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1
00:01:28,781 --> 00:01:31,523
Origem dos documentos: Comit� de
Hist�ria da Segunda Guerra Mundial,
2
00:01:31,544 --> 00:01:34,166
Federa��o de Deportados, Centro de
Documenta��o Judaica, Miss�o Belga,
3
00:01:34,197 --> 00:01:36,403
Instituto Holand�s
de Documenta��o de Guerra,
4
00:01:36,424 --> 00:01:38,560
Filmes Polski, Servi�o
Polon�s dos Crimes de Guerra,
5
00:01:38,580 --> 00:01:40,851
Museus do Gueto,
de Auschwitz e de Maidaneck.
6
00:01:41,787 --> 00:01:44,950
Patrocinado pelo Comit� de
Hist�ria da Segunda Guerra Mundial,
7
00:01:44,951 --> 00:01:48,662
com o apoio das seguintes entidades:
Minist�rio dos Ex-Combatentes,
8
00:01:48,698 --> 00:01:52,374
Museu Pedag�gico, Conselho Municipal
de Paris, Conselho Geral do Sena,
9
00:01:52,376 --> 00:01:54,927
Centro Nacional de Cinematografia,
Televis�o Francesa,
10
00:01:54,928 --> 00:01:57,980
Centro Polon�s de Cinematografia em Vars�via,
Rede da Lembran�a,
11
00:01:58,001 --> 00:02:00,799
todas as Federa��es e
Simpatizantes dos Deportados.
12
00:02:01,816 --> 00:02:05,473
Coprodu��o
13
00:02:06,006 --> 00:02:10,655
NOITE E NEBLINA
14
00:02:11,205 --> 00:02:15,023
Dire��o
15
00:02:15,408 --> 00:02:18,190
Conselheiros Hist�ricos
16
00:02:19,880 --> 00:02:23,444
M�sica
17
00:02:24,354 --> 00:02:27,806
Texto
18
00:02:28,422 --> 00:02:32,273
C�mera
19
00:02:33,100 --> 00:02:36,951
Dire��o de Produ��o
em exteriores
20
00:02:37,468 --> 00:02:43,370
Assistentes de Dire��o
Assistente de Montagem
21
00:02:43,771 --> 00:02:48,871
Assistentes de sonoriza��o
Efeitos especiais Som
22
00:03:01,820 --> 00:03:04,506
Mesmo uma paisagem tranquila...
23
00:03:05,992 --> 00:03:10,700
mesmo uma pradaria com corvos a voar,
colheitas e queimadas...
24
00:03:23,332 --> 00:03:26,700
Mesmo uma estrada por onde passam
carros, camponeses, casais...
25
00:03:26,750 --> 00:03:30,162
mesmo uma aldeia pacata
com feirinhas e campan�rios,
26
00:03:30,183 --> 00:03:33,488
tudo pode nos conduzir
a um campo de concentra��o.
27
00:03:36,105 --> 00:03:41,962
Struthof, Oranienburg, Auschwitz,
Neuengamme, Belsen, Ravensbr�ck, Dachau,
28
00:03:41,990 --> 00:03:45,111
eram nomes como
quaisquer outros nos mapas e guias.
29
00:03:45,535 --> 00:03:48,446
O sangue coagulou,
as bocas se calaram.
30
00:03:48,467 --> 00:03:50,854
Os blocos hoje s�o visitados
apenas pelas c�meras.
31
00:03:50,855 --> 00:03:55,652
A erva teimosa voltou a cobrir a terra
antes pisada pelos presos.
32
00:03:56,382 --> 00:03:59,081
A corrente j� n�o passa
pelos fios el�tricos.
33
00:03:59,182 --> 00:04:01,580
N�o se ouvem mais passos,
s� os nossos.
34
00:04:08,481 --> 00:04:10,253
1933.
35
00:04:11,923 --> 00:04:14,033
A m�quina p�e-se em marcha.
36
00:04:36,428 --> 00:04:38,723
� preciso uma na��o sem vozes destoantes.
37
00:04:44,876 --> 00:04:46,308
Sem contesta��es.
38
00:04:46,799 --> 00:04:48,509
Ao trabalho.
39
00:04:49,986 --> 00:04:53,514
Um campo de concentra��o se constr�i
como um est�dio ou um grande hotel.
40
00:04:53,615 --> 00:04:56,552
Com empreiteiros, or�amentos, concorr�ncia...
41
00:04:56,653 --> 00:04:58,200
e, sem d�vida, subornos.
42
00:04:58,644 --> 00:05:01,476
O estilo n�o � imposto,
fica a cargo da imagina��o.
43
00:05:01,773 --> 00:05:03,337
Estilo alpino...
44
00:05:03,756 --> 00:05:05,320
...estilo garagem...
45
00:05:05,946 --> 00:05:07,710
...estilo japon�s...
46
00:05:07,824 --> 00:05:09,689
...sem estilo.
47
00:05:09,911 --> 00:05:12,204
Calmamente os arquitetos projetam
esses p�rticos
48
00:05:12,255 --> 00:05:14,700
destinados a serem
transpostos apenas uma vez.
49
00:05:16,065 --> 00:05:18,672
Entrementes, Burger, oper�rio alem�o,
50
00:05:18,890 --> 00:05:21,497
Stern, estudante judeu de Amsterdam,
51
00:05:21,906 --> 00:05:24,322
Schmulski, comerciante de Crac�via,
52
00:05:24,831 --> 00:05:26,900
Annette, estudante de Bord�us,
53
00:05:26,930 --> 00:05:30,668
todos levam suas vidas sem saber que,
a mil km de onde moram,
54
00:05:30,669 --> 00:05:32,525
j� t�m lugar marcado.
55
00:05:34,633 --> 00:05:37,150
Chegado o dia em que
seus blocos ficam prontos...
56
00:05:37,250 --> 00:05:39,000
...s� faltam eles.
57
00:05:39,933 --> 00:05:42,019
Segregados em Vars�via.
58
00:05:44,001 --> 00:05:48,012
Deportados de Lodz, Praga,
Bruxelas, Atenas,
59
00:05:48,069 --> 00:05:51,509
Zagreb, Odessa ou Roma.
60
00:05:55,938 --> 00:05:58,023
Internados de Pithiviers.
61
00:05:59,900 --> 00:06:02,386
A rusga do V�lodrome d'Hiver.
62
00:06:04,227 --> 00:06:06,799
Membros da Resist�ncia presos
em Compi�gne.
63
00:06:08,245 --> 00:06:13,130
Multid�es pegas de surpresa,
por engano ou ao acaso,
64
00:06:13,267 --> 00:06:15,011
seguem a caminho dos campos.
65
00:08:16,447 --> 00:08:18,298
Vag�es fechados, trancados.
66
00:08:18,794 --> 00:08:21,336
Abarrotados, cem deportados por vag�o.
67
00:08:21,372 --> 00:08:25,773
Sem dia nem noite.
S� fome, sede, asfixia, ins�nia.
68
00:08:27,239 --> 00:08:29,733
Uma mensagem � atirada
e ocasionalmente recolhida.
69
00:08:31,307 --> 00:08:33,593
A morte faz sua primeira escolha.
70
00:08:35,479 --> 00:08:38,599
Uma segunda � feita ao chegar,
� noite, na neblina.
71
00:08:44,656 --> 00:08:47,785
Hoje, nesta mesma via, � dia e faz sol.
72
00:08:48,098 --> 00:08:50,062
Percorremo-la lentamente.
73
00:08:50,289 --> 00:08:52,044
� procura de qu�?
74
00:08:52,630 --> 00:08:55,906
De vest�gios dos cad�veres
vomitados pela abertura das portas?
75
00:08:56,124 --> 00:08:58,100
Ou dos passos dos primeiros a desembarcar,
76
00:08:58,101 --> 00:09:00,200
encaminhados a coronhadas
at� a entrada do campo,
77
00:09:00,220 --> 00:09:03,300
em meio ao latido de c�es
fachos dos holofotes,
78
00:09:03,350 --> 00:09:05,243
tendo ao longe a chama do cremat�rio,
79
00:09:05,264 --> 00:09:08,600
numa daquelas encena��es noturnas
t�o ao gosto dos nazistas.
80
00:09:27,457 --> 00:09:29,379
Primeira vis�o do campo.
81
00:09:29,490 --> 00:09:30,985
� um outro planeta.
82
00:09:35,856 --> 00:09:37,586
Banho e Desinfec��o
83
00:09:37,729 --> 00:09:39,600
Sob o pretexto de higiene,
84
00:09:39,620 --> 00:09:43,600
a nudez despoja de um s� golpe
o amor pr�prio dos j� humilhados.
85
00:09:43,674 --> 00:09:45,237
Raspados...
86
00:09:45,445 --> 00:09:47,009
tatuados...
87
00:09:47,739 --> 00:09:49,304
numerados.
88
00:09:50,033 --> 00:09:53,041
Sujeitos a um jogo
hier�rquico ainda incompreens�vel.
89
00:09:54,204 --> 00:09:56,290
Vestidos com uma roupa azul listrada,
90
00:09:56,291 --> 00:10:00,200
por vezes classificados como "Nacht und Neibeul",
Noite e Neblina,
91
00:10:01,190 --> 00:10:03,311
Marcado com o tri�ngulo vermelho
dos pol�ticos,
92
00:10:03,348 --> 00:10:05,620
o deportado apresenta-se
primeiro ao portador de tri�ngulo verde.
93
00:10:05,640 --> 00:10:08,475
Um criminoso comum
tornado a chefe de uma subesp�cie.
94
00:10:09,431 --> 00:10:13,600
Acima deste, o Kapo,
quase sempre um criminoso comum.
95
00:10:15,059 --> 00:10:18,800
Mais acima, o SS, o intoc�vel.
Para se dirigir a ele, s� a 3 metros de dist�ncia.
96
00:10:18,920 --> 00:10:22,092
No topo, o comandante.
De longe, ele preside o ritual.
97
00:10:22,128 --> 00:10:23,766
Parece ignorar o campo.
98
00:10:24,965 --> 00:10:27,051
Que, entretanto, n�o ignora.
99
00:10:27,989 --> 00:10:31,008
Essa realidade dos campos,
desprezada pelos que os constru�ram,
100
00:10:31,109 --> 00:10:33,715
inconceb�vel para os que l� sofreram,
101
00:10:34,005 --> 00:10:37,556
que chance ter�amos n�s de resgatar?
102
00:10:40,032 --> 00:10:43,613
Esses cub�culos em madeira, esses
catres onde dormiam tr�s,
103
00:10:44,049 --> 00:10:48,011
esse covil onde se escondiam,
onde se comia com sofreguid�o,
104
00:10:48,012 --> 00:10:50,399
onde o pr�prio sono era uma amea�a.
105
00:10:51,038 --> 00:10:54,688
Nenhuma descri��o, nenhuma imagem
poderia traduzir sua verdadeira dimens�o...
106
00:10:55,106 --> 00:10:57,591
uma de pavor sem tr�gua.
107
00:10:58,339 --> 00:11:01,500
Faltaria ainda o colch�o de palha
usado para esconder comida e objetos de valor...
108
00:11:01,774 --> 00:11:05,932
a manta objeto de disputas,
as den�ncias, as pragas rogadas,
109
00:11:06,034 --> 00:11:08,219
as ordens transmitidas em todas as l�nguas...
110
00:11:08,320 --> 00:11:11,799
a entrada rel�mpago dos SS,
�vidos de controle ou pura divers�o.
111
00:11:13,609 --> 00:11:17,302
Desses dormit�rios de tijolo,
desses sonos amea�ados...
112
00:11:17,728 --> 00:11:20,054
podemos mostrar-lhes apenas um vislumbre...
113
00:11:20,187 --> 00:11:21,586
a cor.
114
00:11:50,366 --> 00:11:52,045
O cen�rio � esse.
115
00:11:52,205 --> 00:11:56,140
Pr�dios que poderiam ter sido est�bulos,
celeiros, oficinas.
116
00:11:56,257 --> 00:11:58,448
Um terreno pobre que
se tornou um terreno baldio.
117
00:11:58,968 --> 00:12:01,300
Um c�u de outono indiferente.
118
00:12:02,461 --> 00:12:04,351
Eis o que sobrou para imaginarmos
119
00:12:04,352 --> 00:12:06,852
noites varadas de gritos de desespero,
de combate a pulgas.
120
00:12:06,900 --> 00:12:10,023
Noites de bater com os dentes.
� preciso dormir r�pido.
121
00:12:10,546 --> 00:12:14,000
Acordar de sobressalto, aos empurr�es,
� procura de bens roubados.
122
00:12:14,041 --> 00:12:16,799
Cinco da manh�, agrupamento
intermin�vel na Appelplatz,
123
00:12:16,850 --> 00:12:18,900
Os mortos durante a noite
sempre a complicar a contagem.
124
00:12:18,960 --> 00:12:23,096
Uma orquestra toca marchas de opereta
� partida para a pedreira ou a f�brica.
125
00:12:27,594 --> 00:12:30,799
Trabalho na neve,
logo transformada em lama congelada.
126
00:12:34,277 --> 00:12:37,500
Trabalho no calor de agosto,
em meio � sede e � disenteria.
127
00:12:46,678 --> 00:12:48,351
Tr�s mil espanh�is perderam suas vidas
128
00:12:48,400 --> 00:12:51,300
na constru��o dessa escadaria
que conduzia � pedreira de Mauthausen.
129
00:12:56,794 --> 00:12:58,650
Trabalho nas f�bricas subterr�neas.
130
00:12:58,670 --> 00:13:02,600
M�s ap�s m�s elas se enterram,
se escondem, matam.
131
00:13:02,941 --> 00:13:06,464
T�m nomes de mulher:
Dora, Laura...
132
00:13:07,113 --> 00:13:10,700
Mas esses estranhos oper�rios
pesando menos de 30 quilos n�o s�o confi�veis...
133
00:13:12,852 --> 00:13:14,717
Os SS os t�m sob sua mira...
134
00:13:15,039 --> 00:13:16,603
vigiam-nos...
135
00:13:16,813 --> 00:13:18,377
agrupam-nos...
136
00:13:19,004 --> 00:13:22,019
inspecionam e revistam-nos
antes de regressarem ao campo.
137
00:13:26,094 --> 00:13:29,728
Cartazes r�sticos orientam-nos
de volta para seus lugares.
138
00:13:30,164 --> 00:13:32,979
Para o Kapo s� lhe resta
contar as v�timas do dia.
139
00:13:35,787 --> 00:13:39,165
Para o deportado, resta-lhe a �nica obsess�o
que norteia sua vida e seus sonhos:
140
00:13:39,180 --> 00:13:40,539
comer.
141
00:13:40,689 --> 00:13:42,357
A sopa.
142
00:13:42,567 --> 00:13:44,331
Cada colherada n�o tem pre�o.
143
00:13:44,332 --> 00:13:47,468
Uma colherada a menos
� menos um dia de vida.
144
00:13:50,389 --> 00:13:53,518
Trocam-se dois,
tr�s cigarros por uma sopa.
145
00:13:53,519 --> 00:13:57,400
Fracos demais, muitos n�o conseguem
defender sua ra��o dos ladr�es.
146
00:13:57,435 --> 00:14:00,602
Ficam � espera de que a lama,
a neve os levem.
147
00:14:01,967 --> 00:14:05,921
Deitam-se onde quer que seja
para sofrerem sua agonia em sil�ncio.
148
00:14:15,316 --> 00:14:17,609
As latrinas, os abortos.
149
00:14:19,061 --> 00:14:21,146
Esqueletos com barrigas intumescidas,
150
00:14:21,147 --> 00:14:23,799
aqui vinham sete, oito vezes por noite.
151
00:14:23,964 --> 00:14:25,841
A sopa era diur�tica.
152
00:14:26,360 --> 00:14:29,700
Ai daqueles que topassem
com um Kapo embriagado ao luar.
153
00:14:30,536 --> 00:14:32,465
Os prisioneiros se entreolhavam amedrontados...
154
00:14:32,466 --> 00:14:34,864
� espreita de sintomas j� bem familiares.
155
00:14:34,965 --> 00:14:37,055
Perda de sangue era sinal de morte certa.
156
00:14:37,726 --> 00:14:41,799
Mercado negro, onde se comprava,
se vendia, se matava.
157
00:14:41,850 --> 00:14:43,500
Encontros eram marcados.
158
00:14:43,521 --> 00:14:45,800
Passavam-se as not�cias, verdadeiras e falsas.
159
00:14:45,850 --> 00:14:48,513
Organizavam-se grupos de resist�ncia.
160
00:14:49,926 --> 00:14:54,100
Uma sociedade tomava forma,
uma forma esculpida pelo terror.
161
00:14:54,200 --> 00:14:57,500
Menos insana, contudo, que a ordem da SS
expressa com os seguintes preceitos:
162
00:14:57,541 --> 00:14:59,627
"Limpeza � Sa�de"
163
00:15:00,566 --> 00:15:02,652
"Trabalho � Liberdade"
164
00:15:03,742 --> 00:15:05,885
"A cada um o que lhe cabe"
165
00:15:07,137 --> 00:15:10,996
"Um Piolho � a Morte".
O que dizer de um oficial da SS ent�o?
166
00:15:11,427 --> 00:15:13,460
Cada campo reserva uma surpresa.
167
00:15:13,491 --> 00:15:15,061
Uma orquestra sinf�nica.
168
00:15:16,101 --> 00:15:18,082
Um zoo.
169
00:15:19,540 --> 00:15:22,654
Estufas onde Himmler
cultivava plantas fr�geis.
170
00:15:24,237 --> 00:15:25,850
O carvalho de Goethe em Buchenwald.
171
00:15:25,870 --> 00:15:28,700
Construiu-se o campo ao redor,
mas respeitou-se o carvalho.
172
00:15:29,448 --> 00:15:32,577
Um orfanato ef�mero,
constantemente renovado.
173
00:15:34,559 --> 00:15:36,537
Um bloco para os inv�lidos.
174
00:15:39,404 --> 00:15:42,799
A�, o verdadeiro mundo,
das paisagens buc�licas,
175
00:15:42,850 --> 00:15:45,482
dos tempos de outrora,
pode aparecer ao longe...
176
00:15:45,550 --> 00:15:47,222
...mas n�o t�o longe assim.
177
00:15:47,903 --> 00:15:50,196
Para o deportado era uma imagem.
178
00:15:50,927 --> 00:15:54,120
Ele pertencia apenas
a esse universo finito, fechado,
179
00:15:54,250 --> 00:15:55,688
limitado pelas torres de observa��o...
180
00:15:55,723 --> 00:15:58,460
de onde os soldados vigiavam o
bom funcionamento do campo,
181
00:15:58,500 --> 00:16:00,208
miravam incessantemente os deportados,
182
00:16:00,209 --> 00:16:03,415
matando-os ocasionalmente
por simples falta do que fazer.
183
00:16:14,962 --> 00:16:19,501
Tudo era pretexto para divers�o,
para puni��o, humilha��o.
184
00:16:20,019 --> 00:16:22,109
As chamadas duravam horas a fio.
185
00:16:27,943 --> 00:16:30,034
Uma cama mal feita:
vinte cacetadas.
186
00:16:32,016 --> 00:16:35,458
N�o chamar aten��o,
n�o reverenciar seus deuses.
187
00:16:35,982 --> 00:16:38,467
Eles t�m seus cadafalsos,
seus p�tios para matar.
188
00:16:38,694 --> 00:16:41,112
Esse p�tio do Bloco 11,
fora de vista,
189
00:16:41,150 --> 00:16:43,153
alocado para os fuzilamentos...
190
00:16:43,690 --> 00:16:46,596
com muros protegidos
contra o ricochete das balas.
191
00:16:47,547 --> 00:16:49,737
Esse castelo de Harteim,
de onde partem �nibus de vidros escuros
192
00:16:49,738 --> 00:16:51,926
conduzindo passageiros que nunca mais
ser�o vistos.
193
00:16:53,595 --> 00:16:57,557
Transportes negros que partem � noite
e cujo destino ningu�m conhece.
194
00:17:07,151 --> 00:17:09,445
Mas � incr�vel a resist�ncia humana.
195
00:17:09,500 --> 00:17:11,635
O corpo vergado pela fadiga,
ainda assim o esp�rito trabalha.
196
00:17:11,636 --> 00:17:13,720
As m�os cobertas de ataduras trabalham.
197
00:17:13,800 --> 00:17:16,745
Fabricam-se colheres,
marionetes que s�o escondidas...
198
00:17:17,318 --> 00:17:18,516
monstros...
199
00:17:21,437 --> 00:17:22,688
caixas.
200
00:17:25,399 --> 00:17:28,085
Consegue-se escrever, fazer anota��es.
201
00:17:29,570 --> 00:17:31,656
Exercitar a mem�ria atrav�s dos sonhos.
202
00:17:31,799 --> 00:17:33,457
'Lagostins � la basquaise'
203
00:17:33,532 --> 00:17:35,618
Pode-se pensar em Deus.
204
00:17:37,286 --> 00:17:40,568
Conseguem at� organizar-se politicamente,
disputando com os criminosos comuns...
205
00:17:40,599 --> 00:17:42,700
...o controle interno da vida no campo.
206
00:17:46,567 --> 00:17:48,965
Cuidam dos companheiros em pior estado.
207
00:17:49,695 --> 00:17:52,927
Partilham sua pr�pria ra��o,
criam sistemas de aux�lio.
208
00:17:58,246 --> 00:18:02,900
Em �ltimo caso, carregam os mais amea�ados
para o hospital.
209
00:18:04,398 --> 00:18:07,109
Aproximar-se dessa porta j� era em si
a ilus�o da verdadeira doen�a...
210
00:18:07,150 --> 00:18:08,986
...a esperan�a de uma cama.
211
00:18:09,664 --> 00:18:12,500
Mas era tamb�m o risco
de morte pela seringa.
212
00:18:16,703 --> 00:18:20,404
Os medicamentos s�o escassos,
as ataduras de papel.
213
00:18:20,455 --> 00:18:23,638
A mesma pomada serve para todas
as doen�as, todas as feridas.
214
00:18:25,725 --> 00:18:28,853
�s vezes, o doente faminto
come a pr�pria atadura.
215
00:18:32,712 --> 00:18:34,772
No fim, todos os deportados
t�m a mesma cara.
216
00:18:34,809 --> 00:18:37,766
Seguindo um mesmo modelo sem idade,
morrem de olhos abertos.
217
00:18:41,729 --> 00:18:43,815
Havia um bloco cir�rgico.
218
00:18:44,128 --> 00:18:46,799
Mais um pouco dir-se-ia tratar-se
de uma verdadeira cl�nica.
219
00:18:52,471 --> 00:18:54,243
Doutor SS.
220
00:18:56,747 --> 00:18:58,625
Enfermeira inquietante.
221
00:19:02,483 --> 00:19:04,569
H� uma decora��o, mas por tr�s...
222
00:19:05,091 --> 00:19:07,803
opera��es in�teis, amputa��es...
223
00:19:07,804 --> 00:19:10,097
mutila��es experimentais.
224
00:19:13,644 --> 00:19:16,772
Os Kapos, como os cirurgi�es SS,
podem praticar � vontade.
225
00:19:26,784 --> 00:19:30,465
A ind�stria qu�mica envia ao campo
amostras dos seus produtos t�xicos...
226
00:19:31,363 --> 00:19:34,491
ou compra lotes de deportados
para suas experi�ncias.
227
00:19:34,909 --> 00:19:37,394
Dessas cobaias alguns sobreviver�o...
228
00:19:38,141 --> 00:19:39,391
castrados...
229
00:19:43,147 --> 00:19:44,919
queimados por f�sforo.
230
00:19:49,404 --> 00:19:52,431
Ainda h� aquela cuja pele ficar�
marcada para o resto da vida,
231
00:19:53,062 --> 00:19:54,732
qual que seja.
232
00:19:57,442 --> 00:19:59,600
Dessas mulheres, desses homens,
os escrit�rios administrativos...
233
00:19:59,630 --> 00:20:01,927
conservam os rostos, entregues na chegada.
234
00:20:10,782 --> 00:20:14,350
Os nomes tamb�m s�o registrados.
Nomes de vinte e duas na��es,
235
00:20:14,388 --> 00:20:17,500
preenchendo centenas de registros,
milhares de arquivos.
236
00:20:17,565 --> 00:20:19,858
Um tra�o vermelho indica os mortos.
237
00:20:20,798 --> 00:20:23,300
Os deportados se ocupam desta
contabilidade alucinada...
238
00:20:23,330 --> 00:20:24,450
sempre falsa...
239
00:20:24,554 --> 00:20:26,639
sob a mira dos SS e
dos Kapos privilegiados,
240
00:20:26,640 --> 00:20:29,560
estes os mais proeminentes, a elite do campo.
241
00:20:37,420 --> 00:20:40,380
O Kapo tem seu pr�prio quarto,
onde pode guardar seu butim
242
00:20:40,400 --> 00:20:42,374
e � noite receber suas jovens favoritas.
243
00:20:52,594 --> 00:20:54,400
Pr�ximo ao campo,
o comandante tem seu casar�o
244
00:20:54,430 --> 00:20:57,389
onde sua mulher contribui
para preservar a vida familiar...
245
00:20:57,410 --> 00:21:00,765
e �s vezes mundana,
como em qualquer outra guarni��o.
246
00:21:02,732 --> 00:21:04,900
Ela talvez se entedie um pouco mais.
247
00:21:04,951 --> 00:21:06,800
A guerra simplesmente n�o acaba.
248
00:21:09,278 --> 00:21:11,799
Mais afortunados, os
Kapos tinham um bordel.
249
00:21:12,407 --> 00:21:15,900
Prisioneiras mais bem nutridas, mas,
como as outras, fadadas a morrer.
250
00:21:15,950 --> 00:21:19,291
Dessas janelas, n�o raro, atiravam-se
c�deas de p�o para os companheiros de fora.
251
00:21:20,856 --> 00:21:24,480
Dessa forma, os SS lograram constituir
uma verdadeira cidade
252
00:21:24,500 --> 00:21:27,660
com hospital, bairro reservado,
bairro residencial...
253
00:21:27,691 --> 00:21:29,900
e at�, sim, uma pris�o.
254
00:21:38,898 --> 00:21:41,608
In�til descrever o que
se passava nesses calabou�os.
255
00:21:43,487 --> 00:21:46,450
Nessas gaiolas, projetadas de forma
a n�o permitir ficar-se de p� ou deitado,
256
00:21:46,470 --> 00:21:49,952
homens e mulheres foram deliberadamente
torturados dias a fio.
257
00:21:56,731 --> 00:21:59,234
As bocas de ventila��o
n�o abafam os gritos.
258
00:22:04,552 --> 00:22:06,117
1942.
259
00:22:12,896 --> 00:22:14,877
Himmler visita os campos.
260
00:22:15,713 --> 00:22:18,528
� preciso exterminar, mas produtivamente.
261
00:22:18,700 --> 00:22:20,700
Deixando a produtividade
a cargo de seus t�cnicos,
262
00:22:20,730 --> 00:22:23,213
Himmler se dedica ao problema do exterm�nio.
263
00:22:32,087 --> 00:22:33,859
Estudam-se as plantas.
264
00:22:36,676 --> 00:22:38,240
As maquetes.
265
00:22:38,535 --> 00:22:41,994
Estas s�o executadas e os pr�prios deportados
participam da constru��o.
266
00:22:45,313 --> 00:22:49,587
Os cremat�rios podiam
passar-se at� por um cart�o postal.
267
00:22:49,870 --> 00:22:53,652
Mais tarde, hoje,
os turistas se fazem fotografar.
268
00:22:54,596 --> 00:22:56,785
A deporta��o estende-se
a toda a Europa.
269
00:23:02,730 --> 00:23:05,700
Os comboios se extraviam, param,
partem de novo,
270
00:23:05,750 --> 00:23:08,883
s�o bombardeados, e finalmente chegam.
271
00:23:12,163 --> 00:23:14,827
Para alguns, a sele��o j� fora feita.
272
00:23:18,583 --> 00:23:20,573
Para os outros, a triagem � imediata,
273
00:23:20,600 --> 00:23:21,965
Os da esquerda ir�o trabalhar.
274
00:23:21,986 --> 00:23:24,052
Os da direita...
275
00:23:25,145 --> 00:23:28,378
Essas imagens foram colhidas poucos
instantes antes de uma exterm�nio.
276
00:23:48,295 --> 00:23:51,840
Matar � m�o leva tempo.
Encomendam-se caixas de g�s zyklon.
277
00:23:53,822 --> 00:23:56,950
Nada distinguia uma c�mara
de g�s de um bloco normal.
278
00:23:58,932 --> 00:24:02,999
No interior, uma falsa sala de chuveiros
acolhia os rec�m-chegados.
279
00:24:18,641 --> 00:24:20,205
As portas eram cerradas.
280
00:24:23,841 --> 00:24:25,629
Observava-se.
281
00:24:35,322 --> 00:24:38,768
O �nico sinal,
� preciso que se saiba,
282
00:24:38,769 --> 00:24:41,541
� esse teto sulcado
por marcas de unhadas.
283
00:24:42,193 --> 00:24:44,610
At� o concreto se dilacerou.
284
00:25:08,272 --> 00:25:11,714
Quando os cremat�rios j� n�o d�o vaz�o,
recorre-se a fogueiras.
285
00:25:34,341 --> 00:25:37,886
Contudo, os novos fornos d�o conta
de milhares de corpos por dia.
286
00:26:32,109 --> 00:26:33,673
Tudo � aproveitado.
287
00:26:34,613 --> 00:26:36,802
Eis as reservas dos nazistas em guerra...
288
00:26:37,534 --> 00:26:39,306
seus celeiros.
289
00:26:49,315 --> 00:26:51,922
Tudo cabelo das mulheres.
290
00:27:22,265 --> 00:27:25,810
A quinze pfennigs o quilo,
confeccionam-se tecidos.
291
00:27:35,404 --> 00:27:36,968
Com os ossos...
292
00:27:47,708 --> 00:27:49,273
adubo...
293
00:27:49,274 --> 00:27:50,838
enfim, tentava-se.
294
00:27:50,839 --> 00:27:52,402
Com os corpos...
295
00:27:52,403 --> 00:27:55,210
Bem, o que se pode dizer?
296
00:28:06,165 --> 00:28:08,146
Com os corpos, o objetivo � fabricar...
297
00:28:08,252 --> 00:28:10,336
sab�o.
298
00:28:12,215 --> 00:28:13,987
Quanto � pele...
299
00:28:23,891 --> 00:28:27,853
1945. Os campos se expandem,
est�o lotados.
300
00:28:27,855 --> 00:28:31,504
Cidades de cem mil habitantes, saturadas.
301
00:28:31,556 --> 00:28:34,800
A grande ind�stria interessa-se
por essa m�o-de-obra infinitamente renov�vel.
302
00:28:35,260 --> 00:28:37,555
As f�bricas t�m seus campos particulares,
interditados aos SS.
303
00:28:37,661 --> 00:28:43,291
Steyer, Krupp, Heinkel, I.G. Farben,
Siemens e Hermann G�ring
304
00:28:43,293 --> 00:28:45,378
abastecem-se com esse mercado.
305
00:28:45,400 --> 00:28:49,341
Os nazistas podem ganhar a guerra.
Essas novas cidades fazem parte da economia.
306
00:28:49,969 --> 00:28:51,533
Mas eles perdem.
307
00:28:51,941 --> 00:28:55,695
Falta carv�o para os cremat�rios,
falta p�o para os homens.
308
00:28:55,710 --> 00:28:57,783
Os cad�veres entulham
as ruas dos campos.
309
00:28:58,201 --> 00:28:59,765
O tifo.
310
00:29:00,392 --> 00:29:02,581
Quando os aliados abrem as portas...
311
00:29:35,476 --> 00:29:37,040
Todas as portas.
312
00:30:15,517 --> 00:30:17,863
Os deportados olham sem entender.
313
00:30:17,864 --> 00:30:22,347
Est�o livres?
A vida quotidiana haver� de reconhec�-los?
314
00:30:27,769 --> 00:30:30,170
"Eu n�o sou respons�vel", diz o Kapo.
315
00:30:34,238 --> 00:30:37,262
"Eu n�o sou respons�vel", diz o oficial.
316
00:30:39,239 --> 00:30:41,429
"Eu n�o sou respons�vel."
317
00:30:44,348 --> 00:30:46,643
Ent�o, quem � respons�vel?
318
00:31:09,895 --> 00:31:11,600
No momento em que lhes falo...
319
00:31:11,640 --> 00:31:15,181
...a �gua fria dos p�ntanos e das ru�nas
cobre as covas coletivas.
320
00:31:16,152 --> 00:31:19,177
Uma �gua fria e opaca como
a nossa p�ssima mem�ria.
321
00:31:21,627 --> 00:31:23,764
A guerra adormeceu.
322
00:31:24,600 --> 00:31:26,686
Um olho sempre aberto.
323
00:31:33,931 --> 00:31:37,963
A erva fiel voltou a crescer nas Appelplatz
e em torno dos blocos.
324
00:31:39,301 --> 00:31:42,117
Uma aldeia abandonada,
mas ainda amea�adora.
325
00:31:53,744 --> 00:31:55,881
N�o se usam mais cremat�rios,
326
00:31:55,882 --> 00:31:57,968
os artif�cios nazistas s�o coisa do passado.
327
00:31:59,324 --> 00:32:02,637
Nove milh�es de mortos
assombram essa paisagem.
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Quem dentre n�s monta guarda
neste estranho observat�rio...
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para nos prevenir da
chegada de novos carrascos?
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Seus rostos ser�o diferente dos nossos?
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Em algum lugar, entre n�s,
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existem ainda Kapos afortunados,
chefes reabilitados,
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delatores desconhecidos.
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Restam ainda aqueles que n�o acreditavam,
ou acreditavam somente de vez em quando.
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Existimos n�s, que olhamos
sinceramente para essas ru�nas,
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como se o velho monstro concentracion�rio
estivesse morto sob os escombros.
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Que parecemos nutrir alguma esperan�a
diante dessa imagem que se afasta...
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como se estiv�ssemos curados
da peste concentracion�ria.
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N�s, que parecemos acreditar que tudo isso
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pertence a um s� tempo,
a um s� pa�s...
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que n�o pensamos em olhar � nossa volta,
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e que n�o escutamos o grito incessante.
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Legendas: Lu�s Filipe Bernardes
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