida

talvez como "excesso de música".
Talvez seu corpo fosse

tão movido pela música,
por aqueles espíritos

que movem sua alma,
a alma de Robert Schumann

que estava imersa na música,
e ao mesmo tempo a consciência

de que nunca estaria
suficientemente à altura

da aspiração de Shakespeare:

a alma da música deveria ser
a linguagem dos amantes.

Olho no meu coração
e vejo o mundo

até que de meus olhos ardentes
uma lágrima caia.

Através da distância brilha
com uma luz dourada.

O vento do norte me diz
que não o alcançarei.

Ó! Quão sutis são nossas fronteiras,
quão grande é o mundo

e quão fugaz é o tempo!

E quão fugaz é o tempo!

É preciso aceitar...

E a aceitação não é uma agonia.
É uma disciplina interior.

Não uma disciplina prussiana.
É uma disciplina interior.

É lidar consigo mesmo e com os outros,
e principalmente

saber reconhecer as próprias fraquezas
e transformá-las em vantagem.

Significa gerar energia
em um terreno perigoso e incerto.

Mas a energia é totalmente positiva.

Mesmo que ela leve rapidamente à morte
ou que a evite,

não deve afetar minha mente,
e não o faz.

Não me arraste para a morte
com o seu discurso.

Não quero mais ouvir:
isso é verdade ou isso é mentira.

O que quer que seja a verdade...

nenhum ser humano é capaz de dizer.

Ensaio de "Antígona e Electra" | 2009

Pai?

Agamenon?

Agamenon?

Onde você está, pai?

Não tem forças para voltar
seu rosto em direção a mim?

Chegou a hora.

É a nossa hora.

A hora que eles o massacraram.

Sua mulher e aquele que
com ela dormiu na mesma cama.

Em seu leito real.

Depois: "Electra, isso não é verdade."
Os três últimos versos.

- Sim.
- Eis o porquê. Certo.

Pelo mesmo motivo de antes.
Não é necessário.

Não é verdade.

"Antígona e Electra"

foi um risco. Foi

uma ideia espontânea dele
que eu aderi imediatamente.

Mas ele só teve a ideia,
porque ele pensa por associação.

E eu tinha que tentar sustentar
a abordagem dele.

Aquelas foram as melhores noites
dos nossos últimos meses...

Trabalhando nesse projeto.

Eu tinha que tentar, ou melhor...
me foi dada a oportunidade

e eu queria muito fazer parte
daquele projeto...

e tentei pegar essas duas histórias,

duas tragédias de grandes autores,

com suas grandes personagens femininas,
e transformá-las no que ele queria.

Essas foram as melhores noites
dos nossos últimos meses...

A solidão na qual o ser humano vive,

expressando-se sozinho,
sem ninguém presente.

Combina bem com o monólogo, não acha?

Eu a imagino delicada
mas não sentimental, obviamente.

Depois se intensifica até o ponto
de se tornar uma obsessão.

Mas evite berrar ou gritar.
É maravilhoso

quando a tensão é contida
ao máximo possível.

De modo que a intensidade fique presa,
depois se solte, depois fique contida

e vá subindo
como em uma escada imaginária,

e isso não deve ser
dramaticamente evidente

na voz ou nos gestos,
mas somente na intensidade.

O júri concede um prêmio especial,
um Leão de Ouro

a um homem cuja obra sempre foi

inovadora

independente

sem compromisso e
frequentemente provocativa.

De "Eika Katappa" a "Malina",

a "Esta Noite".

O Leão de Ouro Especial vai para
Werner Schroeter.

Eu o conheci em 1967, em Munique.

Estávamos todos juntos,

vinte estudantes
na Academia de Cinema, e Werner

era um desses vinte. De longe

o mais excêntrico.

O único "dândi" do grupo.

Mas não manteve essa imagem
por muito tempo.

A primeira vez que assisti "Eika Katappa"

pensei: "O que é isso?".
É meio que...

"Nosferatu" e "O Corcunda de Notre Dame",
mas também

"Juventude Transviada"
e "Astros em Desfile", e Pasolini,

ou "Acossado" de Godard...

Piloto de Bombardeio | 1970

Você queria simplesmente fazer
filmes engraçados?

Certamente o humor,

a farsa era uma forma de expressão
que me atraia muito.

Queria me expressar
com as pessoas com as quais vivia.

E era isso que me interessava.

Naquele tempo os meus filmes

eram subprodutos dos meus relacionamentos.

Você está me chamando de subproduto...

Ótima definição.

Acho que eu deveria primeiramente
beijar sua mão.

Um sinal de respeito.

Nos conhecemos há pelo menos 25 anos.
Essa é uma foto

de quando éramos jovens e bonitos.
Fomos amantes

por um curto e trágico período.

Quando éramos jovens só falávamos
sobre a velhice. Imaginávamos

como seria estar velho e doente.

E hoje já fizemos várias
cirurgias plásticas estéticas

e só falamos de quando éramos jovens.

- E o amor?
- Vou lhe contar.

Eu me deparei com uma criatura
metade homem, metade animal.

- Um Minotauro?
- Sim.

- E vive com você?
- Não.

- Ele vive em Wedding.
- Não vive na floresta?

- É mais ou menos a mesma coisa.
- Como aquele animal de Patópolis,

- um "pirazel"...
- Talvez. Não lhe perguntei.

- O que ele faz da vida?
- Com o que trabalha?

Não sei, na verdade.
As pessoas não dizem sempre a verdade.

- Não?
- Caramba!

- Que descoberta desconcertante!
- Por isso não faço perguntas.

Mas deve ter falado algo sobre si.

Ou chegou correndo
e bateu na porta dizendo:

"Aqui estou. Nu e peludo.
Vamos transar."

Não mesmo. Eu o observei.

- Onde? Na floresta?
- Eu o vi

e me excitei na hora.
- Onde?

Ele estava sozinho.

- Onde?
- Isolado.

Onde? Na floresta?
Na rua? Em uma casa noturna?

Estava lá, isolado.

Onde?

- Eu o vi.
- Sim, onde?

No subsolo? No esgoto?
Na floresta? Nas moitas?

Nos banheiros públicos?
Em um bar gay?

Quero saber onde se deu o encontro,
onde o viu,

esse animal peludo.

- É difícil descrever o lugar.
- Como um nirvana da alma.

Não estamos mais nos encontrando.

Jovem rapaz tão desgraçado
e amargurado,

tão profundamente confuso.

Por que você canta
com a doce voz da vida?

Prisioneiro da existência terrena,

exige rosas pintadas pela alvorada,

vindas de um campo árido
após a colheita.

Até a morte!

Enquanto se agarra
à doçura da vida.

O Rei das Rosas | 1985

A foto foi tirada depois
da prévia de "Melina".

Na mesma noite em que começou
a guerra do Iraque em 1991.

Dava para ver a guerra pela TV
e de manhazinha

o sol estava com esta luz estranha,
então eu...

não me lembro o tempo de
exposição, talvez quinze segundos.

Esse garoto que eu nem conhecia...

dormindo e sonhando...
É muito bonito.

Quando meu namorado morreu

pensei que poderia entender
o amor através dele.

Não posso dizer
que sou capaz de amar.

Os Subprodutos do Amor | 1995

O conceito moralista ou ético...

consigo entender e viver,
por consequência,

sem machucar os outros ou
estando presente para eles.

Mas está mais para um atidude ética.

Que sentimento é esse?
Isso é altruísmo, não é?

Tem a ver com altruísmo.

Altruísmo é fazer as coisas
pelos outros, mas não é verdade.

Você também faz coisas
por você, para se sentir feliz.

E você só pode ficar feliz
quando os outros estão felizes.

Eis uma bela definição: estar feliz
somente quando os outros também estão.

- É isso que o amor exige.
- Com certeza.

- Mas se você está envolvido, não o faz...
- Claro que não.

O que é o amor?

A questão sempre lhe interessou.

Ele afirmava

não ser capaz de amar.

Discutimos muito isso.
Ser ou não capaz de amar.

Mas não chegamos a nenhuma conclusão.
Acredito que não exista uma.

É bobagem.

Fica sempre um ponto de interrogação.

Mas foi um assunto
que discutimos muito nesses anos.

Uma questão persistente.

Como no nosso lindo filme
"Os Subprodutos do Amor",

que simplesmente diz:
durante a busca por amor e afeto

e por uma significativa comunicação
com os outros,

incidentalmente,
cria-se arte como um "subproduto".

E o que permanece?

Só isso.

- O que quer dizer?
- O que permanece?

Expressões humanas sob várias formas,
como com você...

ou Maria Callas ou...

River Phoenix ou, ou, ou...

A expressão permanece. É como
um terremoto, uma sensação de tremor.

É tão lindo como ela começa.

Os Subprodutos do Amor | 1995

Comece, Anita.

Casta

diva

Casta diva,

que

prateia....

É tão bonito, a voz, as emoções.

Eu procurei Anita por trinta anos,
desde 1964.

...esses sagrados e antigos ramos.

Depois que a ouvi quando era criança.

A nós volte

seu lindo semblante.

A nós volte

seu lindo semblante.

Essa foi tirada quando Marcelo
descobriu ser portador de HIV.

E aqui ainda não sabia que estava condenado.

Mas diálogos com os mortos são difíceis.
Dão certo apenas nos sonhos.

Ele continua vivo no seu coração.

Sim, nos sonhos.

Mas...

Mas tem algo muito depressivo nisso.
Quando você vive intensamente com alguém

e vê essa foto...

É como Lilly disse, se
as imagens brilham por dentro...

devido à contemplação...

mesmo que meu ponto de vista sobre a pessoa
que estou tentando retratar...

seja o de uma pessoa que ama,
ainda assim estou entre os mortos aqui.

Magdalena morreu em 1984.

Marcelo em 1993.

Antonio em 1989.

Talvez vivam nas fotografias, através
dos olhares que projetam.

Diria que quando tinha 12 ou 13 anos,

quando tive aquela revelação,
com a música e com Maria Callas,

era mais um medo do vazio.

Um Horror vacui...

Sentia-me incompleto,
como se fosse uma nada.

Esvaziado. E tinha todos os motivos,
porque a minha comunicação,

o contato com as pessoas
da minha idade em Bielefeld...

não existia. Eu não era aceito
e não conseguia me fazer aceitável

porque pensava e sentia
de uma forma muito diferente.

Duas | 2002

Tudo o que eu procurava era alguém

que pudesse amar.
Queria saber como era

aprender a amar e ser amado.

Para onde está indo?

Para casa.

Melhor de bicicleta que a pé.

E se eu a levasse?

Uma mudança agradável em relação
ao caminho de todo dia.

Não vamos dar a volta ao mundo.

Eu a levo direto para casa.

- Subo?
- Sim...

Não tenha medo. Estou segurando-a.
Vamos!

Tudo bem?

Relaxe ou vamos cair.

Isso é muito bem contado no modo
como Isabelle Huppert

interpreta a mim com a idade
de 14 ou 15 anos,

apaixonado por aquele
mal vestido e maravilhoso Siegfried

que também tinha uma ótima imaginação.
Siegfried sabia contar histórias.

Mandava que eu sentasse no banco de sua
bicicleta e me empurrava por Bielefeld

como no meu mundo de fantasias,
e eu o adorava.

Alguns homens a amam.

Siegfried foi o primeiro homem que
realmente amei, mas ele se enforcou.

Ele tinha 16 anos e eu 13 ou 14.

Um garoto

com seus 20 anos

foi encontrado

enforcado

em seu apartamento.

Quando em 1974 fui convidado
a apresentar meus filmes

na França...

Ainda sou muito grato a Henri Langlois,
diretor da Cinémathèque Française

e a muitas outras pessoas;
fui tão bem recebido na França.

Aqui ainda era visto como
um enfant terrible,

um idiota metido a artista que pulava,
dançava, ou algo do gênero.

Não tinham muita consideração
pela minha inteligência.

Ao passo que na França
era considerado um parceiro à altura.

A cabeça de Ismênia.

Sabia que

o Pai da Terra
não aprendeu nada conosco?

Alberte tem a minha idade.

Trabalhamos juntos desde 1977

com cenários e figurinos.

Você a usou, Werner?

Porque estou do lado
da escrivaninha dele...

Talvez seja melhor.

Werner, que ideia era essa?

Vai subir até aqui.

Acima da cabeça.

Ela vai ter muito volume,
como uma santa.

Tem um contorno vermelho.
Graficamente, é muito eficaz.

Tem que ter muito mais iluminação
sobre os rostos delas.

Tenho certeza que vai reforçar
a expressão do rosto.

Estava trabalhando com Udo Kier
em um filme e Udo nos apresentou.

Werner tinha terminado a montagem
de "Os Flocos de Ouro" em Paris.

E conheço Werner desde então.

A ideia de inspirar-se no Barroco foi
de Werner. Não foi ideia minha.

Eu estava com dificuldade para
terminar os croquis porque pensei:

Quando Werner me pediu pra fazer os
figurinos barrocos para "Electra",

me perguntei por que.

Depois de uma semana de ensaios percebi

que as atrizes estavam colocando em cena
um trabalho fortemente emotivo.

E entendi: certo,

teria sido melhor um contraste,

deixar os rostos como estão hoje.

E eu iria somente acentuar
seus movimentos com os meus figurinos.

Werner definiu o viés barroco,

mas fora isso me deu liberdade total.

Não tenho cores preferidas.
Para mim todas as cores são bonitas.

Werner adora o vermelho.

E entendi que ele adorava o vermelho
porque faz alusão

ao sangue e à morte.

Eu gosto do vermelho porque é vida. Talvez
por esse motivo trabalhamos juntos,

talvez porque juntos fechamos o círculo.

Os meus filmes

e as fotografias revelam algo
muito extremo:

a incrível dependência
que tenho das outras pessoas.

As pessoas se rendiam a mim
da mesma forma que eu

amplamente me rendia aos outros.

E é assim que se desenvolvem essas
dependências com as quais eu vivo.

E geralmente me deixam desesperado
porque todos querem ser livres,

mas eu não posso ser.
Sem os outros fica um vazio por dentro.

É assim que eu vejo a vida.
Talvez tenha a ver com a contemplação.

Agora vamos fazer o que eu chamo
de "espelho de harmonização".

A pessoa que fala faz um
gesto correspondente.

Quando você falar, faça um gesto.

E imite o gesto do outro de modo a
criar um espaço entre vocês

sem se tocarem. Mas para mim deve parecer
que vocês estão quase se tocando.

Levantem os braços.

Exato, é o quanto podem chegar perto.

Podem usar esse gesto. Não há
necessidade de aprender um gesto

ao modo de Schiller,
Racine ou Hölderlin.

Usem o espelho para entrar
em vocês mesmas e na outra pessoa.

Agora!

Você se dá conta
do que o comandante nos disse?

Na cidade aberta agora há pouco?
Ouviu?

Ou não sabe

como a ira de um inimigo
vence os amantes?

Antígona nunca me disse
uma palavra de amor.

Nem uma palavra doce,
nem uma palavra triste

desde que perdemos
nossos dois irmãos.

Você parece colorir uma palavra vermelha.

- Palavra.
- Palavra.

Você parece colorir uma palavra vermelha.

Colorir.

- Colorir.
- Não, colorir.

- Colorir.
- Sim.

Colorir uma palavra vermelha.

Você parece colorir uma palavra vermelha.

Você pensa: é um texto poético,
mas de alguma forma eu engasgo...

Não dá certo assim. Temos que tentar
comunicar a sua verdade

usando essa língua estranha.

Essas são as histórias de família
mais extremas da literatura mundial.

A monstruosidade deve distinguir-se.
E funciona somente se vocês agirem

como se fosse uma história monstruosa
até para vocês.

Provavelmente vou morrer agora.
Por favor, continue filmando.

Está filmando?

Assim não dá.

Como Schroeter colocaria isso
em cena?

Schroeter a faria assim:
pegaria uma taça

fingindo que teria champagne.

Depois teria um zumbido.

Que alegria que ao meu lado

você permanece.

Venha para mim, meu

triste amor.

Esse era o ponto no qual eu...
Desculpe, era outro filme.

Outro diretor.

Ah, eu atuei nesse também.

Há também um filme sobre Marcelo.

O grande amor de Werner Schroeter,
que trouxe consigo da Argentina.

Infelizmente morreu de AIDS.

Às vezes tinham medo de mim,

porque Schroeter naturalmente enxergava
através de minha histeria.

E ele dizia: "Vá gritar um pouco.

Faça um escândalo".
Era familiarizado com essas coisas.

Para alcançar aquela qualidade,

tive que libertar-me de tudo que
um artista pode fazer,

dos meios que um ator sempre utiliza.

Tinha que gritar e colocar para fora.
Tinha uma urgência agressiva.

Até que cheguei na nuvem
de Schroeter.

E graças àquele ódio

uma nova força emergiu de dentro de mim.

E depois fiz o que ele queria.

E estava eufórico porque tinha
atingido um resultado.

Tinha sobrevivido a mim mesmo.

Tinha me superado.

Você quer fazer isso?

Sozinha, pobre criança?

Sozinha.

O quê?

Aqueles que me levaram a esse ato!

Os deuses!

Estarão aqui para me ajudar.

Eu me levanto subitamente:
"Aqueles que me levaram a esse ato!

Estarão aqui para me ajudar."

É como na gravação da
Grande Missa Em Dó Menor de Mozart

que coloquei para vocês,
onde ela canta "Kyrie".

Onde diz: "Você tem que me ajudar".
É assim.

- Como...
- Se me fizeram isso, têm que me ajudar.

- Certo?
- É isso que procuro com os deuses.

- Quais deuses?
- Lá, quando sinto que vou desmaiar.

Ela não o faz para que tenham compaixão?

Lamentando-se.
Não deve ser a mesma coisa.

Poderia ser algo tipo:
"O que vocês fizeram comigo?"

Não, assim você se distanciaria
do personagem.

Estava bom.

Não me sinto segura com esse estilo.
Pareço doente.

Tipo: "Por que fizeram isso comigo?"

Se é naturalista, então parece
um psico-retrato de quadrinhos.

- Acho que está bom como você faz.
- Certo.

Acho uma pena se você continuar
a enfatizar o que é dito.

Os personagens devem poder
desenvolver sua própria autonomia.

E eu gosto disso.
Por isso estou ouvindo vocês.

Ouvi uma coisa interessante:
quando você dirige uma peça

não reage às agressões
dos atores.

Ou aos seus caprichos, exigências,
ou qualquer outra coisa.

Deixe simplesmente que aconteça

e não...

- Isso não me interessa.
- Sim.

Embora seja bem diferente
como quando no...

filme dirigido nas Filipinas,
produzido pelo Peter Kern

em 1983. Em um território desconhecido,

consigo aprender com o capricho
das pessoas.

Mas quando se trabalha no palco,

onde se trata de colaborar
e de ser criativo,

as idiossincrasias pessoais
que você pode utilizar em seus filmes

são inúteis porque
diluem o conceito

e não atingem nenhum propósito.

Eis porque, e posso dizer com propriedade,
geralmente eu odiava Werner.

Porque ele não mudava nada.
Deixava tudo como era.

Respeitava tanto o autor

que a peça durava quatro horas
se tivesse que durar quatro horas.

Ou quando colocamos em cena
um trabalho como "Árvore Tropical."

Então eu tinha que ficar sentado ali
por uma hora

e atuar como

se estivesse petrificado. Fazer isso em um
palco onde todos lhe olham fixamente,

e na sua frente representam cenas
dramáticas e eróticas

e isso e aquilo...

Sempre tomava um calmante porque
não conseguia suportar.

Sempre tinha medo de entrar em cena

e ficar ali sentado, concentrado
por uma hora como uma imagem.

Não como um ser humano,
mas como uma representação dele.

É difícil dizer porque alguns
têm credibilidade

ou porque se abrem e colaboram
com você

e se entregam de corpo e alma.
- Ouço por aí que você é muito popular.

Que todos gostam de trabalhar com você
e que o clima é ótimo.

Eles se sentem lisonjeados
e é uma grande experiência para eles.

Comigo é um pouco diferente.
Eu crio conflitos.

É a mesma coisa.

Você os faz trabalhar
usando seu bastão

e eu os deixo brilhar e cintilar.

Nenhum dos dois métodos é passivo.

Obviamente tenho meus truques.
Sou engenhoso.

É importante criar
uma atmosfera que funcione.

Quando não acontece nada durante
um ensaio,

pode se tornar um peso quando
você tenta recriar alguma coisa

e quando não acontece nada
que lhe faça dizer:

"Ah, essa foi ótima."

É um dia perdido.
Você se sente um nada insensível.

Então tem que tentar,
mesmo quando os atores estão cansados.

Um sente dor. Outra está menstruada.
Algum perdeu o tio.

Deve suprimir isso de modo que
o tempo gasto seja o seu objetivo.

Viajar sempre foi meu objetivo.

A Morte de Maria Malibran | 1971

Tinha Candy Darling da panelinha
de Warhol de Nova York.

Aquela delicada...

boneca de gelo...

chamada Candy Darling.

Loira,

com flores nos cabelos e gigantesca.

Eu fazia uma cena com ela.
Tinha que me aproximar dela.

Muito lentamente em direção
ao seu rosto.

E não sabia... Werner me disse
que eu devia estender minha mão

e tentar

abraçá-la ou estrangulá-la.

Werner, Daniel Schmidt,

Magdalena Montezuma e eu...

e até Ila von Hasberg, vivemos
em uma casa fora de Munique.

Por quase um ano. Foi em 1967.

Foi uma época maravilhosa.

A primeira...

a primeira viagem
que fizemos juntos

fomos para...

para Dachau.

No antigo campo de concentração.

"Não quero mais ouvir".
Vamos começar.

"Não quero mais ouvir"
Comece ali.

Não quero mais ouvir.
Isso é verdade e aquilo é mentira!

O que é a verdade...

nenhum ser humano pode dizer.

Quando ela fala comigo,
me deixa muito feliz.

Ouvirei o que ela tem a dizer.

Se alguém disser algo de bom...

será

minha filha. Mas quem é ela?
Gostaria de despir minha alma

de todos os seus véus.
O sopro de uma brisa leve

de onde quer que venha.

Para aqueles que então

eram artistas
e queriam ser criativos

foi um peso terrível,

era impossível esquecer aquilo
tão rapidamente.

Foram milhões de mortos.

Eram tratados como lixo.

Não quero pensar nisso,

porque isso leva ao abismo,

do qual tentávamos
recuperar a dança,

o canto e fazer música.

Werner sempre dizia: "Tenho que
fazer filmes de modo diferente.

"Tenho que fazer
os filmes que gosto.

E não trabalhar mais na Alemanha,
com a velha sintaxe".

Piloto de Bombardeio | 1970

Essa foto de Magdalena Montezuma
mostra um modo de sentir.

Realmente não existe um lugar
para nós no mundo. Estamos no mundo,

separados de tudo e de todos, e podemos
suportá-lo somente em movimento.

E nesse sentido, considero
o edifício ao fundo

incompleto e danificado,
com as janelas quebradas.

Poderia ser tanto na Sicília
como em Wolfsburg.

Na verdade, a harmonia não existe.

Ao menos que se trabalhe duro
para criá-la.

E aqui os arquitetos falharam totalmente
tentando criar uma harmonia.

Enquanto a mulher está ali com o
seu olhar maravilhosamente triste,

um espetáculo tocante nesse mundo,

é uma mulher em movimento.

Os Flocos de Ouro | 1975

Não quer me beijar hoje?

Adoraria, meu anjo.
Mas você sabe que fui amaldiçoada.

Que cabelos lindos você tem.

Que pele macia!

Tudo é lindo aqui.

Para mim, é a prisão

pela qual sou responsável.

Estou triste.

Estou entediada.

Há duas semanas
estamos totalmente sozinhas.

Então você não foi
ao cemitério?

Não.

Prometi ao meu pai
em seu leito de morte

que cuidaria desta casa.

Duas pessoas que se encontram,

e estão destinadas
a ficarem juntas,

e seguiram pelo mesmo caminho.

Ela é indispensável.

Ele sempre ficava contente
quando eu falava sobre Magdalena.

Também para não esquecer
o que tinham.

Continua-se a trabalhar para...

Não foi fácil para ele, nós sabemos.
Mas o período

até a morte de Magdalena

foi sua melhor época.

Enquanto escrevia isso
para Werner Schroeter

Festival Internacional de Viena | 2009

continuava pensando
em Magdalena Montezuma.

Quando alguém responde ao nome
de Magdalena Montezuma

não há discussão.
Não é um nome próprio.

Esse nome é uma expressão.

Senti a dor de cabeça chegando
ao deixar o escritório.

Ao menos tinha chegado ao meu carro.

Tudo o que eu pensava era que eu tinha
de chegar em casa antes que ocorresse.

Mas ela crescia muito rápido.

O Rei das Rosas | 1985

Mais rápido do que nunca.

A casa estava vazia.

Estirei-me no sofá e pressionei
minhas mãos contra os meus olhos.

A dor era horrível, horrível.

E de repente tive a sensação
de que não estava sozinha,

que havia alguém aqui,
comigo.

Alguém que eu não podia ver.

Alguém que esmagava
o meu cérebro

apertando minhas têmporas
com algum tipo de luz terrível, invisível.

Alguém que está
tentando me matar.

Levou bastante tempo
para o filme ser terminado.

Após a morte de Magdalena,
nós terminamos as filmagens.

Werner demorou cerca de um ano

para encontrar uma forma
de terminar o filme.

Ele queria fazer este filme

pois ela havia escrito o roteiro.

E ele queria terminá-lo
rapidamente.

Mas na época eu estava
totalmente falido e disse:

Werner, estou completamente falido!

Mas sabe como era Werner.

Werner chegou em Portugal
com Magdalena e me disse:

"Temos que filmar!"

"Mas eu disse que estou falido!"

"Não me importo, Magdalena está
muito doente. Temos que fazer isso."

Não sei como e quando vou morrer,

mas Magdalena, mesmo durante
o último estágio de sua doença,

câncer de epitélio escamoso,
o mesmo que eu tenho,

atuou em plena lucidez,
como você a filmou em O Rei das Rosas.

Ela era de uma clareza brilhante.
Uma pessoa bela, calma e maravilhosa.

Pessoas que não conseguem conviver
com a doença devem suicidar-se logo.

Em seu aniversário de 60 anos,

você mencionou isso com um olhar
aventureiro, e isso me chocou.

Surpreendeu-me o modo
que você disse.

Magdalena comportava-se
de forma parecida.

Mas Magdalena era muito mais severa
consigo mesma.

De qualquer forma,
ela teve o mesmo tipo de câncer.

Mas o dela começou no útero.
e o meu, na laringe.

São órgãos vitais em ambos os casos.
Como posso trabalhar sem falar?

E o ventre de Magdalena era
um instrumento de expressão dramática...

Sempre atingia os pontos vitais...

os pontos mais sensíveis.

Magdalena lidou com isso
de tal forma

que se recusava a tomar morfina.
Ela preferia experienciar a dor.

Eu não faria isso,
mas ela lidou de forma esplêndida.

Acredito que o orgulho e a dignidade
demonstradas por Magdalena

é o que você possui, também.
Você não quer pena.

- Você não quer que as pessoas...
- Não.

É dignidade, não orgulho.

Troquei provérbios com Marianne Hoppe
antes de sua morte.

Nós gostávamos deste:

"Estupidez e orgulhos estão do mesmo lado".
Prefiro chamar de dignidade.

Orgulho não faz sentido neste contexto.
É dignidade.

O que eu não sabia,
mas Elfi e Lilly me disseram,

é que você foi vítima de bullying
antes de me encontrar.

Não só quando já éramos amigos,
mas antes disso, também?

Minha avó, a baronesa polonesa
Elsa von Rotjov,

usava uma expressão absolutamente clara,
que era "compostura".

Mas na minha imaginação de criança
isso queria dizer: "não se defenda".

"Mantenha sua compostura..."
Então eu fui espancado por anos,

tinha xixi derramado em mim,
etc.

Minha avó polonesa,
nesta maravilhosa fotografia,

havia criado um mundo imaginário
onde eu podia sobreviver.

Minha avó conseguia transformar uma tábua
de passar e uma frigideira numa coroa.

Mas, de qualquer forma, minha avó
não soube o quanto eu a amava.

Porque ela transformou o mundo
e me deu minha imaginação.

Eu tinha 13 anos
quando minha avó se suicidou.

Por que você olha ao redor
com medo?

Fale comigo. Fale!

Você está tremendo
da cabeça aos pés.

Esse tremor...

conhece o caminho

que devo seguir.

Você quer fazer isso?

- Tão sozinha, pobre criança.
- Exatamente, fantástico!

Assim está bom.

Você me obrigou
a fazer isso.

Os Deuses!

Estarão aqui para me ajudar.

Farei.

Farei-o imediatamente.

Farei.

Exato. Boa caminhada.

Não consegui entregar-lhe
o machado.

Ele partiu, mas não consegui
entregar-lhe o machado.

Não existem deuses no paraíso.

Agora, existem acordes gritando,
e então...

Ataque novamente!

Não, tem que ser
um brado realmente demoníaco.

Electra começa lentamente
a se mover e dançar...

Eu plantei a escuridão.

Semeei.

Não, não, um momento.

Não, tem que ser
o brado demoníaco.

Tente sem música.
É mais excitante.

Certo, alguns acordes agressivos
e depois "ataque novamente"!

- Vá.
- Ataque novamente!

Eu plantei a escuridão.

E colho luxúria

sobre luxúria.

Eu era um cadáver negro
entre os vivos.

E nessa hora...
Eu sou... O quê?

- Fogo!
- Fogo!

E minhas chamas queimam
a escuridão do mundo.

Electra.

Electra!

- Electra!
- Cale-se.

E dance.

Todos devem vir.

Venham

e juntem-se a mim.

Carrego o peso
e a luxúria da felicidade.

E danço por vocês.

Para aqueles que são tão felizes
como nós, só convém uma coisa.

O silêncio.

E a dança.

- Orestes.
- Orestes.

Orestes.

- Aqui na frente?
- Um momento!

Sei o que não funciona.
Acabamos de ver isso.

- Vou libertá-la disso.
- Sim, por favor!

Então ela começa a dançar

e quer estar fantástica.
- Sim.

E então ela se ajoelha

e dança, cobrindo-se com areia.

E todas aquelas declarações estranhas
perdem-se na areia.

Como se cavasse sua própria cova
enquanto dança.

Ótimo.

FORMAS DA SOLIDÃO

Quimioterapia destrói o corpo.

É uma reviravolta tão grande
que eu não conseguia nem ler.

Preciso estar com outras pessoas
para me comunicar comigo mesmo.

Enquanto a leitura sempre foi
o mais importante para mim.

Agora tenho a música. Comprei aquele
player sem dinheiro nenhum.

E ouvi Callas
até às três da manhã.

Continuo aprendendo
com aquela mulher.

Através de Callas, finalmente compreendi
a palavra "gênio", do grego "geme".

Uma mensageira entre Deus e o homem.

A realidade de seu canto
derrota a música.

A parte mais essencial
de qualquer forma de arte

é a maneira que Callas se expressava.
Pode ser difícil suportar,

porque sua verdade
é realmente impressionante.

Sim.

Digo, ainda que você não queira,
farei meu dever à você e ao seu irmão.

Não vou ser considerada injusta.
Não vou ser considerada injusta.

Você está fora de si!

Creonte não proibiu isso?

- Segure-se nela.
- Segure-se em mim.

Você quer levar para o túmulo
aquele que foi renegado pela cidade.

Meu e seu...

mesmo que você não queira!

- Um momento!
- ...Irmão!

O medo de Ismene
possui sua própria energia.

Grite com ela, e ela consegue esquecer.
Torna-se o mesmo papel.

- Torna-se confuso, antes não era assim.
- Eu fui embora antes.

O perigo é que os papeis
tornam-se idênticos.

- Sim, certo.
- E disse: "Sim, sim!".

É ótimo quando se aceita
que a energia do lamento e do medo

e que a grande delicadeza emitem
uma grande quantidade de energia.

Às vezes é uma energia ainda maior
que a energia humana.

Os Subprodutos do Amor | 1995

Tenho medo de falar com ele
durante a noite.

Ouço com atenção
tudo que ele diz.

Ele me diz:
"Eu a amo",

e sem querer

sinto meu coração
que bate, que bate,

não sei por que.

Ele me diz:
"Eu a amo",

e sem querer

sinto meu coração
que bate, que bate,

não sei por que.

Nas fotos do início
dos anos 1970...

Havia um período em que eu

estava sempre imerso na música.
Ouvia música constantemente.

E eu devo ter usado isso,
aleatoriamente ou voluntariamente,

em tudo que criei.

Enquanto nas fotos dos anos 1980,
dos anos 1990 e as de atualmente,

dias em que mal ouço música,

ainda sou influenciado por ela,
como um dançarino que pode dançar sem ela.

É a memória da música.

Estão chegando.

Irmã, quando você treme,
é a pior coisa!

Vá para o abrigo,
mas somente por hora.

Fique longe dela!

Desejo falar com minha mãe
como nunca desejei antes.

Certo, só um momento,
um momento, um momento...

Tem que ser muito forte aqui.

Diretamente da gaita de vidro

os personagens são alterados
no coro.

Acima de você
e para onde?

Certamente a trouxeram aqui
pois desobedeceu as leis do reinado.

É ótimo. Sem dúvidas.

- Estamos trabalhando nisso.
- Então o coral não é sabe-tudo.

Sim, é terrível, quando é assim.

Não gosto disso. É muito triste.

Precisamos do tema de Electra novamente.

Precisamos do tema de Electra
em tom maior.

- Electra em tom maior.
- Sim, seria bom. Traria a atmosfera.

Odeio alegremente
os tons maiores.

Amo tons maiores tristes
e menores felizes.

Mas não deve ser triste.

Ficaria muito claro que ele está morto.
Quero que seja uma surpresa.

- Triste.
- Não! Não deve ser triste!

Em seguida, o coro de virgens chega
e o irmão Jochen prega uma oração.

Fim da música... certo.

Existem coisas estranhas e maravilhosas,
mas nenhuma

é mais estranhamente maravilhosa
que este homem.

Ele infringe a lei

e jura respeito à natureza...

Só um momento. Tentem novamente.
Almut começa.

Existem coisas estranhas
e maravilhosas, mas nenhuma

é mais estranhamente maravilhosa
que este homem.

Estamos perdendo tempo.
Isso não é bom.

Vamos conseguir reforços.

Esta Noite | 2008

César é um ótimo domador.

Ninguém é mais capaz que ele
para domar uma puta teimosa.

- Vamos, fique de quatro!
- Faça uma puta teimosa obedecer.

- De quatro!
- Isso é nojento!

Só loucos falam assim.
Temos que enfatizar isso.

Doris ainda está aqui?
Esta é a melhor parte.

Seu primo lhe contou?
Certo.

Doris ainda está aqui?
Esta é a melhor parte.

Doris ainda está aqui? Esta é
a melhor parte. Seu primo lhe contou?

- Não, não está certo.
- Ficou bom.

- Não, só isso?

- É?
- Não, não basta. Deve ser mais decisivo.

Tenho que sentir o tigre
por trás dele.

Esta perfídia que se vende
como digna de amor.

Certo, isso é tudo
que você queria dizer?

Caso você me proteja,
estarei com prazer ao seu serviço.

Não recrutamos viados.

Abaixe suas calças.
Mostre-me seu rabo.

Que me diz, Villar?

Todos eles dão o cu!

Vá embora, foda-se!

Não! Não!

O que penso é que o artista
deve criar sua própria realidade.

Deve distanciar-se do mundo real

para poder criar sua própria visão

da realidade no trabalho
que ele cria.

Pode-se considerar isso artificial,
mas digo que é necessário

criar continuamente
uma nova realidade.

Para mim, este é o único método
para compreender uma obra de arte

quando eu a escuto ou vejo.

Para mim, toda obra de arte me liberta
das limitações de uma cópia.

Isso é muito importante para mim.

LAR

Por toda minha vida eu viajei.

Nunca me senti em casa,
num lugar em particular.

Mesmo enquanto minhas viagens
possam parecer fugas,

elas ainda são necessárias
para mim.

Na verdade, o que realmente
me prende a Itália,

é que sou muito atraído
pelo Eros italiano,

o Eros das paisagens, etc.

Então me questiono, como vou poder
corresponder a ele sendo alemão?

Então surgiu a ideia
de escrever sobre um jovem.

Um encontro acidental
entre o sul da Itália

e o que eu não gostava na Alemanha,
como Wolfsburgo.

E a Volkswagen.

Palermo ou Wolfsburg | 1980

Senhora Costantini,

você será questionada
como uma testemunha.

Por favor, diga sua idade.

36.

Lembra-se do réu?

Claro que sim.

Conheço-o há muito mais tempo
e muito melhor do que todos aqui.

Cuidei dele como um irmão
desde o dia em que ele chegou.

Ele trouxe o estilo de vida
da minha terra natal com ele.

E não gostaria que ele fosse
destruído aqui,

onde não há luz

não há sol, não há canções,
não há conversa,

onde tudo deve ser útil
para alguma coisa,

onde não há nada
além de trabalho.

Este é o Urso,
o Urso de Ouro.

PALERMO OU WOLFSBURG

Eu fotografava para a "Der Spiegel"
e ao mesmo tempo,

quando Werner fazia qualquer coisa,

eu estava lá.

Pode-se dizer que Werner é meu hobby,
mas ele é mais do que meu hobby.

Claro, o jeito dele

era um pouco problemático
para uma revista como a "Der Spiegel".

Fiz esse livro, e é...

um livro...

uma homenagem aos mortos.

Há muitas pessoas mortas
neste livro.

E as pessoas que ainda vivem
em torno delas.

Fassbinder está aqui, e felizmente
Kluge ainda está vivo.

Michael Fengler também está.

Sim, e aqui está Werner.

Trabalhar com Werner...
Diria que havia muita liberdade.

A viagem criativa era algo

que nunca tive
com nenhum outro diretor.

Era tão intenso e produtivo,
e infelizmente também incompreendido,

esse tipo de trabalho
aqui na Alemanha.

Por outro lado,
era sempre diferente no exterior.

Não é possível dizer que Werner

era o diretor alemão mais conhecido.
Sempre foi difícil para ele.

Mas na América, na França e na Itália,
seus filmes tinham

um apreço muito forte,

e ele é considerado um dos
diretores europeus mais importantes.

A morte é um assunto importante
nos filmes de Werner.

"Eika Katappa"... Não há outro filme
onde tantas pessoas morrem.

Ele destruía pontos de conexão
das histórias,

matando pessoas que continuavam a viver,
morriam três vezes ou morriam definitivamente.

É óbvio que o mais importante
para Werner era o gesto.

Nunca era a história em si.

A vida é muito preciosa...
Mesmo agora...

Enlouqueci Rosa, Holger Mischwitzky,

com minha visão trágica do mundo.

Disse a Holger: "Você deve aceitar isso.
Minha visão do mundo é trágica".

E é claro que ri disso.

Sim, bem, é...

aquela compreensão adolescente
da futilidade de cada momento.

Ela pertence a todo artista
e todos que tentam se expressar.

Não se pode refutar o fato
de que não sabemos de nada.

E nós estamos sempre procurando
na composição requintada de Schönberg.

Expectativas. Sempre procuramos,
mas nunca as encontramos.

A busca é essencial para a arte,
não o produto final.

Não há produto final. Há uma fotografia,
uma imagem, uma composição.

Mas nunca é um aspecto
que resolve tudo. Não.

Isso seria ainda mais belo.
Tornaria a morte obsoleta.

Mas como tudo vai acabar
desta forma,

só encontramos nossa redenção
na morte, mas não na arte.

A arte é um material emocionante,
como amizade. Arte é amizade.

Nós nos conhecemos há 23 anos,
Christian e eu.

Christian fez estágio no teatro
durante o trabalho...

Exatamente na Volksbühne West...

Foi onde conhecemos. E nos vimos de novo
na mesma rua há um ano e meio. Coitado.

De qualquer forma,

aqui está Christian Holzfuss,
que tornou possíveis estas ampliações.

Ele está lá,
e aqui está ele novamente.

Sou grato a ele. Sem ele,
isso não teria acontecido.

Em 1980, vi Isabelle Huppert

caminhando no saguão
de um hotel em Veneza.

Quando estávmos preparando "Malina",

adaptação da novela de Ingeborg Bachmann
e roteiro de Elfriede Jelinek,

lembrei-me do jeito

que esta pessoa em particular atravessou
o saguão com uma expressão notável.

E pedi ao produtor para que
me ajudasse a encontrá-la.

Desenvolveu-se em uma amizade.

Werner e eu éramos quase
como irmão e irmã.

Mas ainda não tínhamos
muito em comum.

Eu levava uma vida
bem mais convencional.

Eu tinha filhos para criar, e ele levava
uma vida bem mais extravagante e poética.

Claro que, na minha vida como atriz,
também tenho um mundo

repleto de coisas que posso
expressar na tela grande.

Werner era diretamente ligado
a esse mundo imaginário

que também habita em mim, claro.
Caso contrário, não seria uma atriz.

Não sei, mas tenho a impressão

que eu podia fazer e dizer
qualquer coisa com Werner

e ele me adoraria.

Acredito que nunca senti isso
com mais ninguém.

Sempre me vem à mente que tenho
uma associação particular à ela.

Como se Isabelle estivesse
em "Os Flocos de Ouro",

ou em "Federsturm",
ou em "Schnee".

Era uma história de associação.

E isso é criado facilmente.

São penas que caem

que parecem ouro
à luz variada

e voam por milhas
através de Frankfurt.

Era uma visão, uma imagem
que eu tinha dela.

As fotos que tirei

e que mais gosto foram criadas
desta forma:

no momento em que

as coisas que eu fotografo
irradiam mais luz.

Aqui, seu batom.

Certo, agora não guardo
mais nenhum segredo para você.

Usarei meu vestido preto
com o cinto novo.

E colocará um xale escuro...

Por que você nunca usou
o vestido listrado?

Vou usá-lo, um dia.

Não se preocupe.
Afinal, você não o rasgou.

Tenho que agradecê-la.

Sim, Malina,
você também me deixou.

- Ou, devo dizer, me abandonou.
- Besteira!

Digo, você me deixou viva.

- E isso é tudo.
- Qual é a sua ideia de vida?

É a que você não pode viver.

Parece que esqueceu há muito tempo
que eu existo perto de você.

Eu? Esquecer você?

Certo, está pronta?
Vamos!

Não, vá primeiro.
Eu vou em seguida.

Alô?

Não.

Não, estou sozinha. Logo.

Sim, ligarei de volta para você.

É uma busca infinita pela beleza.
Ele era um esteta.

Mas sempre havia aquela ironia,
aquele humor.

Sofrimento estava sempre,
de alguma forma, acompanhado por

alguma coisa engraçada.

Mesmo nas cenas de Malina
onde eu corri sobre o fogo.

Ou quando a raposa
por pouco não mordeu meu rosto.

Havia uma distância,

então eu nunca tive como pensar
no perigo, de qualquer forma.

Eu confiava totalmente nele.
Não conseguia imaginar

que ele deixaria uma raposa
me morder ou o fogo me queimar.

Lembro-me bem da cena
do fogo em "Malina".

Acho que você lembra também, Elfi.

Ele mesmo a fez, também. Disse:

"Veja" e, em seguida,
correu pelas chamas.

"Voilà! Se eu consigo, você também
consegue. Não machuca".

Acho que ela é magnífica.

É um prazer que eu não sentia
desde Magdalena.

É incrível.

É o caminho que leva à clareza,
à verdade, à autenticidade.

É uma festa aqui.
E é sempre o que se espera

em termos de qualidade, e não
"vou à esquerda ou à direita?".

Porque ela entende a energia,
e esse é o ponto.

Não algum embuste psicológico,
mas energia.

Aqui está a energia. Você a sente e...
Se não consegue senti-la,

faça funcionar!

Entendido e feito.

É uma das poucas atrizes magníficas
e tocantes da Europa.

Duas | 2002

Ele...

confrontou a morte corajosamente
e com muita dignidade

quando ela se aproximava.

É algo que deve ser conquistado.

Como você lida com isso?

O fato de que está morrendo?

E Werner conquistou isso com...

Ou não? É o teste de tudo.

Está pronto?
Que pensamentos o acompanham?

E o quão longe testemunhei isso,
de uma certa distância,

foi um último grande ato,
comportar-se como ele o fez.

DIÁLOGO COM OS MORTOS

Seu último projeto,
"Josephine e Eu",

algumas semanas antes de sua morte,

eu tinha que interpretar
uma ex-cantora nazista.

Eu disse que eu...

Mesmo que não terminássemos,
"Werner, eu...

Eu o agradeço por este projeto."

E ele foi bem conciso
e respondeu:

"Não, nós vamos fazer.
Vamos terminar".

Ele pensou um pouco e disse:

"No subsolo
há uma governanta judia,

que a cantora levou com ela,

porque gostou dela
e precisava dela.

E numa grande mansão velha,

é você, Ingrid, no "bel étage".

O piano está coberto
e não é mais usado.

A mobília já desapareceu

parcialmente.

E está um tanto vazia.

E então, você abre as janelas,
e vê o jardim repleto de mato.

Você olha...

para o céu, o terceiro nível."

"Sim, Werner. O que está no céu?

"Você abre a janela e olha para cima,
e a câmera acompanha seu olhar.

"E o que eu vejo?"

Ensaio Geral | 1980

Oh, meu paizinho querido

Eu o amo, ele é tão belo!

Quero ir até Porta Rossa

Para comprar o anel!

Sim, sim, quero ir!

E se o meu amor fosse em vão,

eu iria até Ponte Vecchio,

e me atiraria ao rio Arno!

Eu choro e sofro tormentas!

Oh, Deus,

preferia morrer!

Ele dizia não ter medo de morrer,
mas eu não acreditava.

Mas ele confundiu as coisas.
Ter medo de morrer

é diferente de ter medo da morte.

Os últimos meses...

aqui no apartamento
tornaram-se muito íntimos.

Às vezes eu me preocupava.

Batia na porta. "Posso?"
E ele dizia: "Sim".

Então rezávamos, conversávamos
e chorávamos juntos.

Que justiça divina eu violei?

Na minha miséria, por que eu ainda
deveria olhar para os deuses?

Qual deles posso invocar
para me trazer ajuda,

quando pela minha reverência
me cobram sem piedade?

Ei, você.

Não.

Não.

Deve haver alguma coisa lá,
quando ainda ouve-se o zumbido.

- Todos os quatro são impressionantes.
- Não é nem metade do que deveria ser.

Há um ensaio hoje à noite.
Perdi três dias com...

Mas não é um problema.

Quando aprende-se a amar,
perde-se o medo da morte.

Portanto, a questão é:

tendo aprendido a amar
e experienciado o amor

durante minha vida terrena,

o estado do ser após a morte

e tudo na terra seria esquecido
naquela luz brilhante.

Mas eu não vou me lembrar.
Serei parte daquela luz.

Não tenho mais consciência,
não tenho mais ego.

Sou parte de alguma coisa,
de energia.

Uma energia radiante.
Mas não estou ciente disso.

Posso despedir-me ao meu ego
enquanto morro,

enquanto experimento algo
que a luz simboliza nesta vida,

que estou autorizado a experimentar
algo tão emocionante.

Então posso dizer adeus ao meu ego.

A todas minhas memórias.
Muitas pessoas têm medo

de não ter mais memória,
personalidade, ego.

Nem mesmo vão saber quem elas são.
Elas não têm mais ego.

Com essa percepção você não pode...

É ridículo.

Se não é possível separar-se
de seu ego,

certamente não há como terminar
em outro lugar.

Os Flocos de Ouro | 1975

PARA WERNER

Tradução:
Pietro Milan e Bruno Colli