All language subtitles for The.Forgiven.2021.1080p.Blu-ray.AVC.DTS-HD.MA.5.1-iNTEGRUM-Portuguese

L'Afrique.

- A Tânger.
- Tânger!

Como será possível demorar tanto
para conseguir um carro?

É Marrocos, não é Milton Keynes.

- Então!
- Qual é o problema?

Ainda bem que não ficamos.

Ficaremos no regresso.
Talvez seja interessante.

Interessante no bom ou no mau sentido?

São 640 quilómetros até Azna.

É longe para ir a uma festa,
mas são mais teus amigos que meus.

Será novidade, para o Richard.

O teu problema
é que nunca saíste da aldeia.

O dinheiro. Como pode alguém viver?

Quem quer viver, encontra uma solução.

Queres passar o resto da tua vida
a escavar fósseis numa trincheira?

EXCURSÕES CHEFCHAOUEN

Olha para eles.

Gnus do continente.

Seria de pensar que não comem há dias.

Talvez não lhes deem sanduíches
naqueles autocarros.

Ainda devias estar a beber?

É só um copo.

Vais beber a garrafa toda, como sempre.

Porque pensei em "gralha"?

Porque pensei em "desagradável"?

Porque pensei
em "alcoólico altamente funcional"?

Sempre achei que o "altamente funcional"
deveria cancelar o "alcoólico".

Como uma dupla negativa.

Além disso, as estradas estão vazias.

É como um demónio que caiu do céu.

Não pode ser negado.

O mundo é cruel. Assim diz o meu pai.

Ele está certo. Cruel é a palavra certa.

Quem?

Os maricas em Azna.

Não é um horário militar.

Queres ficar aqui uma noite?

Quero chegar à casa do Richard.

Não faz mal.
Eles tratam as mulheres como burros.

Para eles, és apenas uma burra foragida.

Detesto quando dizes essas coisas.

- É verdade, não é?
- Não importa.

Eu diria que importa bastante.

Tu não fazes ideia
de como eles tratam as mulheres.

- Monsieur?
- Oui?

Quão quente é o deserto?

Vão sofrer, vão ver.

Merci.

Raio da internet.

Admite, David. Estamos perdidos.

Não estamos perdidos.
Só temos de encontrar o desvio para Azna.

- Estamos na estrada certa?
- Só há uma estrada.

Acabámos de passar por Midelt.
Devíamos virar para Tafnet.

Não vejo outra estrada que...

Eles não mencionaram Tafnet.

- Esta é a...
- Partimos muito tarde.

- Claro, fui eu.
- Teimaste...

Podes mudar de assunto?

- Vou ligar ao Richard.
- Não vamos ligar a ninguém.

Deve ser um dos convidados.

E se não forem?

São brancos, não são?

E se eles resistirem?

Eles são descrentes.

Tu achas que eu tenho medo.

Tu tens sempre medo.

Necessidade, irmão.

Estranho, eles não pararam.

E se tivéssemos sofrido um acidente?
Eles nem abrandaram.

- É o desvio.
- Não é nada.

- É o desvio.
- Não, David.

Não sejas tão estúpida.

PERDOADO

Bem-vindos.

Um coquetel, senhor.

Shukran. Merci. Que se foda, tanto faz.

Olá. Não dança porquê?

A minha mulher fugiu
com um gestor de fundos.

Eu fiz isso uma vez.

E como correu?

Ele deixou-me ficar com a casa em Cabo.

Gosta da música?

É bastante invulgar.

Não, não é.

Costumavam passá-la em todos os pisos
de todas as Virgin Megastores.

O senhor é um desses.

Talvez.

Certo. Adeus.

Obrigado, obrigado.

Obrigado. Calem-se.

Senhoras e senhores,
peço a vossa atenção, por favor.

Agradeço a todos a vossa presença
na nossa pequena festa no deserto.

Este magnífico edifício no qual irão ficar

é conhecido como um qsar.

Significa "castelo" em árabe.

Obrigado, Dally.

A remodelação avança a bom ritmo.

Eu e o Dally nunca pensámos
que corresse tão bem.

A remodelação é uma farsa completa.

E nunca a faríamos sem a maravilhosa ajuda

dos nossos amiguinhos marroquinos.

"Luvas".

Ouçam. Esperamos que para vocês
isto seja um vislumbre do paraíso.

Um lugar para receber
as pessoas que adoramos.

Mas já chega de tagarelice.

O jantar será servido às 23h00 em ponto

e aconselho-vos a provar
os pastéis recheados com sardinha

criados pelo nosso chef, o senhor Ben.
É sensacional.

Entretanto, por favor, provem o mel.

É o melhor do mundo, de origem local.

E não se esqueçam dos figos,
que representam a vagina da mulher.

Ou assim nos disseram.

- Saúde.
- Saúde.

Dicky.

Olá, Tom.

Não o tinha visto.

Os rapazes não lhe deram uma bebida?

Biblioteca sem bebida não pode ser.

Não vi ninguém.

Talvez estejam a arranjar a codorniz.

Por falar nisso, trouxe alguma miúda?

As miúdas não me tocam, hoje em dia.

E os rapazes?

O Dally disse-me que tem mil namoradas.

Tenho três e todas me odeiam.

Devia ir à piscina. Já viu as russas?

Oh là là.

David, fala o Richard.

Onde raio te meteste com a Jo? Liga-me.

Quem é?

Um velho amigo.

É alcoólico.
Não devia tê-lo deixado conduzir.

- As pessoas perdem-se na viagem?
- Sempre.

Dizemos que faz parte do encanto.

Tem uma casa impressionante.

Tenho olho para a arte Islâmica,
trabalhei na Christie's.

Porque não vive aqui o ano inteiro?

Temos de envelhecer,
antes de viver no deserto.

O Dally ainda não está pronto. Eu estou.

Cretinos.

- Deduzo que não seja amiga da...
- Vim para fazer um artigo.

Mas, na verdade,
só estou aqui pela Leila Tarki.

Não faço ideia de quem seja.

Não conhece a Leila Tarki?

A autora marroquina?

Ela é muito fixe.

Ela só veio para angariar financiamento
para um filme.

Um filme?

Acerca de quê?

Nómadas.

Nómadas. Certo.

Pelo menos não é sobre refugiados.
Devemos estar gratos.

Os nómadas vão salvar-nos.

Vão?

Eles têm as ideias ambientais certas.

A Leila diz que eu pareço uma nómada.

Nós vínhamos a conduzir

e vimos um casal à beira da estrada.

Pensámos que tinham feito sexo.

Falam dos Henninger, o casal inglês?

Deduzo que sim.

Podiam ser bandidos,
disfarçados de ingleses.

Ou bandidos ingleses.

Desses não faltam,

da variedade traseira.

O senhor também é homossexual?

Não, não sou.

Mas fodi um homem que é.

Eles estavam a discutir?

Não sei, mas não estão aqui, pois não?

Obrigado, Dally. Amigos.

A vida é apenas um desporto ou passatempo,
como nos diz o Alcorão.

E, porque é apenas e só um jogo,

esquecemo-nos de que o propósito da vida
é a morte.

Por isso comam, bebam, sejam felizes,
pois amanhã morreremos.

Já está muito batido, meu amor.

O que acha dos uniformes?
Desenhei-os eu próprio.

Completamente autênticos.

São mesmo?

Sim, são.

- Até podiam ser estátuas.
- O que quer dizer com isso?

Que nome é esse, "Dally"?

É uma alcunha, senhora.

É um insulto ou um elogio?

Escolha à sua vontade.

O que foi?

Dicky.

Meu Deus.

Atropelaram-no na estrada.
É bastante confuso.

Confuso? Por que razão seria confuso?

Dizem que ele escavava fósseis
à beira da estrada.

Veio para a estrada
e bateram-lhe por acidente.

Mas nunca vimos vendedores de fósseis
naquela estrada à noite.

Ou durante o dia. É confuso por isso.

Alguém o reconhece?

Não, ele não é daqui. É do Sul.

E a tatuagem?

Um diamante.

É para proteger do mau-olhado.

Não resultou, pois não?

- Deitem-no num sítio qualquer.
- Na garagem?

Sim, na garagem. Boa ideia.

Os hóspedes não podem saber do corpo.
Era só o que nos faltava.

E limpamos o carro?

Não, temos de ligar para a polícia
em Taza.

Faróis e para-choques amachucados.

Deviam vir depressa.

Um acidente, dizem eles.

Acredita neles?

São convidados. Como posso não acreditar?

Mas acredita mesmo neles?

Acho que estão assustados.
E fazem-me pensar num provérbio.

Diga lá. Gosto de um bom provérbio.

Deseje o melhor...

... e espere o pior.

David.

Richard.

Como te sentes?

Acalorado.

É o Saara, velho amigo.

Eu sei que é a merda do Saara.

Estás vestido para jantar.

O mundo ainda é normal.

Vocês deviam trocar de roupa.
Os dois. Vistam-se.

Tomem um duche. Venham jantar.

A polícia chega dentro de uma hora.

Eu conheço o agente. Será uma formalidade.

Uma formalidade.

Como aconteceu?

Digam-me antes de falarmos à polícia.
Esclarecemos tudo.

Vínhamos a andar bem,
à procura do sinal para Azna.

E havia muita areia no ar,
soprada para a estrada.

Não conseguia ver.

Ele atravessou-se à nossa frente,

como se não percebesse
a velocidade de um carro.

O facto é que o atropelámos.

Nós atropelámo-lo e matámo-lo.

Bem, o mais importante é dizer a verdade,

cooperar com a polícia

e parecer esmagadoramente arrependido.

Podemos fazer isso, certo?

Se for absolutamente necessário.

David.

Coitado do miúdo.

Quando é que chega a polícia?

Chega quando chegar.

Chega quando chegar. Que merda de...

Isto é um desastre do caralho.

- Viste os bolsos?
- Sim, vazios.

Sem identificação ou dinheiro. Nada.

É invulgar um marroquino andar sem BI.

A quem o dizes.

Onde é que estão os cabrões?

A jantar. A desvalorizar as coisas.

Ele estava bêbedo?

Não sei.

Ele passou-lhe por cima.
Não lhe bateu apenas, certo?

Estou certo?

O que fazemos?

Quero dizer, tu ligaste para a polícia.

Isto vai ser um circo.

O que sugerias que fizéssemos?

Resolver isto hoje. Suborná-los.

Têm de descobrir quem é ele.

Se descobrirem, as coisas talvez mudem.

Jesus.

Estás a brincar?

Não temos de nos preocupar.

- O que aconteceu é óbvio.
- Ai é?

Eu não acho nada óbvio.

Acho que o seboso esconde alguma coisa.
Se eles puderem, fodem-nos.

- Quem?
- Os marroquinos!

A família vai aparecer
e eles vão foder-nos!

Dirão que os infiéis lhes mataram o filho.

O que será verdade.

Estávamos a dizer
que podiam ter tido um acidente.

Um pneu furado.

As pessoas furam sempre os pneus
no deserto.

Todos nós sentimos pena de vocês.

Um pneu furado de noite.

Que chatice. Foi isso?

Não vê que eles querem comer?

Não faz mal.
Só precisamos de tempo para recuperar.

As pessoas desaparecem, aqui.

Esfumam-se.

Os árabes incomodaram-vos?

Desculpe, não vi o seu...

Enchanté.

Ela é uma nómada.

Passaram por Beni Mellal?

Viemos por Midelt.
É uma estrada diferente.

- Perderam-se?
- Nós não nos perdemos.

Foi apenas uma viagem longa e difícil.

- É a estrada que todos usámos.
- Sim, mas não a conhecíamos.

Não conhecíamos o desvio.

Então, não foi um pneu furado.

Estavam apenas perdidos.

Não propriamente.

Atropelámos um marroquino na estrada
e matámo-lo.

Foi um acidente.

Ele apareceu à nossa frente.

Penso que vos chamaram.

Não percebo porque fizeste aquilo.

Foi para me humilhar?

Não podemos fingir sempre.
Mentir para quê?

Mas a culpa não foi nossa.

Não deves esperar que eu seja prejudicado

só porque um assaltante
decidiu alvejar-nos.

- Assaltante.
- Sim, assaltante.

Não andas atenta às notícias. Eu ando.

Tem um consultório em Chelsea,
Sr. Henninger.

Sim, isso é... Sim.

E a senhora?

Escreve livros para crianças, creio eu?

Receio que não muito bem-sucedidos,
Capitão.

Eu sei que está a ser humilde.

Sugere-me um livro seu
para os meus filhos?

O último chamava-se O Soninho do Baltazar.

É um bocadinho pretensioso.

Mas é encantador.

Não acha, Sr. Galloway?

Encantador.

Este homem que mataram.

Rapaz, devo dizer.

Era vendedor de fósseis.

Sim, mas quero dizer...

Claramente não estava interessado
em vender-nos fósseis.

Como poderia estar?

A esta hora da noite.

Onde o Diabo perdeu a mãe.

Este povo está desesperado, Sr. Henninger.

Fariam quase tudo
para vender um só fóssil.

Para eles, 40 euros é uma boa quantia.

Estou a par. Eu sei que eles são pobres.

Lamentamos imenso tudo isto, Capitão.

Estamos desolados, para ser sincera.

Sim, desolados.

Eu sei que estão.

A propósito, estava a pensar...

De certeza que era o único rapaz?

Costumam andar aos pares.

Sim, um rapaz.

- Têm a certeza?
- Sim, temos a certeza.

Certo. Registaremos a ocorrência
como uma morte acidental.

Levam o cadáver convosco?

Não podemos.
Não temos morgue na nossa esquadra.

Teremos de tratar disso amanhã.

Espero que aproveite o resto
do fim de semana, Sr. Galloway.

Os cospe-fogos de Taza chegam amanhã.

Esplêndido.

O que pensamos dos Henninger?

Ela é porreira.

Já ele, não sei.

Um burguês típico.

O que estás a fazer?

A pisar os losangos.

É tabu.

- Espero irritar os génios.
- Credo, David.

Odeio esta falsa aparência étnica
e fingimento.

Pode-se tratar bem as pessoas
sem cobrir tudo de tapetes.

Que foleirada.

Uma bebida a sério?

O chocolate-quente é bom.

Aqueles cães não me agradam.
Deviam afugentá-los.

Acho que são camelos.
Ouvi um dos empregados...

Empregados? Criados, queres dizer?

Como queiras.

Ainda assim, deviam afugentá-los.

Os camelos mordem.

Mordem mesmo.

Gostam de morder as pessoas na barriga.

É a principal causa de morte dos árabes.

A polícia não fará nada.

E o que espera que façam?

Ouvi um dos rapazes a dizer
que ele tinha as pernas esmagadas.

- O morto.
- Esmagadas?

Não o atingiram, apenas.

Passaram por cima dele.
Talvez mais que uma vez.

Tretas.

Que nome lhe dão, no seu país?

Há palavra para isso?

Atropelamento.

Acho que devíamos ir dormir.

Porquê?

Estou finalmente a descontrair.

Amanhecerá daqui a umas horas
e eu quero recuperar.

Eles não voltarão. Os polícias.

O Richard subornou-os?

Sim, possivelmente.

É uma trabalheira, para eles.
Envolve tanta burocracia.

E, detesto dizê-lo...

Não detestas nada.

Detesto dizê-lo,
mas o puto é um zé-ninguém.

É de uma aldeia distante
e ninguém sabe quem ele é.

Sem BI nem testemunhas.

Então, é tudo.

É tudo.

Foda-se, onde estou eu?

SELEÇÃO DE SABONETES FEITOS À MÃO

ANDRÉ GIDE
O IMORALISTA

Bom dia.

Esqueceu-se do mel.

Senhora?

Esqueça.

Sabe onde está o meu marido?

A andar a cavalo.

A andar a cavalo.

Já vos disse o quanto admiro
as vossas botas, senhoras?

São boas para alguém agarrar, certo?

Se tiver oportunidade.

Já lhe disse como o acho repugnante,
Sr. Henninger?

Não, não o mencionou.

E, se vai insultar-me, trate-me por David.

Até lhe dava um açoite,
mas sei que ia gostar.

Gostaria certamente.

Devo dizer que estou a adorar
este ménage à trois.

Bastante pitoresco, digo eu,
de uma maneira banal.

O que trouxe o Richard e o Dally até cá?

Os gays vêm sempre para o Norte de África,
normalmente para enrabar putos árabes.

- É uma tradição Eduardiana.
- Mon Dieu.

Que coisa ofensiva para se dizer.

Interessante. Disse ofensiva e não falsa.

Pensei que o Richard fosse seu amigo.

E é. Eu falava em termos históricos.

Oscar Wilde, André Gide,

Joe Orton, Allen Ginsberg,
William Burroughs...

Podia continuar eternamente.

Pederastas, todos eles.

Gosta de arranjar merda, não é, David?

Bem, ajuda a passar o tempo
neste mundo cada vez mais entediante.

Disse ao Richard...

Foda-se!

Cabrõezinhos.

Meu Deus.

Bonito chapéu.

Comprei-o em Casablanca.

"Fabricado na China."

O que foi fazer a Casablanca?

Joguei ténis de mesa com uma puta,
no Hotel Tahiti.

Já ouvi falar desse ténis de mesa.

Sou irresistível para as putas.
Sabe porquê?

Porque cheira a dinheiro?

Ela fez sexo anal?

De que serve uma puta, se não fizer anal?

Vou queixar-me à sua mãe que disse isso.

A minha mãe ficaria fascinada.

Já tinha cá estado?

Nós nunca viajamos.

O David está sempre a trabalhar.

Os pacientes dele são velhos ricos

que o chateiam dia e noite
sem dó nem piedade.

É um lugar estranho
para uma casa de férias.

É como se eles vivessem
uma fantasia qualquer.

Eu gosto deste lugar.

Parece ser um país onde um inútil
pode ser feliz.

E você é um homem inútil?

Eu sigo o caminho de Buda.

É bom saber que existem
outras pessoas inúteis no mundo.

Além de mim.

Devíamos sair do sol.

Antes de sangrar.

Eu não sangro com facilidade.

Nós cavalgávamos no trilho
e eles esperavam-nos.

Podia ter sido mau.

Podia ter sido? Foi mau. Cabrãozinho.

Sempre disse que é um povo irracional.

Não gostaram de me ver no cavalo.
Eu estava a gostar.

Estavas?

Isso não interessa.

Será ilegal descontrair
após um evento traumático?

Dá cá.

Miúdos do outro lado
do vale, aparentemente.

Toda a gente já sabe.

Sabe o quê?

O acidente, o que te parece?

Dá cá isso.

São bisbilhoteiros do pior.

Faz parte de se ser analfabeto.

Tornaste-te um belo fascistazinho,
desde que foste apedrejado.

É só o que basta?

Eles podiam ter-me cegado.

Podiam ter-me desfigurado.

Eles vêm nesta direção.

Não é a polícia.
Não temos novidades deles.

- Fornecedores de hortelã?
- Vieram hoje de manhã.

- Talvez alguém da morgue.
- Eles têm morgues?

Não jogam o corpo para um buraco?

Há uma morgue em Errachidia.
Talvez sejam eles.

Quem me dera que não tivesses
convidado os Henninger.

São uma seca e fizeram esta asneira.

- Viste os sapatos dele?
- Seca?

São uma grande seca.

Garanto que hoje não se disfarçarão.

Vão culpar o stress pós-traumático.

Estou certo de que terão isso.

Admite, querido. Piratas.

Um pouco brega, da merda dos anos 80.

- Ignoras sempre as minhas ideias.
- Não combinam com a estética.

Ignoras sempre as minhas ideias.

E não são "piratas".

São corsários e pegas
e espadachins sensuais.

Está bem.

Desde que não acabem por saquear
um dos meus quadros.

Tu tinhas razão.

Devia ter convidado os Bainbridge.

Sim, costumam ser excêntricos.

E não matam pessoas na viagem.

Sou Abdellah Taheri dos Aït Kebash.

Vim para levar o meu filho.

Pode abrir o portão?

Sou Abdellah Taheri dos Aït Kebash.

Vim para levar o meu filho.

Pode abrir o portão?

É o pai?

Vai deixá-lo ali o dia inteiro?

Eles são Aït Kebash.

Então...

Ele tentará extorquir-lhe dinheiro.

Onde vivem os Aït Kebash?

Num lugar muito remoto.

- Então, vieram de longe. Abra o portão.
- Vão chantageá-lo.

O povo do deserto sabe tudo.

Não. Apenas assume o pior,

o que lhe dá razão nove vezes em dez.

Que a paz esteja sobre vós, senhor.

E sobre vós a paz.

De onde veio?

Tafal'aalt.

Fica para lá da cidade de fósseis
de Alnif.

Perto da montanha de Issomour.

Lamento imenso pelo seu filho.

Como se chamava o rapaz?

Driss.

Era o meu único filho.

Que Alá tenha misericórdia.

Alá assim o quis.

O que foi?

Disse que o inglês deve pagar.

Vá-se foder.

Paga ao velho. Fá-lo ir embora.

Não pagamos a alguém por um acidente.

Nem sabes quanto ele quer.
Pode ser só mil euros.

- Ou mais.
- Para nós, é pouco.

É chantagem.

E se for?
Como dirão chantagem na língua deles?

Se é que a palavra existe.

Achas que os aldeões no Saara,
na merda, pensam como nós?

É o princípio da coisa.

É o princípio da coisa e mais mil euros.

Parece um bom negócio,
pelo custo de uma vida.

- Eu sei quando me roubam.
- Não é roubado.

Estás a ser poupado.

Porquê? O que vão fazer-me?

Linchar-me?

Castração pública?

Não pensei num linchamento.

E não pensei que te cortassem o piço.

Pensei que não iriam embora.

Claro, o teu maravilhoso fim de semana.

Não podemos esquecer a tua festa.

E se contactássemos o consulado,
em Casablanca?

Acho que não estão a considerar
os vossos interesses.

Se contactássemos o consulado,
investigariam isto com minúcia.

E sublinho "com minúcia".
Acho que não quererias isso.

- Eu até gostaria que...
- Não, David.

Acho que não gostarias.

- Tudo bem. Eu vou.
- Não.

- Quero dar os meus pêsames.
- Não.

Isso está fora de questão.

Tu conheces esta gente.

Seria tudo muito mais embaraçoso.

E nós não queremos que seja embaraçoso.

Vejo que o Lorde Swanthorne chegou.

Conhece-lo?

Do clube.

Um perfeito parasita,
mas divertido à sua maneira.

- Como vai o ofício?
- Não muito bem.

Há escassez de cancros de pele em Londres?

Fui processado por uma paciente.

Uma velhota de Chiswick.

Custou-me couro e cabelo.

Credo. Não soube de nada.

Pois não.

A vida é minha. Se correr mal,
prefiro que seja em privado.

O que aconteceu?

Um erro forense.

Não identificaram bem os tumores.

Erro humano.

E a senhora de idade...

Está a morrer.

Lamento.

Então, também lhe custou couro e cabelo.

O velho não deve falar inglês.

Sabes falar francês?

Claro que sei falar francês.

Estás pronto para isto?

Vai à frente.

Este é o condutor de ontem.

Ele diz que foi um acidente.

Quer conversar com ele?

Eu traduzo.

Não.

Eu falo consigo.

Ele diz que fala comigo.

Talvez por não serem crentes.

- Pois.
- Tudo bem.

Força.

O inglês deve regressar connosco,
a Tafal'aalt, para sepultar o meu filho.

É justo e adequado
que o responsável pela sua morte o faça.

É a tradição.

Estou certo de que o inglês concordará,

sendo o homem de honra
que ele tão obviamente é.

Ele quer que volte com ele
e enterre o rapaz.

Que merda é essa?

Se for um homem honrado, fá-lo-á.

É a tradição, por aqui.

É a tradição nestas paragens?

Eu não conheço esta gente. São Berberes.

Se dizem ser a sua tradição,
devo acreditar neles.

Ele falou em dinheiro?

Não, mas estará implícito.
Não falamos de tais coisas.

O David tem de saber a quantia.

Não posso perguntar-lhe isso.

O Sr. David que leve uma certa quantia.

O Sr. David não concordou com este plano.

Voltar com ele, para a aldeia dele?
Estão doidos?

Talvez não tenha outra escolha.

Ele não está a convidá-lo.

Ele está a ser educado,
mas julgo que irá insistir.

Passar a noite na aldeia
e prestar homenagem

será mais fácil
do que qualquer outra coisa.

Voltarias em dois dias.

Já te ocorreu, Dicky,

que ele possa estar a planear algo pior
do que tudo o que possas pensar,

visto que ele acha
que eu matei o filho dele?

Está a exagerar, senhor.

É? Estarei?

Sim, estás.

Eles não farão nada. Têm medo da polícia.

Tanto quanto sei,
podem ser do Estado Islâmico.

É sempre assim tão paranoico?

Não o ouvi a oferecer-se, Ianque.

Porque não fui eu matá-lo.

Bem, eu não o matei.
Ele atravessou-se à minha frente.

Ele chamava-se Driss.

Sim, eu...

Driss.

Driss, certo.

O que importa? De uma forma ou de outra,

toda a gente acha que eu sou culpado.

Que fim de semana alegre se tornou este.

Quando partimos?

Tout de suite.

Como correu?

O Dicky e o criado árabe

congeminaram uma ideia maravilhosa.

Terei de regressar com o velho
para a aldeia dele,

onde o Diabo perdeu a mãe, e penitenciar.

- Foda-se. Podem ser do Estado Islâmico.
- Foi o que eu disse.

Não correu muito bem.

Tive de apaziguar as coisas.

O que lhes disseste?

Concordei ir.

Todos parecem pensar
que é a única solução.

Os nómadas podem irritar-se.

Como é que ele estava, o pai?

Insondável.

És apenas tu que tens de ir?

Apenas eu.

Devem estar com receio
que te apareça o período.

O homem perdeu o filho, David.

Decerto devem ter os seus rituais,
como todos nós.

Talvez seja uma boa ideia.

Não queremos que a polícia regresse,
a espiolhar tudo.

Não, suponho que não queremos.

Recordo-te, Jo,
que entraste no carro com um bêbedo,

o que te torna cúmplice
antes e após o facto consumado.

Engraçado.

Como se não fosse cúmplice há muito tempo.

Certamente o Richard não te deixaria ir,
se houvesse risco.

Há de correr tudo bem.

Um passeio no deserto.

Talvez até me divirta, quem sabe?

Ele só deve querer concluir o assunto.

É o que as pessoas querem, hoje em dia.

É como ir ao programa da Oprah.

Que referência desatualizada.

Foi? Lamento, peço desculpa.

- Sabes que é isso que o pai quer?
- O quê?

Quer que tu peças desculpa,
que digas que lamentas.

Então, eu digo.

E lamentas?

Eu direi que lamento.

Merda. Esqueci-me.

O que levas na mala?

Uma muda de camisa, peúgas e cuecas.

Parece que vou para o internato.

Talvez vá precisar das cuecas limpas.

O prostituto disse uma piada.

Calminha... Dinheiro?

Mil euros.

Não recebem mais que isso.

Tem cuidado, desajeitado.

Certo. Lembra-te, David,
não podes mostrar medo

ou falta de à-vontade com eles.
Mostra-te indiferente.

Vou tentar lembrar-me disso.

Conto que um deles te dê boleia, depois.

Se não o fizerem,
liga e pensamos em alguma coisa.

Tens o telemóvel?

Funcionará por lá?

Claro que sim.

Avisa-me que estás bem.

Boa sorte, meu velho.

Pobre coitado.

Serão dois dias difíceis.

Será certamente uma experiência, para ele.

Ligarei daqui a umas horas.

Para garantir que não o violaram.

Richard...

Estou a brincar.

O que foi?

És terrível!

Cautela e canja de galinha
nunca fizeram mal a ninguém.

Quer um cigarro?

Francês. Não é merda marroquina.

Não.

Obrigado.

A sua esposa é linda.

Um dia, terei uma gazela como aquela.

Você não se parece com um pirata.

Supostamente, sou o Dioniso.

Nenhum destes analfabetos sabe quem é.

Deus da bebida, drogas e loucura.

Então, há uma que sabe.

O que mais devia eu saber?

Uma vez ele foi raptado por piratas,
daí a referência.

Surgiu um culto em seu redor.

Diziam que os seguidores eram canibais.

Comeram a sua carne
e beberam o seu sangue.

Não, deve estar a pensar nos Católicos.

Não devia ter uma toga vestida?

Há o entrar no espírito da coisa
e há o exagero.

O fato de pirata não me dizia nada.

Parecia o Johnny Depp.

Um Johnny Depp mais jeitoso
e menos inchado, obviamente.

Obviamente.

O Dicky disse que era escritora.

Não tenho tanta certeza.

Não escrevo uma palavra há oito anos

e todos os meus livros foram esquecidos
pelas débeis crianças do mundo.

Isso não a incomoda?

É um alívio.

Julgo que todas as carreiras artísticas
têm momentos de visibilidade,

seguidos de uma descida longa e dolorosa
até ao anonimato total.

Decerto que algumas crianças do futuro

irão pegar num livro seu
e salvá-la do esquecimento.

Ninguém irá ler livros daqui a 50 anos,
quanto mais mil.

E as crianças do futuro
serão palhaços de cabeça oca,

tal como as crianças do presente.

Eu arrisco-me a dizer que não tem filhos.

E você? Não sobre filhos,
mas o seu trabalho?

Sou analista financeiro.

O que faz realmente um analista financeiro
se realmente fizer alguma coisa?

Nós compramos, nós vendemos...

E mais ou menos em cada dez anos
enganam-se redondamente.

Acho que tem razão.

- Parece ser divertido.
- E é.

Estamos perto de Erfoud,

o maior oásis no Norte de África.

A família real de Marrocos é daqui.

Sou um grande fã da realeza, sempre fui.

Príncipe André, Mohammed bin Salman,
tudo pessoas maravilhosas.

Nós iremos para o hotel.

Disse que vamos para o hotel.

Ninguém conduz até Alnif de noite.

Acredito em si.

Não te preocupes, querida. Ele está bem.

Ele deve estar a fumar um charro
com os Aït Kebash.

Eles são incorrigíveis.
Ele vai estar sempre ganzado.

Para ti, é fácil.

Não estás a ir para um sítio
que não consegues pronunciar.

Sabes onde fica, no mapa?

Quero lá saber onde fica no mapa.

Ele que se foda. Estragou-me a noite.

Não amues, querido.

Amanhã faremos um banquete para compensar.

Na escola que frequentei com o David,

circulava uma história,

o lendário incidente do Dia dos Pais.

Um dos rapazes começou a atirar ratos,

do telhado, para os professores em baixo.

Mas cada rato estava equipado
com um pequeno paraquedas

decorado com uma suástica.

Os paraquedas não funcionaram, obviamente.

Os ratos foram atirados
para a morte contra as lajes

com as suásticas a cobri-los.

Isso é horrível.

Por que razão fariam isso?

As crianças não conhecem
os princípios da aerodinâmica.

Não, refiro-me às suásticas.

O miúdo devia identificar os professores
como nazis.

Ou então gostava de suásticas.

Reza a história que foi o David.

Não... Isso é verdade?

Não posso confirmar.

Foi antes do meu tempo.

Mas ouvi dizer que foi vergastado.

Deixaram-no todo negro.

Ouve, vais passar o fim de semana triste

ou vais divertir-te?

Divertires-te não é crime, sabes.

Acho que posso fazer o esforço.

Linda menina!

O que está a fazer?

É mais apropriado.
Por favor, o senhor decerto compreende.

Eu peço-lhe uma cola.

Há um quarto no piso de cima
onde pode dormir.

Levantamo-nos às cinco. Eu irei chamá-lo.

Bem-vindo, senhor.

Boa noite.

Veja. É barato. Autêntico.

Não, merci.

Veja.

Autêntico.

- Não.
- Meu senhor.

Por favor! Faço um preço especial!

Dez dirhams.

Volte! É barato!

Volte! É para si!

Que merda.

O número para o qual tentou ligar
não está disponível.

Eu sabia.

Todos os que estão vivos agora...

... todos os que sobreviveram,

todos nós fizemos coisas do pior.

Mentiroso.

Cristo.

Ouvi dizer que ontem houve um acidente.

Ficou alguém ferido?

Um amigo meu de Londres
perdeu-se no caminho, o David Henninger.

Então era ele.
Bem me pareceu reconhecê-lo.

Um dos árabes atravessou-se à frente dele.

Foi-se.

E onde está o Henninger?

Mandámo-lo para o deserto para morrer.

- Conseguiu dormir?
- Eventualmente.

E sonhou?

Não. Quero dizer... Não me lembro.

- Eu tive um sonho muito estranho.
- Sim?

Sonhei que eu era... uma borboleta.

Como é que sabe que não é uma borboleta...

... a sonhar que é um homem?

Agrada-me.

Não é da minha autoria.
Foi um tipo chinês que o disse.

Sim?

Senhora. O Sr. Day enviou um cartão.

Pode deixá-lo na mesa.

O Sr. Day mandou aguardar a resposta.

- A sério?
- Sim, senhora.

Pode tratar-me por "Menina".

"Cara Jo,
Tem uma ressaca horrível como eu?

Recomendo ovo cru. Venha cá.
O seu amigo, Dioníso (bem escrito?)"

Papaias ao pequeno-almoço.
Como raio conseguem?

Para quê ter contactos no Min. do Interior
se não conseguir papaia fresca?

O que aconteceu ao ovo cru?

Não o aguentei.

Melhora a libido.

A minha libido está bem, Sra. Henninger.

Hoje há um piquenique. Nós devíamos ir.

"Nós" devíamos ir?

Ouvi dizer que o seu marido se ausentou.

Só estou a oferecer os meus serviços
de acompanhante.

Que galante da sua parte.

É um oásis qualquer.

Talvez haja uma cascata.

Todos gostam de cascatas.

E isso envolveria nadar, deduzo?

Espero que sim.

Os voyeurs entre nós
querem vê-la de fato de banho.

Não foi muito subtil.

Sou de Nova Iorque,
a subtileza dá direito a multa.

Não vou multá-lo.
Talvez um castigo corporal.

Castigo corporal?

Agora começo a sentir
uma vaga expressão de interesse.

Vaga expressão?

Preciso de algo mais concreto
que "vaga expressão".

Eu falo com uns. Esses falam com outros.

Logo damos uma resposta.

E assim fiquei,
à espera de uma aquisição hostil.

Soube que levaram o infiel
para o Tafilalet. É verdade?

Sim, para Tafal'aalt.

Vão cortar-lhe os dedos, um de cada vez.

Vão cortar-lhes os pés, cozê-los
e comê-los com as cabras.

Ele vai ficar delicioso.

Vão cortar-lhe a língua, no mínimo.

Foi um gesto nobre.

Ele não tinha de ir.

Orthoceras.

Ele diz que você não pode beber
da mesma chávena.

Não pode comer do mesmo prato.

Ele diz que as sombras
não se devem cruzar.

Isso é costume?

Não, agora é como ele diz.

Há de passar.

Tudo bem.

Será enviado para a Noruega.
Uma mesa de centro.

É incrível que os homens ricos
colecionem tais coisas.

Os homens ricos colecionam
muitas merdas estúpidas.

A remodelação de uma só casa de banho
alimenta uma aldeia por um ano.

Nós pescamos no deserto
e os fósseis são o nosso peixe.

É uma anedota.
Deus pregou-nos uma partida.

Dá-lhe vontade de rir?

Não, de todo.

- Fá-lo rir?
- Não.

A mim faz-me rir.

Em breve, não restará nada.

Nem pessoas nem árvores. Somos os últimos.

Temos fósseis e as nossas crianças.

E nada mais.

O Estado Islâmico controla
esta parte do deserto.

Isso é animador de se ouvir.

Maravilhoso.

Contornaremos Issimour
para chegar a Tafal'aalt.

Iremos por trás.

Porquê por trás?

Por escolha do velho.

Irá acrescentar horas à viagem.

Não diria tanto tempo.

Chegaremos em breve.

Porque olha para o relógio?

Não sei.

Não sei.

O que foi?

Era o seu único rapaz.

Era filho único.

Bem, o mundo é um lugar horrível,
como dizia o meu pai.

E o melhor que podemos fazer
é brincar com a situação.

Este é o meu melhor Buster Keaton.

Isto é ele quando era novo.

E assim é velho.

Vê a diferença?

Dizem que você organiza
as melhores festas.

Correção.

As melhores festas no Norte de África.

Já chega?

Está feito.

Dally.

Chama-los a todos?

Quanto mais depressa chegarmos, melhor.
Está muito calor.

Hora do oásis.

- Dicky.
- Querido.

Em carne e osso.

Sabes, eu e o Dally vimos aqui
quase todos os dias

e lembro-me sempre
porque não estou em Londres.

E cantas para Pã, enquanto te passeias?

E outros deuses também.

Mammon? Ele era um deus.

Os Fenícios não vieram
tão a ocidente, Tom.

Claro, os Fenícios.

Sou tão estúpido.

Anormal.

Já lhe disse que tenho uma casa em Bali?

E tem um Kandinsky, certo?

Sim, parece uma frase de engate.

O que mais lhe agrada em Bali?

O clima quente.

Restaurantes baratos.

Pensei que o Mick Jagger vivesse lá
e vim a descobrir que não.

Namorada?

Em Bali, não.

Achava que todos os brancos
tinham miúda na Ásia.

Eu não.

De certeza que tem as suas galdérias.

Está a ser demasiado crítica,
quanto a mim e às galdérias.

Não estou a julgar.
Os homens precisam de galdérias.

Eu acho que as mulheres
precisam de ser galdérias.

Caso contrário, não se orientam,
exceto quando estão bêbedas, claro.

Talvez o senhor não saiba pedir.

Eu, pessoalmente?

Sim, você, pessoalmente.

Esqueceu-se do meu marido.

Sim, esqueci-me.

E você também.

Aquela era a mãe?

Não. Ela morreu há muitos anos.

Tias e prima.

Este é o quarto do Driss.

Não há outro quarto onde possa dormir.

Abdellah quer que sinta o espírito dele.

Ele acha mais apropriado.

Vou ao enterro.

Abdellah quer que eu...

Não.

Enquanto não estou, tranque a porta.

O quê?

As mulheres. Sofrimento.

COMPRADOR EUA

Um Dalek.

Diz-lhe. Ele só quer saber
o que aconteceu.

Eu estive sempre com o Driss.
Levámos a trilobite.

Pensámos que podíamos vendê-la.

Porque estavam na estrada tão tarde?

Nós ouvimos que havia uma grande festa
na casa dos maricas.

Imensos estrangeiros ricos a passar.

Então, os estrangeiros passaram de carro.
E depois?

O Driss foi ter com eles.

Mas ele cometeu um erro.

O homem não parou.

O homem viu-te?

Não.

O que fizeste?

E depois, o que aconteceu?

O homem procurou nos bolsos do Driss

e encontrou o BI dele.

E depois o que fez?

Ele enterrou o bilhete de identidade.

Que merda estás a fazer?

Claro que enterrou.

Os homens agem sempre desta forma.

Eles acham que Deus é cego.

E tu? O que fizeste?

Eu fugi. Estava assustado.

Fugiste enquanto o Driss estava no chão?

Ele estava morto. Não havia nada...

Cão!

Estúpido patético!

Escumalha!

Já chega.

Onde está a minha arma?

O Driss roubou a trilobite e a minha arma.

O que farás por mim, quando te pedir?

Qualquer coisa.

O que farás por mim, quando for tempo?

Qualquer coisa!

Tudo deve ser julgado, por Deus.

Tudo deve ser julgado.

Tem fome?

Que carne é esta?

De cabra.

É boa.

É fresca.

Abdellah matou o animal
há apenas uma hora.

Os escavadores estão a voltar da montanha.

Voltam de noite,

quando já não veem o que fazem.

Então, trabalham de sol a sol.

É uma expressão bonita,
até pensarmos no seu significado.

Porque concordou vir até aqui, David?

Não sei. Presumo que...

Presumo que quisesse encarar o problema
e pôr uma pedra sobre este assunto.

Abdellah virá em breve
para conversar consigo.

Ele vai trazer uma faca?

Não fazia isto há anos.

Isso é branca de Marselha.

Para mim, é uma droga aborrecida.

Consumi imensa com o John Paul Getty

ou o velho "desorelhado",
como lhe chamava.

Agora só o faço porque a Maribel insiste.

Que mentiroso!

Estás toda boa hoje, a propósito.

Isso é a branca a falar.

Acho que é bom teres tempo para ti, Jo.

Acho que precisavas.

Era bom que não estivesse tão preocupada.

Sabes que nunca serás aceite aqui,
não sabes, Dicky?

Sendo infiel e tudo isso.

Porque têm de aceitá-lo?

Têm tudo para odiá-los.

Diria que têm mais razões
para te odiar a ti.

A França tem uma excelente relação
com os árabes.

Partilhamos o Mediterrâneo com eles.

Mas tu não compreenderias.

Eu compreendo.

Têm-nos nos guetos e sentem-se próximos,
mas sentem o mesmo

quando queimam carros nos subúrbios
e pilham as vossas sinagogas?

Isso é apenas, como se diz,
um problème social?

Não, eles detestam-vos
pela mesma razão que nos odeiam.

Não somos Muçulmanos e mandamos neles.

Vai contra a ordem natural das coisas,

ou seja, eles serem superiores a nós.

Eu não os levo a mal.

São imperialistas rivais.

Nos EUA,
os Muçulmanos são pacíficos e prósperos.

Não passam a vida em motins
e a atirar coisas a carros da polícia.

Como é que só o fazem em França?

Deve ser por... Como se diz... Solidarité.

Vocês matam centenas de milhares
no Iraque e Afeganistão...

Não é verdade, querida.

São os Mujahidin.

Pronto.

Ouça, querida.

Já sabemos que, na dúvida,
há que culpar os americanos.

- Se não nos culpassem, sentíamos falta.
- Somos masoquistas.

Até gostamos.
Sentimo-nos mais importantes do que somos.

Se nos culpassem menos,
seríamos mais humildes.

Não pensaríamos
que o mundo gira à nossa volta.

Não acredito em si.

Vocês acham sempre
que o mundo gira à vossa volta.

Americanos do caralho!

O que acha, Hamid?

Mais dano faz a língua
que o braço, senhor.

Foda-se.

É boa?

É uma maçã.

O senhor fala inglês.

Parece que fiz figura de parvo.

Quero mostrar-lhe uma coisa.

O fóssil que o Driss levava
quando foi atingido pelo seu carro.

Foi recuperado pela polícia.

Eles devolveram-mo porque é muito valioso.

Chama-se um Elvis.

Um Elvis?

Apenas três espécimes
foram encontrados no Saara

e os negociantes decidiram
dar-lhe o nome Elvis

porque é uma superestrela.

O Driss roubou-mo.

Isto está sempre a acontecer.

Os jovens rapazes estão frustrados.

Eles sentem que não vão a lugar algum.

E não têm esperança.

Eles não querem ser escavadores
a vida inteira.

Eles não querem viver como os seus pais.

Eles querem fugir.

Por isso roubam um Elvis,

que sabem que se vende por 10 mil dólares
nos Estados Unidos.

Se o conseguirem vender a um estrangeiro
por mil euros...

... podem ir para Casablanca,

começar uma vida nova
ou simplesmente encontrar uma mulher.

Casablanca está cheia de mulheres fáceis.

E mil euros dá para muita coisa,
com uma mulher fácil.

Não me importei quando descobri
que o Driss mo tinha roubado.

Eu compreendi-o.

De certa forma, eu desejei-lhe boa sorte.

Afinal de contas, é só um fóssil.

Um pedaço de pedra, literalmente.

Se ele lho tivesse vendido
por umas centenas de euros...

... eu teria ficado feliz por ele.

Muito feliz.

Quão melhor teria sido

se você tivesse parado
e comprado o raio do fóssil.

O senhor estaria agora em Azna

a beber coquetéis com a sua esposa.

E Driss estaria em Casablanca
nos braços de uma mulher fácil.

Lamento aquilo que aconteceu.

Lamento muito.

Mas foi um horrível acidente.

Eu não faço ideia por que razão as pessoas
desejam tanto estas pedras estúpidas.

O que é que vocês veem nelas?

Tudo o que sabemos é que vocês as querem
e estão prontos a pagar por elas.

Alguns de nós acreditam

que estas são as criaturas mais maléficas
que alguma vez existiram.

Que são as formas de demónios mortos.

Tem de admitir que é isso que parecem ser.

Devem ter uma influência
nas nossas cabeças.

Uma influência que é maligna.

E é isso que vos atrai para eles.

É tudo um mistério.

Driss levou o meu Elvis e fugiu...

... e a próxima pessoa que ele viu
foi o senhor.

Tiram-me este cabrão de cima de mim?

Um dia espero conseguir um emprego
no Hotel Intercontinental em Casablanca.

Ou talvez no Dubai.

Serei responsável por um andar
de pessoas decentes e respeitáveis.

Cada um tem os seus sonhos.

É assim que abre uma garrafa de champanhe.

Agarre-a com firmeza pela base,

gire a garrafa, não a rolha.

Tinto é agarrado pelo gargalo,
uma mulher pela cintura

e uma garrafa de champanhe pelo derrière.

Mark Twain, muito bem.

Essas prioridades
podem ser revistas mais tarde.

Apraz-me ouvir isso.

Sinto que fui falso consigo, em parte.

A desempenhar um papel. Isto não sou eu.

Eu também não.

Sabe...

Não queria conhecer uma mulher casada,

porque achei que ela seria repentina e...

Temos a nossa utilidade, não?

Uma mulher sem discrição é como
uma argola de ouro no focinho de um porco.

Devias ter uma conta no Twitter.

Olá?

Olá?

Bom dia.

Não adianta fugir.

Sabe bem que estou aqui
para impedi-lo de fugir.

Lamento, não falo árabe.

Ou tamazigue,
suponho que seja esse o dialeto.

Ele está à sua procura.

Vejo que veio dar uma caminhada.

Claro que reparou que não tem como fugir
nem onde se esconder.

Eu não tentava fugir nem esconder-me.

As minhas coisas estão...

Anouar irá levá-lo de volta a Azna.

Aqui estás tu.

Ainda é cedo para isso.

Eu ainda não me deitei.

É o que a branca nos faz.

Estiveste a nadar?

Sinto-me rejuvenescida.

Tão desperta que sou um perigo.

Aproveita. Não dura para sempre.

O que mais perdi?

Fui emboscada por um deus grego.

O que significa isso, ao certo?

Significa que eu cometi adultério
com um homem ridículo,

como fazem todas as mulheres.

Sim, sabe-se que tais coisas acontecem.

Não a mim.

Fico contente.

Não me refiro ao Tom.

Refiro-me a ti.
Tiraste o David do pedestal.

Isso é bom, não é?

Eu não pensei no David.

Eu pensei apenas em mim, para variar.

Vais divorciar-te dele?

Acho que tenho de fazê-lo.

Talvez seja o melhor.

Não me pareceram felizes.

Não parecias ser tu.

Acho que éramos um casal óbvio.

Os casais não são todos óbvios, no fim?

Afinal de contas, foram 12 anos.

Doze anos.

Não parecem muitos,
quando o dizemos rapidamente.

Eu estava a pensar
que nada disto teria acontecido,

se não tivéssemos matado aquele rapaz.

Teríamos seguido em frente.

O Driss?

O rapaz chamava-se Driss.

Mas tu já sabias.

Driss Taheri.

O que fizeram ao BI? Enterraram-no?

David, que merda estás a fazer?

Que merda estás a fazer?

Isso faz parte do passado.

O importante é o presente, não é?

Que cereais come de manhã?

Eu não tomo pequeno-almoço.

Normalmente, estou de ressaca.

Eu prefiro flocos de milho.

Foi uma coisa boa que vocês nos deram,
para além do gelo.

Ainda bem que gosta de gelo.

Gosto de tudo o que seja frio,
gelado e fresco.

Acha que gosto de viver nesta fornalha?

Acha que gosto dos camelos, das palmeiras

e dos 40 ºC todas as manhãs?

Acha?

Não, de todo.

Sonho muito com a Suécia.

A Suécia?

Sim.

Vi numa revista a cores.

Pelo que parece, é um lugar fantástico.

É o lugar onde mais gostava de viver.

Deve fazer um frio tão delicioso por lá.

Mas o mundo não promete nada a ninguém

e nenhum homem jamais viveu
como ele desejaria.

Cabras numa árvore.

É uma fraude, David.

Elas não trepam para ali sozinhas.

O velho na loja há de sair

e perguntar-lhe se quer uma fotografia.

Por uma quantia, claro.

Aldrabões, David. Impostores.

- Pequeno-almoço!
- Onde arranjou isso?

É bom, não é?

É bom.

Acha que Abdellah me perdoou?

Ele percebeu que você lamentou.

Ele julgou-o sincero.

Mas será que ele me perdoa?

Estou certo de que sim.

Ele deve tê-lo perdoado.

Caso contrário,
não estaríamos a beber chá aqui em Alnif.

Anouar.

A culpa foi minha.

O acidente.

Foi completamente por minha culpa.

Eu tinha bebido o dia inteiro.

Eu conduzia demasiado depressa.

Eu discutia com a minha mulher.

O Driss não fez nada,

exceto aproximar-se da estrada
para tentar abrandar-nos.

A culpa foi minha.

Anouar.

A culpa foi minha.

É hora de nos despedirmos, amigo.

Adeus.

Porquê?

Por nenhuma razão.

Bem, pela Suécia.

É um homem decente, Anouar.

Igualmente, David. É um homem de honra.

O Richard mandou-o?

Não, eu vi o jipe.

Lá se vai o comité de boas-vindas.

A Sra. Henninger.

Julgo que esteja no quarto, senhor.

David.

Nunca perguntei o seu nome.

Hamid.

À nossa, Hamid.

Eu conheci o Henninger há tempos.

Nunca gostei muito dele.

Nós frequentámos a mesma escola.

Ele era um dos mais velhos,
com alguma notoriedade.

Deveras?

Ele era bicho-do-mato?

Práticas não naturais?

Não, nada desse género.

Aparentemente, era um instigador.

Disseram-me que uma vez publicou um jornal
chamado Inglaterra sem Escurinhos.

Um embuste para envergonhar as pessoas
pelo seu racismo mal disfarçado.

Ele devia pensar em voltar a publicá-lo.

Agora já ninguém disfarça.

Então, era de esquerda?

Presumo que sim.

Acha que enterraram o rapaz árabe?

Eu diria que sim.

É assim que eles fazem.

Varrem tudo para debaixo do tapete.

No fim, ninguém quer problemas.

Conto que o pobre David
lhes tenha pagado bem.

Que tonto. Os carros têm travões, sabe?

Foi sempre essa a minha atitude.

O quê?

O que é isto?

Uma lembrança.

O que aconteceu por lá?

O pai queria conversar comigo, só isso.

Ele pediu dinheiro?

Não.

Mas eu dei-lhes, ainda assim.

Achas difícil de acreditar.

Não sei.

Sim, estou um pouco surpreendida.

Seja como for...

Acabou.

Malas nos carros.

Aqui.

Pronto, é isso.

Olha o passarinho! Boa.

Já está?

- Está.
- Sim.

Ciao, bambina.

Obrigado, rapazes. Ciao.

Flores, por favor, Dally.

Pena que não tenhamos ficado a sós.

Talvez tenha sido melhor assim.

Dê os meus cumprimentos à Jo, sim?
Sabe como eu odeio despedidas.

Sim, Tom. Eu sei.

O que está a fazer?

Preciso de boleia até Casablanca.

- Precisa?
- Sim.

E o que fez por mim, ultimamente?

Amigo, consigo chupar uma bola de golfe
por uma mangueira.

Sim, dizem todas o mesmo.

Entre.

Vemo-nos em Azrou ao jantar.

Vamos pedir truta.

Maribel, mexe-me esse rabo.

Há gente à espera.

E para onde vão vocês?

Tinghir.

Para o Hotel de Sud ou como raio se chama.

A Maribel quer viver o deserto,
seja lá o que for isso.

Foi uma ótima festa, Dicky.

Ainda bem que veio, suserano.

Eu nunca organizo este tipo de festas,

a menos que envolvam orgias.

Infelizmente, a era das orgias
parece ter terminado.

Arrivederci.

- Ciao.
- Ciao, bambino.

- Até para o ano!
- Adeus!

Tu estavas a ter um pesadelo.

Sim.

Porque não me acordaste?

Eu achei que não devemos
acordar uma pessoa se...

Isso é com o sonambulismo, não é?

Desculpa.

Eu sonhei que estava dentro...

... da turbina gigante de um Boeing.

E que eu devia limpar as hélices.

Eu tinha apenas uma escova de dentes.

De repente, as turbinas começaram a girar

e eu fui dilacerado.

Como soubeste que era a turbina
de um Boeing?

Boa pergunta.

Estás inspirada?

Sim, tenho uma ideia para um livro.

Parabéns.

Ficamos felizes que fiquem
por mais uma noite.

Faz mais sentido para vocês
partir de manhã cedo.

Não, eu dormi a tarde inteira.

Conduzimos de noite
e voltamos a Tânger numa única viagem.

Eu sei o que pensam,
mas um raio não cai duas vezes.

Cai, sim.

Arranjámos o carro como pudemos.
Têm uma cesta de piquenique no banco.

Mas as bebidas não têm álcool.

Seja como for...

Correu tudo pelo melhor.

Não para o rapaz, mas...

Podia ter sido muito pior
para todos os outros.

Eles interessam-se por tapetes,
lá no deserto?

Nunca vi algo de tão longe.

Eu não reparei nos tapetes.

- Viram o Tom antes de ele partir?
- Não.

Ele partiu sem que o víssemos.

Como é que ele fez, Dicky?

Não sei.

É um rapaz fugidio.

Vejo-o anualmente e nunca sei quem é ele.

Quem é o Tom?

O americano.

O americano?

Sim, claro.

Liga-nos quando chegares.

Fico sempre preocupado
até saber que estão bem.

E compra algo bonito em Tânger.

A terapia do retalho faz milagres.

Assim faremos. Adeus.

Adeus.

Boa viagem, David.

Adeus, Hamid.

Que fim de semana pavoroso.

Aquela cabra francesa.

É impressionante que existam
pessoas destas, não é?

Ela trabalhava para quem? Recorda-me.

Para o New York Times.

Secção de estilo.

Graças a Deus.
Pensei que ias dizer The Guardian.

Disse ao Hamid para trancar a casa,
portões exteriores e tudo.

Porque farias isso?

Só para nos prevenirmos.

Precisamos de conversar.

Não, não precisamos.

Desculpa?

Nós não precisamos de falar.

Ninguém precisa de conversar.

Podemos optar por conversar ou não.

E deduzo que escolhes não conversar.

A tua dedução está correta.

Nem sequer queres falar da tua camisa?

Meu Deus, odeio Lou Reed.

São os Velvet Underground.

Como podes odiar o Lou Reed?

- Acho que devíamos parar.
- Como? Porquê?

Foi aqui que o atropelámos. O Driss.

Acho que devíamos parar
e prestar homenagem.

Está alguém na estrada.

Não, não saias do carro.

David?

David.

Que a paz esteja sobre vós.

E sobre vós a paz.

Foste enviado pelo Abdellah.

David!

Está tudo bem.

Não está nada bem.

É a merda de um assalto.

Não é um assalto.

Tudo deve ser julgado.

- Não!
- Dispara.

Não, David.

Dispara.

David!

Dispara!

FIM

Legendas: Luís Custódio